Médico sertanista e sanitarista, colaborador dos irmãos Villas Boas na luta pela preservação dos índios da Amazônia. Um profeta das causas perdidas, conforme definição de Antonio Houaiss, chegou a afirmar que o problema do índio não tinha solução. Mas, em vez de abrir um lucrativo consultório numa cidade grande, foi curar malária, tuberculose e varíola dos indígenas. Excelente contador de piadas, cantador de frevos e emboladas, bebedor de uísque e colecionador de trovas de mictório que trocou o conforto das cidades pelo apostolado das matas, Nutels foi descrito por Ariano Suassuna como uma espécie de quarto dos Irmãos Marx, bom, alegre e risonho.

De origem ucraniana, nascido em Ananiev, Nutels chegou ao Brasil em 1925, em companhia da mãe e de uma tia, a chamado do pai, um judeu foragido das perseguições em sua terra natal que emigrara para a América do Sul pouco antes do nascimento do filho. Após uma estada de alguns anos em Buenos Aires, desembarcou no Recife e fixou residência em Laje do Canhoto, uma pequena cidade do interior de Alagoas, onde a família voltou a reunir-se e o pai transformara-se no pioneiro das vendas à prestação.

 

Criança judia e adolescente nordestino, duas características que o prepararam para o desafio indigenista, Noel viveu os anos de uma infância tardia e iniciou o aprendizado da nova língua totalmente estranha. Curioso, se comunicava por gestos com as crianças nativas assim que desembarcou no Brasil. Começou os estudos regulares em Garanhuns, indo depois para o Recife. Ali fez preparatórios no Instituto Carneiro Leão e cursou a Faculdade de Medicina.

Já formado, chegou ao Rio de Janeiro em 1937. Nomeado médico do Instituto Experimental Agrícola, em Botucatú, transferiu-se depois para o Serviço de Saneamento da Baixada Fluminense, engajando-se então na luta pela erradicação da malária que infestava a região. Convidado em 1942 pelo Ministro João Alberto, Noel, já casado, seguiu com a esposa Elisa para Goiás, integrando a equipe da recém-criada Fundação Brasil Central.

Em 1949, participou da Expedição Roncador-Xingu, chefiada pelos irmãos Villas-Boas. Naturalizado brasileiro, seu nome esteve associado a todas iniciativas pioneiras de medicina social voltada para as carências das populações indígenas e interioranas do Brasil, tendo desenvolvido uma obra magistral de humanismo entre nossos índios. Na década de 60, a imprensa registrava suas andanças pela selva amazônica ou pelo sertão nordestino, lutando muitas vezes inutilmente contra a tuberculose, educando populações inteiras através da literatura de cordel e reconhecendo melancolicamente a tragédia dos índios.

A história de sua vida é contada em Noel Nutels, publicação de sua autoria e diversos colaboradores, editada em 1975. Em 1978, Origines Lessa lançou O Índio Cor-de-Rosa - Evocação de Noel Nutels. Sua biografia romanceada foi publicada em 1997, A Majestade do Xingu, de Moacyr Scliar. Noel Nutels faleceu aos 60 anos, em 10 de fevereiro de 1973.