Cabelos encaracolados, um brinco na orelha e a espontaneidade descompromissada com prestações de contas à sociedade. Assim era o menino que sentado a sombra de um coqueiro na orla da capital de Alagoas, cantava reggae ritmado pelos ecos do vento.
Não sei se morava na rua ou a rua, como simbologia da liberdade, habitava os sonhos do menino. O menino cantava reggae com uma expressão tão profunda e contagiante que arrancava sorrisos dos passantes alheios a vida que gira,ininterruptamente.
Os passantes, como eu, olhavam-no e sorriam. Sorriam, pois o reggae cantado, meio que desafinado, pelo menino invadia fronteiras entre o mundo da rua e as ruas do mundo das pessoas que passavam e quase por osmose travavam um diálogo cúmplice com a voz da infância que tinha como lar a vastidão das ruas.
O menino que cantava sentia-se sujeito de seu próprio destino. Era um menino, mas já tinha um destino.
Makutb!
Uma senhora que caminhava ao longo da trilha da intolerância com seu cão criado a base de ração importada, sentiu um incômodo velho sendo acordado pela alegria gratuita do menino negro que cantava reggae.
A senhora da tristeza velha temeu aquele menino negro bem no meio do seu caminho e com a arrogância própria de quem já não sabe viver os prazeres simples da vida ,atropelou a alegria da infância do menino com as asperezas dos adultos emparedados pelas intolerâncias humanas.
Inquiriu: Onde estava o pai e a mãe que o deixava solto na rua?
O menino solto na rua era uma antítese do pátrio poder da "coleira-proteção" do cachorro da senhora.
A senhora e seu cachorro passeavam na rua. O menino morava nela. Afirmou este.
O pai e mãe morreram nas calçadas noturnas. Ele interno em um abrigo fugira de uma prisão medonha para viver embaixo do céu.
A tristeza velha que embaçava a menina dos olhos da senhora inquietou-se, mais ainda com toda aquela história e perguntou ao menino: E você ainda canta?
O menino rasgou um sorriso ao meio repleto de significados ofertou-o à senhora dona de uma velha tristeza e retomou ao ritmo de sua cantiga.