Sobre prevenir, acompanhar e tratar

30/05/2023 10:44 - Avança+
Por redação
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Aprendi, ao longo da vida, que a boa convivência depende da prática diária de uma escuta ativa do outro, mantendo o diálogo com atenção e interesse. Toda vez que visito uma escola procuro ouvir o que alunos, professores e servidores têm a dizer sobre suas vivências e necessidades. Na tarde desta segunda-feira, 29 de maio, pude ampliar essa percepção promovendo uma audiência pública para debater um dos temas sensíveis da atualidade: o cumprimento da Lei nº 13.935/2019, que prevê a prestação de serviços de Psicologia e Assistência Social em escolas públicas de todo o país.

Nos últimos anos, o tema saúde mental deixou de ser assunto de um nicho e passou a interessar a maior parte da população que, direta ou indiretamente, sofre os impactos produzidos por uma sociedade cada vez mais fragilizada por inúmeros gatilhos. O período pós-pandemia da Covid-19 vem evidenciando estatísticas que assustam: 31% da população mundial sofre com a ansiedade e 28,9% apresentam diagnóstico de depressão, segundo a OMS.

Durante a audiência pública, abordamos um dado ainda mais preocupante, referente aos adolescentes em idade escolar, de 10 a 19 anos, com 14% de ocorrências de algum tipo de desordem mental. Por isso a urgência de debater e fiscalizar o cumprimento da legislação. As secretarias municipais e estaduais de Educação precisam adotar as medidas cabíveis para prevenir, acompanhar e tratar as questões existentes e largamente difundidas sobre a vulnerabilidade emocional no ambiente escolar.

Os depoimentos e falas dos especialistas chancelam números que já conhecemos: 34% dos estudantes brasileiros enfrentam dificuldades para controlar suas emoções, 24% se sentem sobrecarregados e 18% estão tristes ou com algum grau de depressão. Os dados constam em uma pesquisa patrocinada pelo Itaú Cultural, Fundação  Lemann e BID. É a mesma percepção dos professores: 92% concordam que os alunos vêm apresentando maior dificuldade de concentração, segundo constatado em um levantamento do Instituto Península.  

Os números falam por si, mas os fatos revelados constantemente pela imprensa comprovam nosso atual estágio de fragilidade, com inúmeros casos de surtos coletivos de ansiedade, com ocorrências em escolas de Pernambuco, São Paulo e aqui mesmo em Alagoas. Outra preocupação recorrente é com o avanço da violência nas unidades de ensino, como já abordei em inúmeros pronunciamentos, entrevistas e artigos. Lembrando que, entre 2022 e 2023, tivemos uma intensificação desses ataques, com cinco episódios dentre os 23 registrados no país desde o ano de 2002. 

Mas não são apenas os alunos que ficam expostos a situações que fogem da normalidade no ambiente escolar. Os profissionais da educação também apresentam graus variados de estresse e depressão. Em um levantamento realizado com 5 mil profissionais pela organização Nova Escola e Instituto Ame Sua Mente, 21% relatam problemas de natureza emocional. Mesmo assim, a maioria dos professores se mostram mais preocupados com a vulnerabilidade dos seus alunos do que com a própria saúde mental. 

Um outro ponto muito importante: a escola é historicamente um ambiente sensível à identificação de casos de exploração e abuso sexual. Estamos no Maio Laranja, dedicado ao combate a essas práticas hediondas e precisamos manter a luta ativa diariamente, o que torna ainda mais essencial a presença de especialistas no acompanhamento desse tipo de ocorrência. 

O meu objetivo, com a audiência pública, é despertar cada vez mais essa escuta ativa, debatendo e, sobretudo, fiscalizando o cumprimento da lei. Todos sabem da importância da atuação dos profissionais das áreas de Psicologia e Serviço Social na identificação e no acompanhamento dos casos que envolvem a saúde mental no ambiente escolar. Essa atenção multidisciplinar garante que o direito à educação seja potencializado em seu alcance e efetividade. 

Ao reunir os Conselhos Federais de Psicologia e Assistência Social, representantes dos poderes públicos em todas as esferas, especialistas e sociedade civil interessada no tema, pretendo levar essa demanda adiante. Precisamos oferecer suporte, capacitação e informação para que secretarias municipais e estaduais de Educação possam, efetivamente, por meio de concurso ou contratação, ampliar seus quadros nessas duas áreas e fazer cumprir a lei. 

Ao longo dos últimos anos tenho ouvido relatos de estudantes, professores e servidores sobre a ansiedade e o medo que passam a fazer parte de suas rotinas, com uma frequência cada vez maior. Sobrecarregados e exaustos, muitos profissionais se sentem despreparados para orientar seus alunos. Uma equipe interdisciplinar proporciona acolhimento, com a qualificação necessária e a atenção devida. Por isso a aplicação da lei em todo o país traz tanta esperança. E isso é algo fundamental para garantir o avanço da educação brasileira.

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