Outro dia, correndo no orla cidade (tentando, na verdade), percebi que correr deixou de ser sobre saúde. Agora é sobre status, paquera e rede social. É sobre o look, o relógio que monitora cada batimento , o tênis estiloso e a foto que vai gerar engajamento.
Ser fitness virou moda. E como toda moda-moderna, veio com filtro, uniforme padrão e idéia de superioridade. Quem não fizer parte da seita do shot(dose) de limão , gengibre e cúrcuma, em jejum, parece um herege sedentário.
Mas será que estamos de fato cuidando da saúde, ou apenas seguindo o rebanho? Imersos em mais um efeito manada .
Gustave Le Bon, no livro ' A Psicologia das Multidões' dizia que, em grupo, as pessoas tendem a desligar o senso crítico e agir no automático. E é exatamente o que parece acontecer quando todo mundo começa a correr, treinar, jejuar, suplementar e postar. Pois deixa de ser sobre propósito, e se torna :
"Fazer o que todo mundo faz, seja o que for, apenas para pertencer ".
E antes que você me pergunte... SIM, cuidar do corpo é fundamental. Mas o problema começa quando esse cuidado vira performance social. Quando o treino é mais sobre postar, do que sobre respirar, quando o abdômen vira moeda de valor, quando o shake ou creatina substitui a consciência alimentar e quando estar no "shape"(corpo padrão) substitui uma mente e alma saudáveis . Dessa forma, você não está saudável, você está apenas correndo, e é quase uma corrida de ratos até a próxima modinha chegar .
Luciano Subirá, no livro O Cuidado do Corpo, diz que o corpo é um presente que precisa ser zelado, mas com equilíbrio. Porque de nada adianta um corpo blindado por fora e uma alma desidratada por dentro. O cuidado precisa envolver também a mente e o espírito.
E, convenhamos, não tem nada de saudável em viver com culpa por comer um pão. Ou treinar só para se sentir aceito. Ou amar o espelho, mas detestar o silêncio e a própria presença.
Cuidar do corpo é indispensável. Mas sem transformar isso num reality show . Sem esquecer que existe vida além das corridas e treinos.
Então, vamos pensar juntos — e com leveza, sem whey no café por um segundo:
1)Você está cuidando do seu corpo, ou está só seguindo a manada? Há propósito nisso?
2)A saúde que você cultiva é sua ou do algoritmo da rede social?
3)Sua mente e seu espírito estão acompanhando o ritmo do shape do seu corpo?
4)Você come com culpa? Treina com raiva? Dorme mal e acorda afogado em metas?
5)Está saudável, ou apenas obedecendo silenciosamente o script social do “estilo de vida”?
Saúde é bem mais do que foto suada e frango grelhado. É se sentir em paz dentro da própria pele — mesmo quando ela não está bronzeada, nem trincada. Vá além de seguir o cardápio das multidões, cuide do seu corpo, entretanto, cuide com a mesma dedicação de sua mente e alma.