Em Alagoas estão as raízes das lutas históricas pela emancipação negro-africana no Brasil, o berço do Quilombo dos Palmares, Serra da Barriga, expressão máxima dessas lutas.
Como parte integrante do X Ígbà- Seminário de Conversas Afro-Internacionais: “Im/Ex-pressão Afrodescendente nas Américas”, acontecido nos dias 19, 21 e 22 de março, o Projeto Raízes de Áfricas organizou uma visita ao Espaço Abdias Nascimento, na Serra da Barriga tendo como objetivo a realização de um Oríkì.
Oríkì é uma forma de saudação.
Saudar o grande Abdias pela passagem do seu aniversário caso vivo fosse, ocorrido em 14 de março, como também levar os participantes  do X Ígbà para  conhecer lugares de significados da história brasileira.
Como desejo póstumo do mestre, Abdias Nascimento, suas cinzas estão depositadas junto a um Baobá (árvore símbolo da resistência em Áfricas), na Serra da Barriga, no estado de Alagoas.
O ato solene e emocionante de depósito das cinzas ocorreu em 13 de novembro de 2011, com a participação de cerca de 600 pessoas.
O Oríkì ,com as cores de Oxum, para saudar os feitos de Abdias Nascimento foi celebrado pela sacerdotisa matriarca da religião afrodescendente do estado de Alagoas, mãe Mãe Miriam do terreiro Ilé N’ Ifé Omi Poá/Maceió/AL e contou com a participação de representações do estado do Rio de Janeiro, Brasília, Bahia e Alagoas.
Terminada a celebração ficamos enredados em uma zona de desconforto ao constatar in loco a continuidade  da ausência de investimentos sistemáticos para conservação do espaço, não só do Parque Memorial Quilombo dos Palmares, como também do local onde estão enterradas as cinzas de Abdias.
O capim viceja altaneiro e as formigas já deram cabo das muitas folhas do baobá. Nada no caminho lembra que ali estão as cinzas de um dos maiores defensores da defesa da cultura e igualdade para as populações afrodescendentes no Brasil, nome de grande importância para a reflexão e atividade sobre a questão do negro na sociedade brasileira. Com uma trajetória longa e produtiva de ativista do Movimento Negro, ator, criador do Teatro Experimental do Negro, escultor,deputado estadual,deputado federal e senador da República.
A gameleira branca mesmo com as folhas amareladas pela ação do descaso resiste bravamente.
Não fosse a ação diligente do prefeito Areski Freitas do município de União dos Palmares, o Parque já teria desabado.
É inconcebível que a historicidade negra-africana continue a ocupar, no segundo país mais negro do planeta, os territórios da invisibilidade estatal.
A história negra do Quilombo vem sendo menosprezada gestão após gestão pelos órgãos federais, dentre eles o Ministério da Cultura e o Ministério da Igualdade Racial.
Não dá mais para ouvir discursos palavra-puxa-palavra sem a substância da concretude.
O parque está à deriva e o silêncio que o invade é inquietante.
Cadê as gentes, as grandes caravanas circulando pelos espaços promovendo a interlocução da história? Tivemos o cuidado de olhar o livro de registro dos visitantes, e até o dia 22 de março, só um número infimo de 59 visitantes subiram a Serra.
O povo não preserva o que não conhece. E se não conhece pré-julga já nos afiança o racismo nosso de todo dia.
O Parque Memorial Quilombo dos Palmares está com a saúde alquebrada nas terras indiferentes do racismo institucional.
Além é importante estabelecer um portal da transparência para socializar a forma de gestão dos espaços do Parque. Inaugurado em 2007 até agora não ocorreram às licitações devidas e necessárias para a formatação de uma gestão responsável e participativa.
Carece pensar a Serra da Barriga além das comemorações da festa do 20 de novembro .
Carece traçar possibilidades de interpretação da Lei nº 10.639/03 nos espaços do Quilombo dos Palmares, repleto de riquezas das heranças humanas e de história viva.
Carece que o governo federal perceba a Serra da Barriga como o importante lugar de significados para a humanidade. Um palco da história humana.
Presidente Elói , o Estatuto da Igualdade Racial prevê a valorização da historicidade negra. E a Serra da Barriga é referência dessa história. Entende?
Não podemos continuar forasteiros em nossa casa.
A história do senador da República Abdias Nascimento está estampada nos territórios da história negro-africana e merece respeito.
Vamos respeitá-la?