Socializando  a palavra de Maurício Macedo que denuncia de forma poética  a segregação da religião afrodescendente.

1912 : A diáspora dos deuses*

Maurício de Macedo

Eles são brancos,
se entendem.
A gente não tem nada com isso.
Mas eles vieram de madrugada,
invadiram o terreiro,
destruiram o peji.
Tocaram fogo na palhoça,
bateram na velhinha
até o sangue correr.

A gente não tem nada com isso.
Os políticos,às vezes,aparecem por aqui,
mas a gente não tem nada com isso.
A gente só quer falar com os deuses,
rodopiando o corpo ao som dos atabaques,
sacudindo nos ombros as dores do mundo,
quando o orixá desce
para aliviar o sofrer.

Eles são brancos,
se entendem.
A gente não tem nada com isso.
Mas eles vieram de madrugada
e prenderam nosso pai.
Silenciaram os atabaques
e proibiram os deuses de descer.
E,agora,como vamos agüentar
o peso da vida nos ombros
se os deuses não descem
para aliviar o sofrer?!


*Poema publicado no livro"Esfinge Caeté" (Maceió,ed.Catavento,1999).