Para reflexão...
E-mail anônimo derruba o governo
Golbery Lessa- Historiador
Até ontem, uma única mensagem eletrônica era incapaz de derrubar um governo.
Hoje, já não tenho certeza.
Desde a semana passada, os computadores dos alagoanos contêm um e-mail com um texto de desabafo de um anônimo servidor convocando o povo para derrubar o governo estadual.
Os instrumentos seriam uma manifestação gigantesca em frente ao Palácio República do Palmares, no dia de hoje, 27 de maio de 2011, e a solicitação da abertura de um processo de impeachment.
Beira o realismo fantástico o fato de que as mal traçadas linhas da obscura mensagem tenham despertado uma espécie de “grande medo” nas lideranças sindicais, no chefe do Executivo e em vários setores da população.
Tamanha fragilidade de espírito na sociedade civil e no Estado demonstra que algo de muito grave e profundo está corroendo o tecido social de Alagoas.
O governador parece possuir acentuada sensibilidade em relação à opinião publicada no mundo digital. Até agendou um encontro com os mais conhecidos “blogueiros” locais.
Quem sabe seja por isso que fez publicar ontem nos jornais impressos, um dia antes do fatídico 27 de maio, propugnado como o dia D pelo e-mail anônimo, um manifesto de apoio ao seu governo assinado por cerca de uma centena de entidades, entre as quais podemos encontrar desde clubes de futebol e poderosos grêmios empresarias até associações de bairro.
O que pensar diante de um governo que levanta trincheiras perante um mísero e-mail mal escrito? O que resta da legitimidade de um governo que imagina precisar clamar pelo apoio explícito da parte conservadora da sociedade civil para enfrentar um pasquim eletrônico?
O mesmo se passa entre os sindicalistas.
Confusos e abatidos diante das desastrosas consequências do seu abandono dos trabalhadores do setor privado, constrangidos diante da antipatia que as greves em setores essenciais causam entre a população, seguem realimentando o economicismo e o politicismo que os funcionários públicos desenvolvem quando permanecem isolados dos setores operários.
Os sindicatos já avisaram que não têm nada a ver com o e-mail anônimo e com qualquer manifestação marcada para hoje.
Porém estão com receio de perder a liderança dos protestos contra o governo do estado para forças ocultas que resolvam emergir neste fatídico 27 de maio.
A causa desta presepada, para escrever em bom “alagoanês”, reside no vazio de racionalidade social e política que se criou a partir do fato de que nem a oligarquia canavieira nem a esquerda local demonstram ter um projeto de modernização para Alagoas que seja socialmente inclusivo e economicamente factível.
O governo atual não consegue superar a letargia do estado porque se sustenta essencialmente na oligarquia do açúcar, grupo social que não se interessa, nem pode vir a se interessar, pela diversificação econômica e pelo fim do patrimonialismo. O seu projeto é apenas permanecer no passado, é estacionar num capitalismo eternamente travado por um modelo exportador.
No que se refere ao desenvolvimento de uma formação social, não existe oração sem sujeito.
São as classes ou conjuntos de classes que elaboram os projetos de sociedade de acordo com seus interesses e os impõem aos seus representantes políticos.
A oligarquia alagoana tem o seu projeto, que é o arcaísmo.
Resta, portanto, como saída para o travamento do progresso social, que está levando o estado à beira do caos e do realismo fantástico, a iniciativa das classes trabalhadoras e das classes médias.
Ao contrário da oligarquia, essas classes só têm a ganhar com a diversificação e o avanço inclusivo da economia, bem como com o fim do patrimonialismo e do clientelismo.
Mas é necessário que os formadores da opinião crítica convençam as lideranças desejosas de representar a maioria do povo de que é necessário mudar o rumo político da esquerda e apontar a bússola para um projeto progressista que tenha começo, meio e fim.
Pode ser que até o fim do dia o obscuro e-mail derrube o governo. Contudo, é certo que será preciso mais para construirmos uma Alagoas democrática e generosa.