Noite gelada e chuvosa, casa cheia, dois bons shows e uma apresentação especial. Esses foram os ingredientes do primeiro dia do BMW Jazz Festival nesta sexta-feira (8) no Via Funchal, em São Paulo, que teve o trio Corea, Clarke and White, liderado pelo pianista Chick Corea, como atração principal.
A segunda edição do evento, entretanto, começou por pouco antes das 21h para um público tímido que ainda procurava, na escuridão, o assento indicado por seu ingresso. Com apenas 28 anos, o trompetista Ambrose Akinmusire mostrou canções de seu disco de estreia, o aclamado “When the heart emerges glistening”, de 2011, em um show que misturou jazz clássico com momentos de improviso e poucas, mas boas experimentações. Destaque para Walter Smith III e Justin Brown, saxofonista e baterista do quinteto, respectivamente, além do próprio Akinmusire.
Por volta das 22h, Toninho Ferragutti e Bebê Kramer fizeram um dos shows mais empolgantes da noite. A dupla, acompanhada por um quinteto, apresentou uma espécie de “tributo à sanfona”. Exímios tocadores do instrumento, eles receberam a participação de Adelson Viana e Gabriel Levy e demonstraram claramente como a música brasileira – e, mais especificamente, os ritmos regionais – são refinados o suficiente para estarem em um festival de jazz, muito embora compartilhe apenas algumas semelhanças com o gênero.
A principal atração da noite deu as caras no Via Funchal às 23h30. O músico americano Chick Corea está no país com o Return to Forever, grupo formado no começo dos anos 1970 e que já teve como integrantes os brasileiros Airto Moreira e Flora Purim. A banda, que encerrou as atividades antes daquela década chegar ao fim, voltou em 2008 com o lançamento do álbum ao vivo “Returns”. Em 2011, documentaram de vez a reunião com “Forever”, que ganhou o Grammy de melhor instrumental de jazz. Além de Corea nos teclados, o retorno conta com o baixista Stanley Clarke e o baterista Lenny White – talvez por isso seu líder hesite em usar o antigo nome, optando por Corea, Clarke and White.
O show começou com um tema de “muito, muito tempo atrás”, como disse o próprio Chick Corea. Aliás, não faltaram canções do Return to Forever compostas na década de 70, como por exemplo “The romantic warrior”. Mas, no repertório, também estiveram faixas novas como “Light as a feather” ou a surpresa “How deep is the ocean?”, música dos anos 30 que Corea afirmou ter crescido ouvindo.
Já com 70 anos, o músico surpreende por sua disposição e tranquilidade. O toque dos dedos de Corea ao piano é sempre e naturalmente suave, e o traje simples escolhido para a apresentação não consegue esconder sua classe natural que o acompanha desde o princípio de sua carreira. Raras são as ocasiões em que o músico norte-americano "exagera" na força - suas mãos geralmente costumam deslizar sem muito esforço pelo belo piano de cauda à sua frente.
Não dá para deixar de fora os elogios para Stanley Clarke. Com a qualidade e o virtuosismo sóbrio de um veterano, mas mostrando o frescor de um novato, o músico usou o baixo acústico para se divertir e impressionar, em demonstrações que por diversas vezes arrancaram justificáveis aplausos colorosos da plateia.
Tão simples quanto complexa, a apresentação de Corea, Clarke and White teve aproximadamente duas horas para ser contemplada, e conseguiu mostrar que certas reuniões musicais são, mais do que simplesmente bem-vindas, necessárias. Que o retorno seja para sempre.
O BMW Jazz Festival continua neste sábado (9) e domingo (10), às 20h30, no Via Funchal. Ainda no domingo, algumas das atrações do evento se apresentarão gratuitamente ao ar livre às 17h no Auditório Ibirapuera. De 11 a 13 de junho, o festival acontece no Oi Casa Grande, no Rio de Janeiro.