Tudo é política

02/11/2011 13:15 - Fleming
Por Redação

“Não há nada mais difícil de realizar, mais perigoso de conduzir ou de êxito mais incerto do que tomar a iniciativa da introdução de uma nova ordem das coisas. Porque o inovador tem como inimigos todos os que estavam bem nas condições antigas, e defensores pouco dispostos naqueles que talvez venham a ficar bem nas novas” (Maquiavel, O Príncipe, Capítulo VI).

É incrível o quanto o discurso contra a política é algo fortemente difundido e presente na juventude. A quem interessa tal discurso? A política é vista hoje de forma totalmente distorcida e é praticada todo instante, mesmo quando o indivíduo nega tal condição e postura. Todas as nossas ações cotidianas estão direcionadas para a manutenção da nossa existência individual e coletiva. E essas ações são em larga medida decisões políticas que interferem nas nossas vidas particulares, porém também na vida da nossa comunidade, nosso bairro, cidade, país.

Todas as nossas atividades pessoais ou em grupo desenvolvidas em cada um dos nossos ambientes sociais, invariavelmente, obedecem as nossas posturas ideológicas e culturais, portanto – são posturas políticas. E obedecem acima de tudo as normas, regras e leis que regem aquele espaço social e as suas respectivas mediações constitutivas daquelas características políticas que ali estão. Atuar junto à ordem ou contra é uma atitude política. Contestar injustiças, diferenças, desigualdades e atitudes que coloquem em questão o bem estar social é uma atitude política que deve ser amplamente estimulada e difundida, mesmo sendo um grande desafio.

"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais" (Bertolt Brecht, O analfabeto político).

Nada é realizado de forma totalmente consciente que possa prejudicar ou colocar em risco nossos interesses, objetivos e metas. Em todo complexo social ao qual estamos inseridos raramente desenvolvemos uma atitude de conflito sem base real entre as contradições existentes ligadas aos diferentes interesses de cada um dos sujeitos sociais articulados num mesmo espaço. Resta saber o quanto os interesses sociais individuais colocam em risco os inúmeros interesses coletivos. A omissão – por exemplo – é a postura política individual mais egoísta dentre todas e; tão política quanto o envolvimento direto numa determinada causa coletiva.

Evidentemente, toda postura individual é uma postura política seja lá ela qual for. Assim como toda postura coletiva também é. Hoje, não é o que consideramos ser a política aquilo que negamos, porém tudo que represente a mesma nas suas expressões mais negativas e deturpadas. Logo, mesmo o contrário; ou seja, tudo que é rico e significativo advindo das posturas políticas é negado e tentam passar a falsa ideia de apolítico, indiferente.

Na atualidade, quais os principais desafios daqueles que buscam alternativas para transformar a estrutura atual da sociedade? Que obstáculos enfrentam quem se posiciona em oposição às ações para que tudo permaneça como está?

Pensar um processo transformador da realidade objetiva é algo extremamente complexo e um desafio e tanto partindo de um determinado contexto conservador. E, na verdade, não existe nada mais difícil de modificar e mais resistente à mudança além daqueles que se julgam em condições privilegiadas diante das circunstâncias reais vividas exatamente no espaço social do qual se pretende alterar. Portanto, toda mudança causa tensões, conflitos e rupturas. Toda mudança altera a ordem e quem está bem na ordem atual assume uma postura conservadora, intransigente e reage. Ou melhor, todos que creem que a alteração da ordem atual poderá modificar consideravelmente as condições atuais de existência para pior, reage de forma negativa a toda e qualquer possibilidade real de mudança. Toda tentativa de alteração da ordem é recebida com desconfiança, medo e ceticismo. Porém, toda tentativa de mudança é uma ruptura da realidade que já estamos “acostumados” a viver, sofrer, sobreviver para uma instabilidade quase insuportável sobre o que poderá advir.

Evidentemente que nem todos estão bem nas condições atuais de vida (muito ao contrário), entretanto, como explicar que mesmo aqueles com dificuldades, com angústias reais e incertezas gritantes são incapazes de agir em busca da construção de uma nova realidade para suas vidas? A adaptação e a ausência efetiva de um projeto que represente os interesses coletivos levam alternativas reais de poder a sucumbirem ao imaginário popular por medo de arriscar. Pois não se enxergam representados em discursos aparentemente vazios e projetos um tanto quanto surreais de sociedades para o futuro. É o aqui e agora que interessa de forma objetiva e direta. São as respostas reais para o mundo real que ecoará para além dos discursos formulados nos séculos XIX e XX.

Portanto, a posição de todos aqueles envolvidos na busca pela transformação social não representa apenas uma tendência que visa certo choque de ideias e conflitos sociais, porém, inegavelmente, a tentativa primeira de ação para a melhoria efetiva do sistema político vigente e contrário a todas as suas degenerações burocráticas.

Em bom português, as respostas e as novas atitudes surgirão com mais força quando formos capazes de elaborar as principais questões sociais coletivamente ao tempo em que respondermos essas três: o que, como e quando mudar?!
 

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