“Não havia necessidade de decretar prisão preventiva”, diz advogado de idoso que morreu ao deixar presídio

27/09/2021 12:00 - Geral
Por Gabriela Flores
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Familiares do caseiro Cícero Maurício da Silva, 63 anos, que sofreu um infarto e morreu na porta do Sistema Prisional, nesta sexta-feira, dia 24, após passar 32 dias recluso sem ter acesso à família ou ao seu advogado, vão entrar com uma ação judicial contra o Estado.

Em entrevista ao CadaMinuto, o advogado da família, Gilmar Francisco informou nesta segunda-feira, dia 27, que os parentes de Cícero vão entrar com pedido de indenização por conta dos recorrentes erros cometidos contra o idoso.

O advogado informou que a família, que mora na Barra de São Miguel, está aguardando a chegada de documentos que identificam a causa da morte de Cícero para oficializar a ação na Justiça.

Cícero foi preso no dia 23 de agosto, no Instituto de Identificação quando tentava tirar uma via da Carteira de Identidade e foi informado que havia um pedido de prisão em aberto contra ele acusado de crime de estelionato envolvendo a venda de um terreno na Massagueira.

Segundo o advogado, Cícero ajudava uma senhora a vender uns terrenos. “Ele não era dono da propriedade, porém 2008, precisou se afastar do trabalho para passar por tratamento oncológico e deixou uma pessoa à frente do negócio e que provavelmente foi a responsável pelos fatos que ensejaram a ação”, ressaltou.

“A acusação foi feita com base nos depoimentos para apurar. Não dá para dizer que foi ilegal, porque o Ministério Público tem poder para processar. O problema foi que é um processo em que não havia a necessidade de decretar a prisão preventiva, visto que os requisitos não estavam preenchidos, o processo estava prescrito e o fato de ele ser cuidador de pessoa com deficiência, o que não permitiria que ele ficasse naquele local”, defendeu o advogado.

O advogado acrescentou ainda que Cícero era pai afetivo de um rapaz de 38 anos que possui necessidades especiais e “tem a mentalidade de uma criança de dois anos e só atendia ao Cícero”.

Durante o tempo que Cícero esteve preso não pôde receber visitas de familiares ou de seu advogado devido à greve dos Policiais Penais.

Mandado de prisão 

Thiago Augusto Lopes de Morais, juiz designado da 1ª Vara Cível e Criminal de Marechal Deodoro, informou que  consta dos autos, o Sr. Cícero Maurício da Silva foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de estelionato em 25 de agosto de 2010, tendo a denúncia sido recebida em 11 de julho de 2012.

 Ao serem requisitadas informações aos órgãos públicos a respeito do endereço do acusado, apurou-se que o endereço fornecido pelo Sr. Cícero Maurício da Silva ao Tribunal Regional Eleitoral (fls. 72/77) era falso, pois jamais teria ele residido na localidade informada em seu cadastro eleitoral, não havendo sequer residência com a numeração indicada (fl. 86).

Diante das circunstâncias que demonstravam a tentativa de ocultação das autoridades e da evasão (fuga) do distrito da culpa, foi determinada a prisão preventiva do acusado em 31 de agosto de 2014, como forma de assegurar a aplicação da lei penal, na forma do art. 312, do Código de Processo Penal; além disso, não se tratava do único processo ao qual o Sr. Cícero Maurício respondia, constando ele também como réu nos autos da ação penal n.º 0000648-65.2010.8.02.0044, em trâmite na 2.ª Vara da Comarca de Marechal Deodoro, igualmente acusado da prática do crime de estelionato contra várias vítimas, destacou o magistrado.

O mandado de prisão, em casos relativos à prática do crime de estelionato (art. 171, do Código Penal), possui validade de doze anos (art. 109, III, do Código Penal), o que significa dizer que o mandado em desfavor do Sr. Cícero Maurício da Silva estava válido quando de seu cumprimento, colocou Morais.

Após a prisão foi protocolado pedido de liberdade provisória pelo seu advogado, tendo este juízo concedido vista dos autos ao Ministério Público, que requereu a manutenção da prisão preventiva do acusado.

O juiz falou ainda que  partindo de uma análise pragmática, este juízo compreendeu por decretar a extinção da punibilidade do acusado pela prescrição virtual ou antecipada, revogando, com isso, o decreto de prisão preventiva. Essa modalidade de prescrição não é prevista em lei, mas leva em consideração aspectos objetivos e subjetivos do crime, simulando eventual pena a ser aplicada, de modo a evitar o prosseguimento de demandas criminais que, ao fim, não se revelariam úteis.

Por fim, cumpre esclarecer que a prescrição prevista em lei (prescrição em abstrato) não se consumou no caso do Sr. Cícero Maurício da Silva, haja vista que a denúncia contra ele foi recebida em 11 de julho de 2012 e que o prazo prescricional para o crime de estelionato é de 12 (doze) anos, razão pela qual somente em 2031 estaria a pretensão punitiva fulminada pela prescrição em abstrato, considerando também o tempo de suspensão do processo (processo suspenso em 2014), durante o qual não corre a prescrição (art. 366, do CPP).

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