O Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (AL) definiu que cabe à Justiça do Trabalho julgar ações ligadas aos impactos trabalhistas causados pelo afundamento do solo em Maceió, provocado pela mineração de sal-gema realizada pela Braskem. A decisão foi tomada durante o julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR 0001372-28.2023.5.19.0000), estabelecendo um entendimento único para processos relacionados a demissões e prejuízos trabalhistas decorrentes do colapso geológico.
A deliberação está inserida na série “Trabalho e Clima: Justiça do Trabalho e COP30”, que expõe os reflexos de desastres socioambientais sobre a saúde, a renda e as condições de trabalho da população. Reconhecido pelo CNJ como “a maior tragédia que o Brasil já evitou”, o desastre segue alterando a dinâmica social e econômica de Maceió.
Desde 2018, mais de 60 mil moradores tiveram que deixar os bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e parte do Farol. O esvaziamento desestruturou cadeias produtivas, fechou empresas e comprometeu atividades econômicas essenciais, gerando desemprego, perda de renda e impactos psicológicos severos.
Com a nova decisão do TRT-19, trabalhadores que foram demitidos ou sofreram prejuízos por conta do fechamento compulsório de empresas podem acionar diretamente a Justiça do Trabalho para apurar a responsabilidade da Braskem. Segundo o presidente do tribunal, desembargador Jasiel Ivo, a medida busca evitar decisões divergentes diante do volume crescente de ações.
Economia fragilizada e sofrimento social
Comércios, serviços, pequenos negócios familiares e até um hospital foram fechados nas áreas afetadas. Categorias como prestadores de serviço, ambulantes, mototaxistas, trabalhadores domésticos e microempreendedores perderam sua clientela e, em muitos casos, sua principal fonte de sustento.
Um relatório do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios (agosto de 2023) mostrou agravamento no quadro de saúde mental: 12 suicídios foram associados ao desastre, incluindo o de Maria Tereza da Paz, de 62 anos. Outro documento, divulgado pelo CNDH e pela OAB/AL em abril de 2024, apontou falhas na realocação e falta de transparência no processo conduzido pela empresa.
Cerca de 4.500 pequenos e médios empreendimentos encerraram as atividades na região. Entre os afetados está o empresário Wellington Alves Wanderley Lopes, que precisou fechar um posto de gasolina no bairro Pinheiro, acumulando prejuízo de cerca de R$ 7 milhões. “Agora o bairro virou um deserto”, resumiu.
Mesmo negócios fora do perímetro oficial de risco não resistiram ao esvaziamento dos bairros. Sete anos após o início da crise, muitos ainda lutam para se reerguer.
Caminhos para buscar reparação
Com a competência definida, trabalhadores podem buscar apoio jurídico na Defensoria Pública da União, na OAB/AL ou por meio do serviço de atermação virtual da Justiça do Trabalho. Uma cartilha do TRT-19 orienta como proceder em casos de demissões ou danos relacionados ao desastre.
Para a arquiteta Júlia Bulhões, coautora do livro Colapso Mineral em Maceió, o poder público deve garantir reparação integral e impedir a repetição de situações semelhantes.
O caso de Maceió fortalece o entendimento de que crises socioambientais ultrapassam a esfera ambiental e afetam diretamente os direitos trabalhistas — transformando-se em um marco para a Justiça do Trabalho no Brasil.
*com informações da Assessoria










