O que nos causa espanto é o silêncio da imprensa alagoana.

21/02/2013 06:56 - Raízes da África
Por Arisia Barros


Moção de repúdio lida por Denis Angola, representante da Juventude Negra/Alagoas no Comitê Gestor do Plano Juventude Viva, instalado ontem, ( 20 de fevereiro) em Alagoas, na Sala dos Conselhos do Palácio República dos Palmares.


MOÇÃO DE REPUDIO - POR UMA JUVENTUDE NEGRA ALAGOANA VIVA
(em memória de Guto Bandeira).

Em memória de um marco negro, em Alagoas, em memória de um artista negro em Alagoas, em memória de um jovem negro, em Alagoas, em memória de um guerreiro negro, em Alagoas, em memória de uma criança negra em Alagoas, em memória de uma mulher negra em Alagoas, em memórias imemoráveis dos corpos de negros, em Alagoas.
Dificilmente eu posso explicar quão grande é nossa revolta. Dificilmente eu posso expor meus sentimentos em relação à quantidade de jovens negros e negras que violentamente tiveram suas vidas ceifadas em Alagoas.
A Juventude Negra de Alagoas esta em luto, não apenas pelo jovem negro, artista, musico, dançarino, capoeirista e educador Gutembuergue, mas, também ao que podemos, hoje, chamar da negligencia de nossos gestores, e também o que podemos chamar de incentivo ao genocídio de jovens negras e negros.
O Plano Juventude Viva, não pode ser um engodo. O Plano Juventude Viva não pode ser um espaço do silencio. O Plano Juventude Viva é um plano para juventude negra de periferia.
Plano Juventude Negra Viva era assim que todos os gestores ao tratar deste plano deveriam se referir, pois nós ,nas trincheiras periféricas, estamos morrendo e estamos morrendo, não por não ter poder em nossa comunidade e sim por ter.
Gutembergue Bandeira, foi um líder que não se curvou as mazelas à ausência de políticas públicas,e, em nossas trincheiras não iremos nos curvar, estaremos sempre lá, resistindo a tudo e a todos.
Quando se mata jovens negros em Alagoas, quase nunca pensamos que foi o extremo da violência, quase nunca pensamos que existem níveis de violência e que estes níveis tem cor, gênero, classe social e idade. Outro dia vi um vídeo onde uma criança negra, em Maceió, tinha sido capturada no bairro do Reginaldo por estar assaltando. Uma criança de 12 anos, criança esta que era tratada como adulto. Ao ser perguntada por que fazia aquilo ela respondeu:- Eu meto bala mesma, quem vier eu mato, e é assim mesmo, se virem me pegar eu meto bronca. E quando feito perguntado: Onde esta seu pai e sua mãe? A criança respondeu: - Estão mortos. Meu pai matou minha mãe e os caras mataram meu pai.
Num outro vídeo que teve repercussão nacional, policias da força nacional, trazidos a Alagoas pelo Plano Brasil Mais Seguro estavam na periferia torturando a comunidade, com a justificativa de que eram suspeitos. Aí eu pergunto: -Quem não é suspeito na periferia? Qual negro não é suspeito quando vive na condição marginalizada? Quantos de nós, jovens negras e negros, não fomos abordados pela policia porque somos suspeitos?.
Nossos exemplos históricos de como são tratados os negros em Alagoas tem um fato em comum e cito exemplos: Em 1655 o genocídio no Quilombo dos palmares (União dos Palmares), 1832 Insurreição com os mucambeiros Papa-méis, na região litoral (Maragogi), 28 de Abril de1876 a ultima pena de morte no Brasil, escravo Francisco, (Pilar) e em 1912 operação chamado de “Quebra de Xangô” (Maceió), todos estes fatos marcados historicamente pela violência à cultura negra.
Hoje somos nós, jovens negras e negros. Hoje estamos no centro das atenções. Hoje o Plano é Juventude Negra Morta no front de batalha. Hoje estamos sendo exterminados, com a violência extrema, a fogo e ainda sim, hoje não choramos o leite derramado, pois não é só o leite derramado nas periferias, mas sim o sangue de jovens promissores, jovens que poderiam está com um berimbau na mão ao invés de uma arma.
Gutembuerque Bandeira não pode ser apenas uma estatística. Não podemos tratar Guto Bandeira como mais um, nem tampouco justificar seu assassinato como comum, assim como outros assassinatos se tornaram comuns aos olhos de nossa sociedade e justificável até pelos atos extremos.
O que nos causa espanto é o silencio da imprensa alagoana. O que nos causa espanto é a mídia, simplesmente, tratar como comum, mas, para está imprensa e para está sociedade justificável deixamos a pergunta: É se fosse no bairro da Ponta Verde? E se o jovem morto fosse filho do Governador, filho de um Juiz, filho de um Delegado, um Medico?
A revolta não ofusca o sentimento de impunidade e o sentimento de impunidade não ofusca a necessidade de justiça para todas e todos os negros mortos em nosso Estado, pois a cada dia em nosso estado morre um Gutembergue, a cada momento uma bandeira negra é arriada nas periferias.
A juventude Negra Alagoana quer respostas. A juventude negra alagoana quer justiça. A juventude negra alagoana não quer mais crimes a humanidades impunes, nem o genocídio aos jovens negros alagoanos, a juventude negra é a principal vitima da falta de gestão pública. Acabou-se um legado com a morte do Guto. Tudo ele herdou do pai, mas, não acabou nossa necessidade de justiça, nossa necessidade de respostas.
Nesse sentido, é propício o momento para repudiar e reivindicar políticas públicas voltadas à juventude negra, em especifico a juventude negra de Periferia, a juventude que resiste e é hoje o pilar e o futuro deste Estado.
Nós, jovens negros alagoanos, apesar de sermos o alvo deste genocídio declarado, sentimos que é exatamente neste momento que fica claro o que queremos para este Plano Juventude Viva, e o que queremos para este Estado, então assim pautamos como compromisso do Governo para com a Juventude Negra de Periferia.

1. Comprometimento do Governo do Estado ao caso de Gutembergue Casimiro Bandeira;
2. Comprometimento do Governo do Estado com os casos de mortes de jovens negro nas periferias de Maceió, assim como nas periferias dos municípios de alagoas;
3. Comprometimento do Governo do Estado a dar maior assistência aos jovens das periferias;
4. Comprometimento do Governo na ampliação deste comitê gestor com paridade, nas representações civis e governamentais;
5. Comprometimento do Governo do Estado com a Criação da Secretaria da Juventude, tendo em vista que está categoria ainda hoje é desrespeitada e desmerecida diante até mesmo de um plano nacional.

Juventude Negra

* Com alguns ajustes sem interferir na concepção do documento

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