Pelo menos 20 das 305 etnias indígenas brasileiras praticam o infanticídio. As crianças são sacrificadas por vários motivos: casais de gêmeos, filhos de mães solteiras, pessoas com deficiência ou com doenças desconhecidas pelos índios.

O assunto foi tema de audiência pública ocorrido nesta quarta-feira (24), na Comissão de Direitos da Pessoa com Deficiência da Câmara dos Deputados. O debate foi proposto pela deputada federal Rosinha da Adefal (Avante/AL), e teve como objetivo principal tentar encontrar um equilíbrio entre o respeito à cultura indígena e o direito à vida. A deputada Rosinha da Adefal (PTdoB-AL), que solicitou a audiência, explicitou sua escolha.

"Essa cultura não pode continuar sendo preservada acima da vida de crianças. Nada é mais importante do que a vida de uma pessoa, independentemente de sua etnia, de sua crença ou sua cultura. Temos que romper o silêncio, combater os assassinatos, criarmos e cobrarmos a efetiva proteção dos indígenas com deficiência."

O encontro contou com a presença de representantes da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Gustavo Menezes; da ONG ATINI, Damares Alves; da Secretaria Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência; Carolina Sanches; e da índigena com deficiência e sobrevivente, Kanhu Raka Kamayurá (Sheila).

Kanhu, tem 18 anos. É da etnia Kamaiurá, um dos grupos que vivem no Parque Nacional do Xingu, tem distrofia muscular, é cadeirante e só foi salva porque a família se mudou para Brasília quando ela tinha 7 anos. Sua história emocionou a todos que participavam da audiência pública.

"Eu era tratada como um animal, eu tive que viver em condições horríveis, que viver na escuridão, onde não via luz, onde não tinha contato com ninguém."

O drama de Kanhu foi um dos muitos mostrados durante a audiência. Alguns deles relatados pela Ong Atini, que acolhe crianças rejeitadas pelas tribos. A representante da Ong, Damaris Alves, ressaltou o sofrimento dos familiares que se deparam com as exigências de tradições culturais que resultam em infanticídio.

"Nós trabalhamos com mães que, quando são obrigadas a cumprir a prática, sofrem. Nós temos nas florestas do Brasil mães que sofrem e choram."

Projeto O infanticídio indígena é tema de um projeto de lei (PL 1057/07) que está no Congresso há 10 anos. Ele pune quem não denunciar a prática e prevê que as crianças ameaçadas sejam encaminhadas para adoção.

Apelidada de Lei Mujawi, em referência a uma índia que salvou da morte a filha com paralisia cerebral, a proposta já foi aprovada pela Câmara e encaminhada ao Senado, onde está sendo examinada pela Comissão de Direitos Humanos.

Segundo a deputada Rosinha da Adefal, é necessário romper a resistência no Congresso e dar celeridade à aprovação da Lei Mujawi, bem como buscar políticas públicas efetivas, que protejam as crianças e modifiquem esse entendimento cultural.

“Nossa proposta é promover um trabalho conjunto, com a Funai, com a Secretaria da Pessoa com Deficiência, com as Ongs, de educação para transformar a cultura do infanticídio nas etnias que ainda mantêm a prática”, explicou a deputada.