A cena é pitorescamente desumana: o Secretário de Defesa Social do estado de Alagoas concede entrevista a uma emissora local, sobre uma caçada a criminosos- que supostamente- teriam se evadido para o local.

O palco da entrevista é o Vale do Reginaldo, na capital Maceió, no estado de Alagoas, um bairro marcado e sitiado por crimes cotidianos perpetrados pelo estado alagoano: o desrespeito pela vida humana. Um lugar asfixiando pela pobreza e obras inacabadas. Assim como a vida dos muitos que moram lá.

É no Vale do Reginaldo e nas muitas e tantas e outras periferias distantes e  abandonadas pelo poder público que a polícia - objeto repressor de controle e punição- entra sem pedir licença numa ação flagrante,  repetitiva e muito  potencializada pelas mídias (a história do bem x o mal),secular  criminalização das populações empobrecidas e segregadas

Aqui-diz uma moradora- mora gente de bem, não é só bandido. A gente mora aqui porque não tem pra onde ir. Cadê que as autoridades terminam essa construção para gente morar direito?

É no Vale do Reginaldo que nos deparamos com o  crime de desdém do estado ( amplamente consentido pela sociedade alagoana)  para com seu povo tutelado: os casebres mal ajambrados gritando miséria se confundem com as montanhas de lixo espalhados pelos caminhos da vida do Vale.

Eles não se importam com gente não, dona. Só na época das eleições que prometem tudo, e o pior é que a gente acredita. Sabe, como é que é né, gente pobre vive de promessa.

Existe uma mal disfarçada coesão do estado em torno da ideologia do apartheid social, como política. Um povo aquartelado, apartheizado, fruto de um projeto estruturante e secular de pobreza e desumanização.

O Vale do Reginaldo, como muitas e tantas periferias de Maceió, são palcos preferenciais da suspeição policial, o principio  basilar de que há uma visível dicotomia do estado sobre o  que é segurança pública e a equidade entre pessoas.

Quando as expectativas de vidas, as possibilidades de sociedades inteiras são reduzidos ao extremo;

Quando sociedades inteiras são excluídas do direito as liberdades, a educação, saúde, moradia e emprego, o medo e a criminalidade ganham um terreno fértil.

O conceito de Segurança pública é bem mais do que invadir os territórios vulneráveis à caça de criminosos.

Segurança pública é um serviço que deve ser universal (tem de abranger todas as pessoas) para proteger a integridade física dos cidadãos e dos seus bens.

Fazer segurança pública é criar estratégias a partir de um projeto estruturante de estado para tornar o bairro do Vale do Reginaldo e todos territórios vulneráveis- organismos vivos (cheios de vidas)  e dinâmico, deixando de ser uma sociedade invisível para políticas públicas, rompendo assim com a lógica dominante da exclusão.

E do lixo!

http://g1.globo.com/al/alagoas/altv-2edicao/videos/t/edicoes/v/policia-realiza-operacao-especial-no-vale-do-reginaldo-em-busca-de-suspeitos/3993508/