Um sistema de dessalinização que deveria atender famílias no sertão alagoano foi encontrado sendo utilizado como residência particular em Olho d’Água das Flores. A situação foi identificada pela equipe de Recursos Hídricos da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do São Francisco, durante inspeções realizadas na última quarta-feira (20). No local, além da ocupação irregular, os fiscais verificaram equipamentos abandonados a céu aberto e peças retiradas, o que coloca em risco a possibilidade de recuperação do maquinário.
No sítio Sucupira, o equipamento principal de osmose reversa foi retirado da casa de abrigo e colocado ao relento, sujeito a sol e chuva. A estrutura, construída para proteger o sistema, foi apropriada por um morador, que instalou cama, geladeira, fogão e outros móveis no espaço. A equipe também identificou fundações e paredes em construção, sinalizando obras de ampliação irregular dentro do imóvel público.

Além disso, bombas de diferentes tipos e caixas d’água pertencentes ao sistema foram levadas para a residência do responsável pelo equipamento, sob a justificativa de guarda. Para a FPI, a situação caracteriza invasão de patrimônio público e apropriação indevida de bens. O risco maior, porém, é a perda da funcionalidade de um sistema que poderia garantir água potável a dezenas de famílias.
“Enquanto em Carneiros vemos uma comunidade quilombola fortalecida, operando dentro das normas e servindo de exemplo, em Olho d’Água das Flores o que encontramos foi descaso e risco de perda total de um bem coletivo”, afirmou a coordenadora da equipe de Recursos Hídricos da FPI, Elisabeth Rocha.
Modelo quilombola em Carneiros
A poucos quilômetros dali, a realidade foi bem diferente. Em Carneiros, no povoado Lagoa do Algodão, a FPI encontrou um sistema de dessalinização em funcionamento adequado, operado pela própria comunidade quilombola. Um morador capacitado pela prefeitura é responsável pelo maquinário, que fornece água de qualidade através de um chafariz.
Embora a equipe tenha registrado pendências — como a falta de pastilhas para o clorador que assegura a desinfecção da água e a ausência de manta protetora para conter o rejeito salino despejado no solo —, o trabalho coletivo da comunidade foi considerado exemplar.
“É um exemplo de como a organização comunitária pode garantir água de qualidade, mesmo em regiões historicamente afetadas pela escassez”, destacou Elisabeth Rocha. Para ela, a experiência quilombola demonstra o potencial das comunidades tradicionais quando recebem capacitação técnica e acompanhamento. “Quando há comprometimento da comunidade e suporte dos órgãos responsáveis, os sistemas de dessalinização funcionam e melhoram a qualidade de vida das pessoas”, completou.
Contraste que exige atenção
As duas situações encontradas pela FPI no mesmo dia expõem os extremos vividos pelo semiárido alagoano: de um lado, o desperdício e a apropriação indevida de equipamentos públicos; de outro, a prova de que a gestão comunitária pode transformar tecnologia em dignidade. O contraste, segundo a coordenação da FPI, reforça a necessidade de fiscalização constante e do fortalecimento das comunidades locais na administração dos sistemas de água.
A equipe de Recursos Hídricos - Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário - é composta por Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Alagoas (Crea-AL), Conselho Regional de Química da 17ª Região (CRQ-17), Conselho Regional dos Técnicos Industriais da 3ª Região (CRT-3), Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL), Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE), Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau) e Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh).
*Com Ascom MPAL