Ceder a uma tentação em plena liquidação uma vez ou outra pode até ser algo comum para muita gente. Mas especialistas alertam que, para alguns desses consumidores, o hábito excessivo pode ser sintoma de uma doença que leva a pessoa a comprar de forma compulsiva, a oniomania.

O nome é complicado, mas os sintomas são muito comuns. Os oniomaníacos são pessoas viciadas em consumir, assim como alcoólatras são dependentes da bebida. Para elas, a compra tem efeito semelhante ao de uma droga: alívio e prazer no momento do ato e retorno dos sintomas pouco tempo depois, fazendo com que a pessoa sinta a necessidade de consumir novamente.

A atitude pode ser caracterizada como distúrbio no controle dos impulsos ou como uma doença obsessiva-compulsiva, caso seja acompanhada por outros comportamentos compulsivos característicos, como contar objetos sem parar, por exemplo.

Segundo a médica e psicanalista Soraya Hissa de Carvalho, quem possui essa doença é ansioso e, muitas vezes, mente e omite para encobrir a compra. O motivo desse comportamento é a culpa e o arrependimento que sente.

- Para o compulsivo, o que excita é o ato de comprar, não o objeto comprado. Essa pessoa tem vontade de adquirir, mas não de ter.

As consequências são orçamentos estourados, débitos impagáveis, famílias inteiras endividadas e, em alguns casos, até roubos e outros atos ilícitos – tudo para saciar a necessidade de comprar. Soraya explixca:

- Algumas vezes, aplicam golpes, passam cheque sem fundo e pedem dinheiro emprestado para quitar as dívidas geradas pela compulsão. Não é um defeito de caráter, é uma doença mesmo, a pessoa não é desonesta, ela tem uma incapacidade de controlar esse impulso. Elas chegam ao tratamento porque acabam atrapalhando a vida das outras pessoas.

Mas não vá achando que você faz parte desse grupo, que atinge cerca de 3% da população brasileira, só porque adora uma promoção. A aceitação e até o incentivo desse tipo de atitude por parte da sociedade dificulta a identificação de quem é oniomaníaco e quem apenas exagera de vez em quando.

Especialistas alertam que, como todo dependente, os consumidores compulsivos demoram a admitir seu vício. A doença começa a se desenvolver por volta dos 18 anos, mas pode só ser percebida até uma década depois.

Durante esse tempo, a pessoa pode seguir comprando compulsivamente e acabar adquirindo dívidas muitas vezes maiores que a sua renda mensal. A ajuda só é procurada quando a situação financeira da pessoa e, na maioria das vezes, a de sua família, chega a uma condição insustentável.

Causas

Para especialistas, a oniomania pode ser causada por uma conjunção de fatores biológicos e psicológicos. De acordo com neuropsicólogo Daniel Fuentes, a doença pode estar associada a transtornos do humor e de ansiedade, dependência de substâncias psicoativas (álcool, tóxicos ou medicamentos), transtornos alimentares (bulimia, anorexia) e de controles de impulsos.

As mulheres são as mais atingidas, diz Fuentes, que informa que a proporção da doença é de quatro mulheres para cada homem. Os especialistas ainda não sabem o porquê desse índice, mas acreditam que o motivo está diretamente relacionado a condições culturais.

A psicóloga Denise Gimenez Ramos, coordenadora do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica da PUC-SP, explica ainda que a oniomania pode surgir como uma forma de aliviar sentimentos de frustração, vazio e depressão.

Assim, pessoas que não conseguem dar vazão a desejos de possuir, de ter poder, acabam sofrendo com uma enorme pressão interna que a leva à necessidade de possuir coisas novas (mesmo que não precisem ou que não usem depois) como única forma de prazer.

Por isso é fundamental que amigos e familiares fiquem atentos quando uma pessoa querida exagera no consumo, não consegue controlar o desejo de comprar ou realiza gastos frequentes e excessivos, que interferem em vários aspectos de sua vida.

Tratamentos

Para quem já identificou a doença, especialistas recomendam tratamentos que incluem acompanhamento psicológico e medicação, além de, em alguns casos, passar o controle dos bens para alguém de confiança.

Mas para que isso surja efeito é fundamental que a pessoa reconheça que está doente e que precisa de ajuda, afirma Soraya.

- O primeiro passo para a cura de qualquer vício, seja por drogas, álcool ou compras, é aceitar e desejar ser tratado.

Para auxiliar nessa recuperação existem até grupos de auto-ajuda, como o Devedores Anônimos (D.A.), irmandade que funciona dentro dos moldes do Alcoólicos Anônimos (A.A.).

Criado em 1997, o grupo tem como base a proposta dos Devedores Anônimos norte-americano e europeu e já presta serviços em São Paulo, Ceará, Paraná e Rio de Janeiro.