Sheherazade e o marginalzinho

06/02/2014 15:57 - Adrualdo Catão
Por Adrualdo Catão

Rachel Sheherazade despertou o ódio de alguns internautas com seu comentário sobre o “marginalzinho” que foi amarrado ao poste no Rio de Janeiro. Veja o vídeo aqui.

Rachel não está completamente errada, portanto, também não está completamente certa.

Em primeiro lugar, devo esclarecer que linchamento não é legítima defesa. O direito de defender-se é fundamental e não pode ser equiparado à vingança ou à justiça com as próprias mãos. Sheherazade chamou a atitude de “legítima defesa coletiva”. Não, Rachel. Linchamento não tem nada a ver com direito à defesa. A ação de quem amarrou o sujeito no poste ou bateu no bandido até a morte é, sob qualquer ponto de vista, ilegítima.

Amarrar alguém a um poste equivale ao abandono de todas as conquistas que a cláusula do devido processo legal nos ensinou, incluindo a noção de proporcionalidade entre a pena e o delito, a presunção de inocência, o direito à defesa...

Porém, Sheherazade chamou a atenção para um fenômeno que tem se repetido no Brasil e aqui em Alagoas. A crescente violência e a evidente impunidade colocam o cidadão numa situação bem difícil. Em primeiro lugar ele não pode se defender, pois seu direito a portar armas foi retirado pela lei brasileira. E, finalmente, os agentes de polícia e justiça não punem quem comete delito. Os processos são demorados, as polícias judiciárias estão sem estrutura e polícia ostensiva é ineficaz.

No meio de tudo isso estão intelectuais de esquerda e defensores do “direito penal crítico” com suas teorias sobre irresponsabilidade individual e causas sociais do crime. O pior é a interpretação vulgar de pesquisas sociológicas, que levam à conclusão tão odiosa quanto falsa de que a pobreza leva ao crime e de que o criminoso é uma “vítima da sociedade”.

Segundo essa interpretação vulgar, o indivíduo não é responsável pelo que faz. O responsável se dilui num conceito abstrato de “sociedade”, “capitalismo” ou o “sistema”. O criminoso, que viola a vida, a liberdade e a propriedade do indivíduo, passa a ser a vítima. Assim, nossas autoridades vão engolindo corda desses intelectuais e a população fica completamente desprotegida.

Diante de um quadro desses, o que a população faz? Usa seu instinto de proteção da pior forma: a vingança.

A vingança é sempre abandonada em qualquer lugar mais civilizado porque quase sempre ela leva a uma desproporção entre a ação e a resposta. Ela é quase sempre mais violenta do que a agressão. O Código de Hamurabi já tinha na sua lei do “olho por olho, dente por dente” o significado de proporção que a vingança costuma esquecer.

Precisamos recuperar a noção de que a prisão (pena privativa de liberdade) é um avanço civilizacional. O devido processo legal e a punição de criminosos é uma característica de sociedades sadias. Manter criminosos presos apazigua a sociedade e desestimula novos crimes. Enquanto a interpretação vulgar de teorias sociológicas continuar influenciando nossas autoridades a tratar criminosos como vítimas, teremos sempre episódios de linchamentos e vingança.

Por isso que disse que Rachel errou e acertou. Linchamentos são injustificáveis. Mas parte da causa pela sua ocorrência está no resultado das políticas públicas pregadas por quem hoje ataca Rachel. Na verdade, tão perigosos quanto o “marginalzinho” são aqueles intelectuais vulgares que o tratam somente como vítima.  

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