A primeira edição do I Ìgbà Afro Índigena: Zumbi Vive: Revisitando sons, saberes e falares identitários", iniciativa do Instituto Raízes de Áfricas, representação do movimento negro em Alagoas, em parceria direta com a Associação de Moradores Gabriel Pimenta e Coletivo Minervino de Oliveira, ocorreu em Belém do Pará, no dia 22 de novembro e contou com um público de 70 participantes, marcando as discussões pertinentes ao mês da CONSCIENCIA NEGRA, oficialmente “comemorado” em novembro e as questões de quilombismo urbano no bairro da Terra Firme, criado na década de 1950, o bairro ganhou corpo a partir da ocupação de terras públicas em áreas aqui tratadas de baixadas (favelas), onde predomina a arquitetura da palafita. O bairro que tem cerca de 60 mil habitantes acumulou áreas da Universidade Federal do Pará (UFPA), da antiga Faculdade de Ciências Agrárias do Pará (FCAP), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), e do Museu Paraense Emílio Goeldi. Boa parte da população da área é composta por migrantes internos ou do Nordeste, em particular do Maranhão.
Como resultado do I Ígbà os participantes fizeram um álbum de memória expondo as ideias acumuladas em busca da valorização e melhorias do espaço.
Inúmeras reivindicações foram ouvidas, dentre elas a necessidade da instalação de equipamentos culturais no bairro tais como: teatros, bibliotecas, cinemas, praças, etc.
Um dos aspectos que recebeu a unanimidade da plenária foi o processo de criminalização que a mídia de Belém promove em relação ao bairro, atraindo assim os olhares atravessados da sociedade belenense.
No território urbano do quilombo Terra Firme há experiências de resgate da cultura afro-brasileiora, através de mapeamento de comunidades e manifestações culturais. Neste projeto foram contatadas 76 entidades na Terra Firme, mas existem mais de 100. O mapeamento realizado pelo Ponto de Memória da Terra Firme e Centro Comunitário Parque Amazônia tem como base entrevistas e o produto final será o mapa cultural do bairro, organizando inclusive um cortejo cultural.
Agregando capoeira, afros, hip hop, samba de criolo. O mapa e o cortejo darão visibilidade para que os grupos que atuam próximos possam se conhecer. Haverá ainda rodas de conversas e eventos para reunir os vários grupos em várias ações culturais.
A comunidade reafirma a necessidade de um espaço cultural que permita que todos possam apresentar suas atividades, pois não há um local para que os grupos se relacionem com a sociedade.
Um assunto que despertou interesse foi o combate ao preconceito nos espaços da escola reforçando que o fundo (PDDE), traz em sua legislação verbas destinadas às escolas para capacitarem os professores. É importante que seja incluído no currículo escolar a questão do preconceito entre os professores. É preciso que esse tema esteja nas capacitações, para amenizar o racismo e o preconceito.
Quanto a Lei nº 10.639/03 a comunidade presente mostrou um total desconhecimento. Ficou acordado que lideranças locais, representados por, Sidney Almeida, articulador local presidente da Associação de Moradores Gabriel Pimenta e Jorge Andre, do Coletivo Minervino Oliveira entrarão em contato com a Secretaria Estadual de Educação de Belém do Pará para cobrarem a aplicação da politica antirracista dentro das escolas, como também convidar diretorias e o Núcleo Afro da SEDUC/PA para discutir estratégias e planejar ações, na comunidade.
Discutiu-se a urgente necessidade de qualificação popular sobre conceito e usos da ciência política (política de saúde, de educação), para que a população não seja enrolada por quem sabe como as coisas funcionam. O povo precisa saber onde cada coisa está, como funciona e como podemos ter acesso.
Sobre a discriminação do bairro Terra Firme aventamos que não é casual, afinal como quilombo urbano reproduz a imagem de um bairro negro e como o país tem uma ideologia racista isso se reflete nos ambientes relacionados. O genocídio dos jovens negros foi outro ponto levantado. Quanto mais jovens negros morrem, menos famílias negras terão continuidade. Quando se mata um menino negro, se faz uma limpeza étnica. É preciso cobrar dos governos, pois as atrocidades continuam acontecendo.
A questão é a consciência de direitos civis. O que deforma a compreensão é a falta de DIREITOS HUMANOS. Hoje é necessário existirem ações de afirmação porque ainda é distante a compreensão de que não existe diferença real, mas nas políticas públicas a diferenciação é evidente e muito determinada.
Outro ponto destacado foi a construção da unidade entre os movimentos de base para evitar a fragilização. A comunidade X só luta pelas questões da área dela. A área do lado faz outra luta e uma não conversa com a outra. Não há uma luta conjunta. Não é uma luta X, mas sim são todas a mesma luta. Precisamos de um Fórim em que se faça uma luta conjunta. Precisamos unir as lutas individuais, pois é ruim que quando se chega no momento da eleição estão todos esfacelados e é mais fácil de serem manipulados. Se estivessem todos juntos é mais fácil conquistar os benefícios pra a comunidade.
Precisamos organizar mais discussões sobre questão que sejam comuns a todos, isso nos livra das divisões e nos aproxima do que nos une: nossas necessidades e carências.
As do mês de junho- afirmam membros da plenária- nos mostraram que quem estava fora do jogo político éramos nós, o povo, e mostraram que nos organizando podemos “contra atacar” utilizando nossa principal força: a quantidade e o fato sermos nós que trabalhamos para gerar as riquezas.
Voltando a questão racial houve uma concordância geral de que: O negro é discriminado para que se transforme em força de trabalho barata e submissa. Somos continuamente expulsos do jogo político e precisamos reverter essa lógica.
A plenária acordou para a criação de um núcleo de discussão negra, trazendo especialistas, mensalmente, para alicerçar o conhecimento na construção de direitos e também pensar na criação de um Fórum do bairro.
Muitas falas giraram em torno da consolidação da cidadania: “Precisamos nos identificar enquanto comunidade e aproximar as forças que a própria população possui. Essa força está sempre sendo buscada, mas não é mostrada para o povo, pra que ele continue repetindo os discursos das elites.’’
E no encerramento Sidney Almeida pontuou questões essenciais: " Este é o ponta pé inicial da criação de uma ação social mais ampla, pois reclamam que a associação só cuida da escola. Os professores hoje fazem capacitação na SEMEC. As crianças fizeram a Provinha Brasil e o resultado foi regular, queremos aumentar o nível da participação.
Demos prioridade para a escola porque é o tipo de mobilização que funciona. Quando chamamos reunião pro centro comunitário aparecem 8 pessoas, pais de alunos aparecem 80.
Hoje a participação foi muito grande da comunidade, não só de pais. É importante que ocorram reuniões de outros temas para as discussões serem mais amplas. Trazermos pessoas das secretarias, do governo, das igrejas, pois eles só aplicam as políticas públicas se houver cobrança e se a comunidade estiver organizada. Temos aqui na reunião representantes de várias comunidades e de outras instituições.
Os governantes sempre perguntam se a comunidade tem representante. Isso é bom, mas muitas vezes eles só oferecem pequenas vantagens para alguns e deixam a comunidade depois."
Uma proposição do presidente da Associação , Sidney Almeida: Temos um terreno aqui ao lado, ali ao lado da Eletronorte e o poder público poderia criar uma quadra fechada. Temos áreas , também, no Parque Amazônia.
Os políticos só querem pensar no retorno do voto. Sabemos quem está no poder e eu prefiro votar no Zé da Farmácia do que reeleger os que estão lá e não fizeram- sintetizou Sidney.
E a professora Ray da Escola Primeiros Passos pediu uma questão de ordem para dizer que: O Sidney está fazendo um trabalho lindo, pois está trazendo a educação para a comunidade que não tem oportunidade. Temos na escola a discussão para que as crianças não desenvolvam a discriminação. Nas danças procuramos não formar pares, mas que todos possam dançar com todos. Trabalhamos a deficiência intelectual, as questões raciais, não deve haver discriminação por alguma doença ou condição. Tratamos do tratamento dado às leis e trabalhamos o amor, pois temos que nos amar. Muito já afirmam que amam sua cor e fazem questão de afirmar “Sou Negra”. Parabéns Sidney, pois só vamos conseguir defendendo nossos direitos e a educação é fundamental.
Após as diversas intervenções ficou estabelecido que a 2ª etapa do I Ìgbà Afro Índigena: Zumbi Vive, acontece em Maceió,AL, dia 21 de fevereiro de 2014 quando celebramos a morte do grande líder negro, Malcom Litte, o Malcom X.
A segunda etapa do Ígbà terá a presença do cônsul da República da Venezuela, em Belém do Pará, Alonso Pacheco e do líder comunitário Sidnei Almeida Brito.
O Ígbà tem a parceria da Prefeitura de Maceió e Federação das Indústrias do Estado de Alagoas.