Paulo Pedrosa, a voz das lagoas

26/09/2011 08:23 - História dos Ambientalistas
Por Redação

Se tem uma personalidade em Alagoas que tinha o espírito militante quando nem se pensava em ONGs e coisas do gênero, ato contínuo sempre em defesa da natureza, custasse o que custasse, essa figura era Paulo Ramalho Pedrosa (1906-2002).

“Essa coisa em defesa do meio ambiente, do amor aos passarinhos, do mangue, aflorou em tenra idade nele”, atesta o filho de Paulo Ramalho Pedrosa, José Fernando Maia Pedrosa. “Ele contava que brigava com os meninos de sua época para tomar os estilingues, porque não gostava e não suportava quando os garotos matavam os bichos em caças e epreensões”, completa o filho do ambientalista.

De acordo com Fernando Maia Pedrosa, esse espírito vigilante, atuante e constestador em defesa da fauna e da flora emergiu porque Paulo Ramalho foi criado com a família onde se localiza hoje a Boca da Caixa, perto do Broma, na Lagoa Manguaba, entre águas, peixes e afins.

“Mas ele tinha uma propriedade na chamada Ilha de Fogo”, completa o filho.
Para completar, Paulo foi inspirado por uma obra que mudaria sua vida para sempre. “Ele ficou ainda mais consciente de seu papel no meio ambiente ao ler ‘Canais e Lagoas’, de Octavio Brandão”, conta o filho.

Abertura das barras: sua grande bandeira de luta

Essa paixão à flor da pele fez de Paulo Ramalho um dos ambientalistas alagoanos de maior destaque na militância ecológica em Alagoas. “Quando ele ia à redação do Jornal de Alagoas para levar seus artigos, lá nos anos 90, e alguém puxava o assunto da abertura das barras ou coisa parecida, ele envolvia de tal forma o povo da redação na sua defesa, que as barulhentas máquinas de escrever paravam, pois todos ficavam admirados com o entusiasmo do Paulo”, conta o jornalista Bartolomeu Dresch.

“A questão das lagoas e a consequente abertura das barras era um assunto incansável para o Paulo Pedrosa. E eu o admirava muito por isso”, completa Dresch.

Mas foi já adulto e cheio de sonhos, na época da Segunda Guerra Mundial, que Paulo Ramalho Pedrosa deixou sua marca e seu grande legado em favor da natureza. “O Paulo Ramalho observou que estava ocorrendo uma queda de produção do pescado devido ao assoreamento das barras do complexo lagunar, com a consequente diminuição de salinidade”, conta Afrânio Menezes, técnico do Instituto do Meio Ambiente (IMA) e membro do Conselho Nacional da Biosfera da Mata Atlântica.

“Eu era garoto, mas lembro-me da cena como hoje. Foi em 1945, quando meu pai conseguiu convencer o comandante do Regimento de Artilharia Motorizado do Exército e reuniu cerca de 200 soldados que cavaram com pás, manualmente, as barras na lagoa que estavam muito estreitas e impediam a passagem dos peixes, sururus e prejudicava toda a gente que dependia daquilo”, conta Fernando Pedrosa.

A preocupação de Paulo Ramalho com o assunto era pertinente. Com o assoreamento da área, a profundidade nas águas da lagoa saiu de 5 metros para apenas 1,5m.

“Inicialmente, foi assustador, porque com a abertura das barras, o mar invadiu tudo. Mas pouco tempo depois, era lindo ver a abundância de peixes de toda espécie e sururu nas lagoas”, completa Fernando Maia Pedrosa.

“Foi a primeira dragagem das lagoas e, o que é mais significativo: foi feita no braço, literalmente, graças ao Paulo Ramalho”, destaca Afrânio Menezes.

O lutador inscansável

Passava o tempo, as barras voltavam a se fechar novamente e Paulo Maia Pedrosa, incansável, cobrava das autoridades, pessoalmente e pelos jornais da época, o dessassoreamento e a reabertura. Após alguns anos, outras autoridades cederam à pressão do incansável defensor da natureza e promoveram a abertura das barras.

Em uma dessas “pressões”, nos idos dos anos 60, surgiu a obra “Dragagem, aspiração máxima dos quatro municípios lacustres do Estado de Alagoas”, inspirado por Paulo Pedrosa, cujo enunciado do prefácio dizia:

“(...) Esse livro foi organizado com o objetivo de homenagear o trabalho ingene, sincero e idealista de um grupo de homens que, preocupados com os problemas de base da terra, se (sic) decidiu com firmeza e energia a lutar em defesa do valioso patrimônio geoeconômico do povo alagoano: as lagoas. Rerata o drama pungente de toda uma região sacrificada. De sua gente entregue à própria sorte, das lagoas sendo aterradas. É uma históira triste e vergonhosa. Triste pela miséria refletida nos casebres palustres dos filhos das lagoas. Pelo quadro social doloroso e revoltante de criancinhas opiladas e famélicas (...)”, diz um trecho assinado por Audifax Almeida, na obra publicada em 1962.

Paulo Ramalho Pedrosa protagonizou ainda a maior manifestação de protesto contra a poluição das lagoas e o desmatamento das matas já vista por essas plagas. Para ser ouvido pelas autoridades da época, ele organizou uma caminhada por todo o perímetro do complexo lagunar, por cerca de 150km. “Essa passeata contou com a participação de mais de mil ribeirinhos na maior manifestação popular na época”, atesta Afrânio Menezes.

Paulo Ramalho Pedrosa faleceu em 23 de abril de 2002, com 96 anos, deixando um legado de genética ambiental para seus descendentes. Em 2001, foi inaugurado o Centro de Treinamento e Capacitação da Superintendência do Ibam em Alagoas, que recebeu seu nome, em homenagem unânime dos funcionários do órgão.

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