Preciso falar sobre Bruno...

21/11/2016 15:00 - Vanessa Alencar
Por redação
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Querido leitor, inicialmente peço desculpas pela ausência por aqui nos últimos dias. Em uma semana, perdi um pedaço imenso do meu coração: meu irmão, Bruno Alencar, morreu de forma repentina, inesperada e (não consigo encontrar um adjetivo para expressar minha perplexidade): aos 36 anos, vítima de infarto.

Eu, Bruno e João, nosso outro irmão, somos "um por todos e todos por um", sabe? A sensação de desfalque traz um misto de tanta coisa... Como pode o mundo seguir sem ele? O sol continuar nascendo e se pondo como sempre? Como é triste amanhecer em um mundo sem Bruno... Quantos amanheceres ainda existirão antes que nos reencontremos? E, como a morte deixa - do dia para noite - de ser uma vizinha distante para se tornar um parente próximo, que se mudou de mala, cuia e sem convite para nossa casa? 

Eu sou a irmã mais velha e sempre fui meio mãe dos meus irmãos... Um dia, quando tinha uns dez anos, morávamos em Brasília e tive uma forte crise de sinusite. Fiquei acamada. Era noite e João e Bruno brincavam num campinho em frente ao prédio. Na época, circulava a notícia de que havia uma gangue na região e eu estava apavorada pelo fato de eles estarem sozinhos. Dei o ultimato: ou eles subiam ou eu desceria para tomar conta dos dois, mesmo com febre e dor.

Eles foram obrigados pelos nossos pais a voltar para casa e ficaram com muita - muitaaaa - raiva de mim por estragar a brincadeira. Mas, fiquei aliviada e consegui dormir sabendo que estavam seguros.

Esses "recortes" ficaram muito mais vívidos nos últimos dias, por razões óbvias. Quando João era pequeno, esteve muito doente e, dessa época, recordo de mim, com seis, sete anos, olhando para o céu e rezando na calçada de casa: "Deus, não leva o meu irmão". Foi o mesmo pedido que fiz no dia 13 deste mês, enquanto os médicos tentavam salvar a vida do Bruno na UTI da Unimed: "Deus, salva meu o meu irmão”.

Levei alguns dias para conseguir parar um pouquinho de questioná-lo por não ter atendido minha súplica desta vez e para agradecê-lo pelos 36 anos que desfrutei da companhia, alegria e enorme senso de humor do meu irmão. Com problemas graves de visão, Bruno sempre dizia que o importante não era o quanto enxergávamos, mas, como enxergávamos as coisas.

A verdade é que não entendemos quase nada dos desígnios divinos, mas, o importante é como – e não quanto - enxergamos, né mesmo, irmão? Bruno tinha muitos, muitos planos e era muito, muito feliz. Tinha incontáveis amigos e um coração do tamanho do mundo. Tudo era superlativo nele: a coragem, a alegria, o amor e a pressa de viver.

O texto pode estar um pouco confuso e entrecortado, porque existe tanta coisa a ser dita... Mas, ao mesmo tempo, não há nada que eu não tenha dito a ele em vida. Não existiu um “eu te amo”, “vai ficar tudo bem” ou “conte comigo” não verbalizados. Não existiu o “obrigada por tudo” nem o “perdão” presos na garganta. Tudo foi dito. Tudo foi ouvido.

Deus salvou Bruno durante cada dia de seus 36 anos. Permitiu que ele não deixasse de enxergar a beleza ao seu redor e que desfrutasse de uma vida cercada de amor. Agora, ele poderá ler todos os livros que quis, sem precisar da lupa que levava no bolso para conseguir enxergar, ainda assim com muita dificuldade, as palavras.  

Como diz a música, vai ser difícil sem você, porque você está comigo o tempo todo... Mas, agora, eu quero (preciso) me agarrar em uma canção que ele adorava: “Eu não vim até aqui pra desistir agora”... É o meu jeito de tentar deixá-lo ir e meu tributo à vida que viveu: pulando dos céus sem redes de proteção.

Não posso mais obrigá-lo a encerrar a brincadeira para ficar sob meus olhos (agora você está infinitamente mais bem cuidado), mas, posso repetir para sempre: “Te amo. Vai ficar tudo bem”, com um pequeno acréscimo - esse sim, nunca antes dito: “Até um dia, meu amor”.

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