Ontem, dia 21, foi comemorado o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. No Brasil, a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, alterada pela Lei nº 9.459, de 15 de maio de 1997, considera crime a prática de discriminação ou preconceito contra religiões.
Mas como é o cenário em Alagoas? Será que o momento atual reforça mais ainda o ódio contra a religião de Matriz africana?
A entrevistada desta semana é a Mãe Graça de Oxum, que é dirigente de um templo de Umbanda chamado ‘Cabocla Jurema e Caboclo Ubirajara’, situado no bairro do Barro Duro, na capital.
1) Você acha que o momento atual da política fez com que algum sentimento anti religião matriz africana crescesse?
Completamente! A atual conjuntura política é de graves tensionamentos em tudo o que diz respeito aos direitos humanos.
Vivemos tempos de retirada de direitos e a onda de discursos de ódios proferidos por chefes de estado e pessoas que ocupam cargos públicos. Isso é o principal fator que impulsiona ataques, crimes e o retrocesso institucional dos direitos das minorias sociais. Nós, povos de terreiro, fazemos parte de um conjunto de grupos que é constantemente atacado e desrespeitado pelos efeitos dessa atual política.
2) Você acha que Alagoas aprendeu algo depois do episódio da Quebra de Xangô?
Aprendeu sim, mas ainda não o suficiente. Alagoas segue sendo um estado extremamente intolerante, racista, onde jovens negros e negras continuam a ser assassinados massivamente pela truculência policial e institucional, deficiência que carregamos desde 1912.
É necessário que haja o esforço irrestrito de trazer a história de nosso estado ao centro de nossas discussões para que hajam reflexões críticas sobre os efeitos do Quebra de Xangô ao povo de terreiro e a toda população de Alagoas.
3) Você já foi alvo de intolerância religiosa. Qual foi o episódio que mais marcou?
Sim, inúmeras vezes. Sou Umbandista desde muito jovem e passei por inúmeras situações de violência psicológica e moral, ataques à minha propriedade, desrespeitos e intolerância.
O caso mais recente foi na vizinhança de meu terreiro, onde tive plantas quebradas e dejetos de animais jogados no portão. Retornar a esses episódios é sempre difícil, mas hoje os encaro como ponto de partida à reflexão sobre o problema da intolerância religiosa de forma mais ampla.
4) A lei que criou o Dia Nacional de Combate à intolerância religiosa completou 15 anos. É um marco, mas é possível dizer que houve avanço nesse período?
Sim, é um marco importante. É perceptível que tivemos avanços significativos em nossos aparelhos legislativos, mas ainda é preciso avançar e lutar pela maior presença de representantes religiosos de matriz africana, do movimento negro e das juventudes de terreiro nos espaços deliberativos e populares, pela manutenção de projetos políticos-pedagogicos que reforcem a importância de discutir sobre racismo e intolerância religiosa nas escolas, e reforçar nossa atitude cidadã pela defesa da liberdade religiosa para todas e todos, e em todos os espaços.
5) Você acha que a falta de conhecimento sobre sua religião agrava a intolerância no Brasil? O que fazer para mudar?
Agrava sim, com toda certeza. A incapacidade de aceitar a diversidade cultural e religiosa e a aversão à multiplicidade étnica são as causas mais diretas da intolerância religiosa. É necessário, como disse anteriormente, que façamos o esforço de promover espaços educativos que discutam sobre a intolerância religiosa a partir do pensamento crítico e da escuta para que possamos vislumbrar o fim desse problema social.