Menino cadê sua mãe? Ele arrodeado de outros meninos e meninas, imagens pálidas de lábios descarnados, responde de imediato: -Minha mãe está trabalhando na zona.
-Que zona, menino? Retruco eu. Ele debochado: - Vai dizer que a senhora não sabe o que se faz na zona? E sintético: Ela é puta!
Por quê? Reacendo a discussão. Ele: - É isso ou trabalhar na boca de fumo. Na grota é assim a miséria empurra a gente para as drogas e minha mãe pede a Deus para que nenhum dos filhos dela seja viciado.
O mundo da infância do menino estava morrendo.
E seu pai? Procuro caminhos.
Pai? Zomba o menino e levando o olhar para um passado remoto, se perde em lembranças dolorosas. Na voz um rasgo de tristeza: - Quando ele arrochava na cachaça ficava doido e batia, batia tanto, mas tanto na mãe e “ni’ nós que foi bem melhor ter ido pra bem longe. Acho que se perdeu nas estradas do mundo.
A mãe até que bateu de porta em porta: - Moça arruma um emprego, mas não encontrou nada e para nos dar comida ela vende seu corpo.
A pureza da infância do menino estava chegando ao fim.
E por que vocês estão na rua? Pergunto nos caminhos da descoberta. Eram cinco entre os 12 anos do menino e a menina mais nova beirando aos dois anos.
- O que a mãe ganha na zona é muito pouco e como sou o único-homem-grande da casa tenho que me virar, aí venho para rua pedir e como não tenho com quem deixar os “mininos” trago tudinho.
A menina mais nova interrompe a conversa com um choro frenético exalando fome.
O menino-quase-homem-da-casa-da-mãe-que-trabalha-na-zona abre uma sacola, que faz tempo foi branca, e de lá saca um pedaço de pão mofado. Como em um passe de mágica o pão mofado cala o lamento da menininazinha.
São crianças pobres, ossinhos desafiando a desnutrição, empalidecendo a pele preta, plantadas nas ruas da grande Maceió.
Só são crianças, não viciadas, não drogadas. São crianças filhas da miséria, desfiando palavras em uma análise aguada da solidão da periferia.
São crianças produtos da miséria programada, predefinida e impositiva, como uma herança mórbida.
Um dos fatores determinantes para a crescente geografia violência que soterra a infância e adolescência dos pretos, pobres e periféricos das terras de Palmares/Alagoas é a pobreza material engordada pelo silêncio cúmplice e paliativo do estado-governo.
Em época de eleição a miséria expulsa a população de suas casas e a põe na boca do lobo, o voto casado: necessidade x corrupção passiva.
As drogas são conseqüências, muitíssimo naturalizadas, da realidade dos pobres, pretos e periféricos na terra de Zumbi.
Pobres, pretos e periféricos tratados como animais antissociais.
Como em um círculo vicioso!
Inquebrantável?

Raízes da África