A PEC dos empregados domésticos: toda unanimidade é burra

04/04/2013 15:49 - Adrualdo Catão
Por Adrualdo Catão

 

 

 

Não quero entrar em argumentos econômicos aqui. Não é a minha praia. Só quero destacar um método. Uma abordagem que eu encontro todas as vezes que eu defendo a diminuição das restrições à contratação, também conhecidas como “direito do trabalho”. Esse caso da PEC dos domésticos foi um belo exemplo de intolerância e da falta de propensão para o debate por parte de alguns dos “defensores do trabalhador”.

 

Os críticos da PEC dos domésticos apenas dizem o óbvio. Quando se instituem, por lei, restrições à contratação de empregados domésticos, por meio do aumento do custo do contrato, incentiva-se a não contratação. Sendo assim, o tal “aumento de direitos”, na verdade, iria prejudicar justamente o trabalhador doméstico, especialmente o menos qualificado, que já está ou ficará fora do mercado de trabalho ou na informalidade. Não precisa ser gênio da econometria para entender esse princípio básico.

 

Isso quer dizer que haverá necessariamente desemprego? Pode ser que não. Porém, a restrição dificulta ainda mais a contratação daqueles que são menos qualificados. Estes ficarão sem emprego, ou seja, numa situação pior do que estariam se empregados fossem. Mas para os defensores da ampliação das restrições trabalhistas isso não importa. Eles querem escolher pelos outros qual trabalho é digno e em quais condições. O trabalhador tem “direitos”, mas não pode renunciar...

 

Dizer o óbvio levou muitos a engatarem os argumentos mais malucos na defesa da PEC. Li por aí textos os mais exaltados. Aliás, não entendi tanta exaltação. Afinal de contas, a tal da PEC não foi aprovada por unanimidade? Mas tem gente que parece ter raiva da mera discordância. Vi alguns textos dizendo que os contrários à PEC dos domésticos estariam defendendo a escravidão!

 

Acusar alguém de defender a escravidão é entrar naquela seara do bem contra o mal e isso não é debate. Comparar trabalho doméstico com escravidão é além de preconceito, ignorância. Escravidão não é uma situação de fato, mas um status jurídico e não faz nenhum sentido falarmos em escravidão quando estamos lidando com o trabalho doméstico. Ainda mais hoje, quando vemos que o mercado já estava se encarregando de tornar o trabalho doméstico cada vez mais caro.

 

A lição que esse debate me traz é a de que, no Brasil, muitos pensam que têm o monopólio da virtude e da bondade. Assim, defensores das restrições ao trabalho são necessariamente a favor do trabalhador e contra os malvados do capital. Por outro lado, quem defende a liberdade de contratar é um pária, defensor da exploração capitalista. Defensor da escravidão! Não se lembram eles que argumentos contra a escravidão são liberais, os mesmos princípios dos que defendem a liberdade de contratação. Muita gente se esquece da raiz fascista do nosso direito do trabalho, essencialmente corporativista, com seu imposto e unicidade sindical. Praticamente uma filiação obrigatória! Getúlio Vargas é tratado como grande estadista pela nossa esquerda...

 

Mas, no fim das contas, os defensores da PEC dos domésticos denunciaram seu desejo oculto em vários textos. Querem mesmo acabar é com esse tipo de trabalho, que eles consideram indigno. Bom, se esse é o desejo, então está provado o que eu disse no início, não? A PEC, ao aumentar os custos de contratação dos domésticos, está, no fundo, contribuindo para restringir seu trabalho. Eu acho que isso é ruim, eles acham que isso é bom, mas quanto ao ponto principal, não parece haver discordância.

 

Acusar os que criticam nosso defasado sistema trabalhista de defensores da escravidão é um artifício retórico bastante comum, que é reduzir o argumento do outro à forma mais radical. Levar às últimas consequências, entende? Então vou fazer aqui o mesmo. Você, que defende tanto o direito trabalhista e que afirma que tantas restrições não trazem consequências para o mercado de trabalho, por quê não defende logo um salário mínimo de cinco mil reais? Que tal uma jornada de apenas 3 horas? E um 14º ou 15º salários? Férias de 90 dias? Seria viável um troço desses? Seria bom para o trabalhador?

 

Vamos parar de tratar o debate sobre direito do trabalho como uma luta do bem contra o mal! Desconfiem um pouco dos propósitos populistas dos nossos políticos. Quando penso que essa PEC foi aprovada por unanimidade, não me sai da cabeça o famoso dito de Nelson Rodrigues: “toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”. Pois é, em se tratando de unanimidade entre políticos, tenho que concordar...

Comentários

Os comentários são de inteira responsabilidade dos autores, não representando em qualquer instância a opinião do Cada Minuto ou de seus colaboradores. Para maiores informações, leia nossa política de privacidade.

Carregando..