Em documento enviado ao Tribunal de Justiça, datado de 3 de janeiro deste ano, o procurador-geral de Justiça Márcio Roberto Tenório de Albuquerque pediu o arquivamento da Ação Penal contra o deputado Marcelo Victor por “desvio de dinheiro público”.

É bem verdade que o presidente da Assembleia Legislativa não é o único acusado pela denúncia apresentada ao Tribunal de Justiça pelo ex-PGJ Alfredo Gaspar de Mendonça.

Os outros dois, no entanto, poderão ser beneficiados pela iniciativa do procurador Márcio Roberto. São eles: Fernando Toledo, atual presidente do Tribunal (de faz) de Contas do Estado de Alagoas e o neodeputado “verde”, Luciano Amaral.

De novo: não entro em debates sobre a “hermenêutica”, até porque sobre essa senhora (?) diz-se muito e de tudo.

O fato

O que aponta o Ministério Público Estadual?

Que os três, supostamente, “teriam desviado expressiva soma de recursos públicos em favor de servidores da Assembleia Legislativa Estadual, sem respaldo legal algum, a título de pagamentos atrasados e diferenças salariais, fato que teria ocorrido entre os meses de setembro e outubro do referido ano (2012).

Acusações do MP

O Ministério Público imputou aos acusados a prática dos crimes de peculato (art. 312, § 1o, do Código Penal), inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do Código Penal), ordenação de despesa não autorizada por lei (art. 359-D do Código Penal), em continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal) e mediante concurso de pessoas (art. 29 do Código Penal).”

De acordo com a denúncia do MP, o então presidente da Assembleia Fernando Ribeiro Toledo destinou para seus assessores mais próximos a importância de R$ 876.089,42 (oitocentos e setenta e seis mil, oitenta e nove reais e quarenta e dois centavos) a título de “folhas suplementares, mediante sucessivos créditos indevidos e ilegais”.

Quanto ao hoje presidente da Assembleia, diz o MP, “verifica-se a previsão do montante destinado ao demandado Marcelo Victor (sigla MV) no valor de R$ 911.500,00, em parcelas de R$ 500.000,00, R$ 300.000,00, R$ 100.000,00 e R$ 11.500,00. Porém, essa estimativa ficou aquém do que realmente foi creditado”.

Isso foi o que apontou e escreveu Alfredo Gaspar de Mendonça, quando PGJ.

Está claro: seu sucessor discorda.

Em resumo, Márcio Roberto afirma que “verifica-se a prescrição da pretensão punitiva em relação ao crime de ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do Código Penal)”.

E segue:

“Em segundo lugar, embora o Parquet esteja em discordância com os motivos apontados na Questão de Ordem, em revisita às provas colacionadas, verifica-se insuficiência para comprovação do elemento subjetivo dos tipos previstos nos arts. verifica-se a prescrição da pretensão punitiva em relação ao crime de ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do Código Penal).”

O blog pede licença para destacar um trecho – enigmático? - do documento do PGJ Márcio Roberto sobre a denúncia protocolada por Alfredo Gaspar quando estava sentado na sua cadeira:

Numa ligeira digressão, impende ressaltar que, consoante vem decidindo reiteradamente o eg. Supremo Tribunal Federal, o ajuizamento da ação penal contra alguém não pode constituir-se em mera expressão da vontade pessoal e arbitrária do órgão acusador, deve apoiar-se em base empírica idônea que justifique a instauração da persecutio criminis, sob pena de configurar-se injusta situação de coação processual, pois não assiste, a quem acusa, o poder de formular, em juízo, acusação criminal desvestida de suporte probatório mínimo. É necessário, pois, um juízo inaugural de delibação, inclusive para verificar a tipicidade do fato. Dúvidas frágeis devem ser extirpadas logo de início, evitando-se julgamentos indevidos.

(Essa foi com o Alfredo Gaspar?)

Ao TJ caberá aceitar a nova ou a velha versão do caso (que a hermenêutica seja sábia).

Eis a íntegra do documento do PGJ Márcio Roberto Tenório Albuquerque:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR DO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DE ALAGOAS RELATOR DO PROCESSO Nº 9000080-29.2019.8.02.0900

MP no 08.2019.00067708-0

PARTE ATIVA: Ministério Público do Estado de alagoas

PARTE PASSIVA: Fernando Ribeiro Toledo, Marcelo Victor Correia dos Santos, Luciano Suruagy do Amaral Filho

Cuida-se de ação penal na qual se imputou aos réus os delitos previstos nos artigos 312, 313-A e 359-D, todos do Código Penal, referentes à conduta de desviar valores para o pagamento a servidores da ALE, sob o pretexto de “diferenças salariais” ou “verbas salariais em atraso”, sem respaldo de legalidade.

Houve suspensão do trâmite processual durante o período de pandemia de Covid-19 (cf. despachos de fls. 1254/1255 e 1263).

Com a retomada do feito, a defesa do réu Marcelo Victor Correia dos Santos, apresentou questão de ordem na qual arguiu, em apertada síntese, que mudanças jurisprudências recentes influenciam a análise dos autos de modo a ensejar a rejeição da denúncia.

Passa-se à análise.

Numa ligeira digressão, impende ressaltar que, consoante vem decidindo reiteradamente o eg. Supremo Tribunal Federal, o ajuizamento da ação penal contra alguém não pode constituir-se em mera expressão da vontade pessoal e arbitrária do órgão acusador, deve apoiar-se em base empírica idônea que justifique a instauração da persecutio criminis, sob pena de configurar-se injusta situação de coação processual, pois não assiste, a quem acusa, o poder de formular, em juízo, acusação criminal desvestida de suporte probatório mínimo. É necessário, pois, um juízo inaugural de delibação, inclusive para verificar a tipicidade do fato. Dúvidas frágeis devem ser extirpadas logo de início, evitando-se julgamentos indevidos.

Primeiramente, verifica-se que os fatos delitivos tratados no presente feito teriam ocorrido até outubro de 2012. Passou-se, portanto, mais de 10 (dez) anos desde então.

De um lado, tem-se que o art. 359-D do Código Penal prevê pena de reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos para o crime de ordenação de despesa não autorizada.

Lado outro, o art. 109 do Código Penal, em seu inciso IV, fixa em 8 (oito) anos o prazo prescricional em casos tais ("... se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro").

Desse modo, verifica-se a prescrição da pretensão punitiva em relação ao crime de ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do Código Penal).

Em segundo lugar, embora o Parquet esteja em discordância com os motivos apontados na Questão de Ordem, em revisita às provas colacionadas, verifica-se insuficiência para comprovação do elemento subjetivo dos tipos previstos nos arts. 312 e 313-A do Código Penal.

Destarte, na exata visão do conjunto dos fatos, nas suas circunstâncias objetiva e subjetiva, inexistem elementos suficientes a indicar a participação dos Denunciados nos crimes descritos na exordial acusatória, estando a denúncia, no momento, sem lastro empírico idôneo.

Lado outro, passados mais de dez anos desde a ocorrência dos fatos, não se vislumbram novas diligências a serem realizadas por ora.

Requer o Parquet o arquivamento do feito sem análise de mérito e sem prejuízo do que dispõe do art. 18 do Código de Processo Penal.

Maceió/AL, 03 de janeiro de 2023.

MÁRCIO ROBERTO TENÓRIO DE ALBUQUERQUE

Procurador-Geral de Justiça 
 

Luciano Romero da M. Monteiro

Promotor de Justiça/Assessor Técnico