Vejo com prazer a ocupação da nova Praça do Centenário pela população do entorno. E não só do entorno, porque muita gente de outros bairros tem ido até o local, levando os filhos ou indo tomar um bom café regional aos domingos, bastante concorrido naquele espaço.

Fui moleque de rua, criado em praças – assim mesmo no plural -, que eram lugares seguros (faz tempo, viu, gente?) onde brincávamos, jogávamos futebol, namorávamos, ou simplesmente nos encontrávamos para tramar algumas presepadas de menino. Algumas delas me provocam ainda, em replay, ótimas risadas, mesmo que terminem com algum remorso. Às nossas vítimas, peço um sincero perdão, ainda que tardio.

(Menino é raça que não presta, mas lamento pelos que não conseguiram sê-lo para guardar lembranças que ajudam a viver.)

Nosso território, já que na rua eu era um bicho coletivo, se estendia da praça da igrejinha, ali na beira do riacho Salgadinho - que então ainda respirava alguma vida -, passava pela Praça de Sinimbu, onde o Mijãozinho era atração garantida, a nos convidar ao gesto natural, e seguia cidade adentro, à medida em que crescíamos a nos preparávamos para a inevitável reprodução.

Não havia erro: se não sabia para onde ir e o que fazer, buscar uma praça próxima era certeza de encontrar alguma turma disposta a ocupar o tempo com ações que davam sentido à vida - ou apenas garantiam alegria passageira, produto valioso desde sempre.

Nos tempos dos hormônios alcançando a flor da pele, a Praça Deodoro, a Praça dos Martírios e, especialmente no Natal, a Praça da Faculdade, que eu vi ser desprezada pela prefeitura de Maceió, nos meus tempos de CCBi (no final dos anos de 1970), atraía uma gente bem jovem que sonhava com amores definitivos, ainda que não soubessem que eram passageiros.

 Não sei quem determinava aquele padrão de comportamento, mas o fato é que nas paqueras que ocorriam nas praças, todos caminhávamos em círculos  para encontrar mais uma vez e outra vez aquela (ou aquele) de quem lembraríamos com saudade quando as luzes se apagavam e a cama convidava ao descanso.

O detalhe fundamental, sem o qual a brincadeira não funcionaria: meninos giravam para um lado; meninas no sentido contrário. Como isso começava a cada noite, confesso que nunca me contaram – e à época nem dei conta de que era assim. Quem chegava ia surfando na onda da sua turma, claramente identificada  por gênero (o que só se desfazia quando aconteciam os desejados encontros).

O primeiro prefeito de Maceió a valorizar o espaço público, como ambiente de convívio, foi Sandoval Caju, o prefeito do S, injustamente assim lembrado (- Se é num banco de praça, significa “sente-se”; se é na porta de um banheiro público, “sirva-se”, se é no rela-rela, “suba” – eis as explicações lógicas do ótimo e saudoso personagem, que a ditadura tratou de cassar, sabe-se lá por quê).

Aliás, sempre é bom lembrar, Sandoval Caju instalou numa praça (na Ponta Grossa) o primeiro aparelho de televisor em lugar público no Brasil. Entendia o prefeito que espalhou o epíteto “Cidade Sorriso” como a identidade da capital alagoana, que um lugar estaria tanto mais vivo quanto mais gente atraísse.


Populista, o Sandoval?

Há quem prefira defini-lo assim. Como eu o conheci de perto, em conversas que guardarei na minha memória afetiva até o fim dos meus dias, asseguro que ele era muito mais do que isso. Daí que, aqui e ali, será lembrado mais pelos seus feitos e menos pelos seus defeitos (que todos nós os temos). 

Ao contrário de outro prefeito, que veio bem depois da reforma urbanística cajuana e que resolveu prender as praças, trancafiá-las em grades de ferro, prisioneiras em uma cidade que ia perdendo os últimos resquícios de inocência (se é que um dia a tivemos). Uma sentença dura. 

Certamente o tal mandatário nunca ouviu - ou se ouviu, não processou - a palavra pertencimento. Pode ter certeza: onde ele está presente tem gente cuidando e zelando pelo bem comum, entendendo que também é seu.