Entrevista concedida ao jornalista Roberto Gonçalves em 1980 em ArapiracaManoel Florêncio da Costa, na época aos 93 anos, sargento reformado da Polícia Militar de Alagoas é a imagem pura e viva da expressão de Euclides da Cunha em sua maior obra “Os Sertões”. “O sertanejo é antes de tudo um forte”. Lúcido e muito alegre contou com detalhes parte da trajetória da sua vida nos seus 31 anos de atividades na PM, combatendo o grupo de Lampião nos sertões do estado. O velho soldado acomoda-se na sala da sua humilde residência no bairro Primavera e com a sua melhor indumentária detalha as lembranças com lágrimas nos olhos daquela época sangrenta nos sertões nordestinos.
Tem pernas fracas e caminha com dificuldade apoiado num cajado de madeira, tem o rosto enrugado e as mãos calejadas, muitas histórias saem da sua mente. Ao longo dos 93 anos, teve 18 filhos, sete estavam vivos. Conta que ingressou na PM em 1924, não sabia ler, nem escrever, possuía a coragem e bravura para enfrentar os cangaceiros de Lampião. Naquela época, a coragem era o passaporte para ingressar nas suas fileiras. Seu protetor foi coronel José Lucena Maranhão, perseguidor implacável do “Rei do Cangaço”.
“Cordão” como é conhecido carinhosamente, tinha na gratidão e na amizade os sentimentos que mais cultivava. Devoto fervoroso de meu “Padim Ciço” e de Nossa Senhora Aparecida.
Como militar na sua missão de defender a sociedade, expunha a própria vida. Nasceu em 27 de outubro de 1905, em Água Branca alto Sertão de Alagoas, era dotado de uma coragem pessoal sem limites. Após ingressar na polícia militar passou a integrar uma das volantes de combate à Lampião.
Conta que as volantes eram formadas por 360 homens armados de fuzil. O grupo de Lampião, fortemente armado era dividido em grupos, um dos grupos tinha um contingente de 150 homens. Os bandidos levavam vantagens para os homens da lei, pois suas armas eram novas e tinham munições em grande quantidade e de boa qualidade. Os bandidos tinham a proteção dos coiteiros e de ricos fazendeiros de vários estados do Nordeste: Alagoas, Sergipe, Pernambuco, Bahia e até do estado do Ceará.
Combate com grupo de Lampião.
Manoel Florêncio da Costa, fica emocionado, em alguns momentos as palavras saem com dificuldades, sua atuação foi no tempo em que havia o respeito pela Polícia. As diligências eram realizadas no lombo dos cavalos, a comunicação era muito difícil, não existiam estradas. A Polícia tinha a difícil missão de combater o grupo de Lampião. O coronel Lucena não perdoava os grupos de cangaceiros, muitos deles eram mortos, decapitados suas cabeças e enterrados nas caatingas, era a lei do Sertão, conta o velho soldado.
Um dos combates da volante comandada pelo temível e respeitado Coronel Lucena, descrito por Manoel Florêncio foi na fazenda Papagaio em Pão de Açúcar. O tiroteio foi terrível, os disparos constantes dos fuzis causavam um clima de muito terror. O sangue dos soldados e bandidos escorriam pelos lajedos das caatingas do Sertão. Vários cangaceiros feridos, alguns morreram e foram levados pelo grupo de cangaceiros, eles não queriam demonstrar que houve baixas no bando, não queriam mostrar fraqueza, conta o velho soldado, que neste combate teve frente à frente com o cangaceiro “Candieiro” e por pouco não morreu. “Fui salvo pela minha grande fé à Nossa Senhora Aparecida”, desabafou o velho soldado da PM de Alagoas.