Utilizar o humor como ferramenta para criticar, satirizar e provocar tocando em assuntos delicados não é novidade. O famoso grupo inglês Monty Phyton teve êxito nessa tarefa de fazer graça e gerar reflexão com os clássicos "O Sentido da Vida" (1983) e especialmente em "A Vida de Brian" (1979), filme que traz o personagem Brian, contemporâneo de Jesus, passando pelas provações de seu tempo. Porém, para alcançar o propósito maior de fazer rir e questionar, a comédia que brinca com a história deve se manter distante da ofensa gratuita cujo único objetivo é provocar polêmicas vazias. Tal recurso acaba denunciando certa falta de criatividade para cutucar e ao mesmo tempo chegar a algum lugar.
"A Primeira Tentação de Cristo" (2019) é o segundo especial de Natal do grupo Porta dos Fundos para a Netflix. O primeiro recentemente ganhou um importante prêmio internacional, mas confesso que não encontrei muita graça no especial natalino. Na nova produção continua a carência de um bom texto para aproveitar o talento de Fábio Porchat e Rafael Portugal, os grandes destaques da trupe. As piadas acabam caindo no lugar comum de brincar com a sexualidade de figuras históricas apenas para incomodar, mas se você, na qualidade de espectador, verbalizar o incômodo facilmente receberá a carapuça de conservador, crente (no sentido pejorativo que alguns atribuem) e censor da liberdade. O Porta dos Fundos já mostrou em outras oportunidades que pode fazer melhor.
Comédia e respeito não precisam andar em lados opostos, e ao falar isso não estou me posicionando no lado do politicamente correto. Longe disso. É apenas uma questão de propósito ou da falta dele. A risada é o disfarce do comediante para passar sua mensagem, então, sem algo a dizer, o Especial Porta dos Fundos materializa a criança que quebra a árvore de Natal buscando atenção.
Espero que o Papai Noel traga um presente melhor no próximo ano.
4.0