Antes da criação das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), os casos de urgência e emergência com baixa ou média complexidade abarrotavam ainda mais postos e hospitais públicos das cidades brasileiras. O formato concebido pelo Ministério da Saúde estreou em 2007 no Rio de Janeiro e desde então passou a ser adotado em todo o país. Hoje, estima-se que cerca de 600 UPAs funcionem nas cinco regiões do Brasil.
O modelo fortaleceu o Sistema Único de Saúde (SUS) ao proporcionar mais qualidade nos serviços, diminuir filas e desafogar o alto fluxo que passa diariamente por prontos-socorros e, no caso de Alagoas, pelo Hospital Geral do Estado (HGE). Em Maceió, dois equipamentos recentemente inaugurados foram construídos com recursos do Governo do Estado. O investimento total, de R$ 10 milhões, veio do Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza (Fecoep).
As duas unidades são de Porte III – o maior – e funcionam 24 horas por dia. Ambas possuem seis consultórios, 19 leitos (15 de observação e quatro de urgência) e podem realizar até 10.500 atendimentos por mês, em regiões que abrangem entre 200 e 300 mil habitantes: as áreas circunvizinhas aos populosos bairros do Jacintinho e do Tabuleiro, estendendo-se a localidades do Litoral Norte da capital.
Embora ofereçam especialidades como pediatria, ortopedia e até odontologia, as UPAs não são indicadas para simples consultas médicas. UPAs existem para atender casos de urgência e emergência, inclusive quando há risco de morte. Mas, e aí, como as duas novíssimas estruturas estão operando após cerca de dois meses de portas abertas? A avaliação mais honesta pode vir dos próprios usuários. Por isso, a reportagem ficou de plantão por dois dias, um em cada UPA, para ouvir quem passou por lá.
No Tabuleiro, a “nota” é 8
Por enquanto tudo é novo, limpo e bem sinalizado na UPA Galba Novaes de Castro, mais conhecida como UPA do Tabuleiro, inaugurada em 10 de dezembro pelo Governo. O antigo mini pronto-socorro da Av. Durval de Góes Monteiro se tornou um moderno módulo hospitalar.
Na climatizada sala da Espera Externa, espécie de primeira triagem, Jonatas Luiz da Silva, 26, recebeu uma ficha para atendimento às 08h02. O hematoma e o inchaço na panturrilha foram conquistados numa partida de futebol disputada no dia anterior. Ainda doía. A seu lado, outras dez pessoas aguardavam acesso à unidade.
Dez minutos depois, Jonatas foi chamado. Na chamada Sala de Recepção e Espera, mais 12 pacientes estavam sentados no amplo espaço, também climatizado e dotado
de brinquedoteca e seis banheiros – sendo dois para pessoas com necessidades especiais e dois para o público infantil. Paredes estilizadas. Acabamento impecável.
Como não é permitido o acompanhamento para pacientes maiores de 18 anos, a reportagem solicitou a Jonatas um relato sobre todo o processo. Ele topou, com uma condição: não mostrar o rosto.
Após fazer um cadastro, Jonatas voltou com um prontuário e às 08h21 era chamado para a Classificação de Risco. Lá, uma enfermeira identificou sintomas e o encaminhou para o consultório médico. A cor verde na pulseira indicava o grau de urgência: de acordo com o protocolo, poderia ser atendido em até duas horas. Mas sete minutos depois ele já era examinado por um clínico.
“A doutora pediu para fazer raios-x”, disse, enquanto aguardava o resultado. Em dez minutos veio o laudo e a confirmação da ausência de maiores traumas. Às 8h55, o morador do Clima Bom II recebia uma injeção no braço esquerdo com medicamento para aliviar os sintomas.
Ao término da consulta, às 9h12, ele avaliou: “Hoje tudo foi bom. Gostei bastante da médica e de toda a equipe”. Ou seja, da entrada à saída, todo o procedimento levou uma hora e dez minutos. “De zero a dez, dou nota oito”, pontuou, ao revelar que procurava os serviços da UPA pela segunda vez. O que faltou para a nota dez? “Gostei de tudo, mas outro dia vim e esperei tanto que desisti”, entregou.
Numa rotina hospitalar, o número de usuários sempre será determinante para o tempo de espera. No corredor, uma enfermeira comentava discretamente com um médico: “Ontem foi um dia atípico, né?”. Ele confirmou: “Muito movimentado, muitos pacientes”.
A UPA do Tabuleiro tem capacidade para receber até 350 casos de urgência por dia. Ao menos naquela manhã, quatro consultórios atendiam simultaneamente e toda a estrutura parecia funcionar dignamente. Jonatas saiu andando. Não sentia mais dores. Voltou para casa a pé.
No Jacintinho, um sorriso e uma receita
Quando desceu da motocicleta de seu cunhado, Maria Cícera da Silva, 56, estava com a respiração ofegante. A dona de casa se sentia fraca e cansada ao pegar a senha na UPA Ismar Gatto, na última quinta-feira (30) de janeiro, às 8h40 da manhã. Era a primeira vez que a moradora do bairro São Jorge procurava atendimento na nova estrutura, situada no Av. Juca Sampaio, no Jacintinho.
Vinte pessoas aguardavam na Espera Externa. Uma hora e oito minutos depois, às 09h48, Cícera abriu a porta de vidro com um sorriso e uma receita médica. “O atendimento foi maravilhoso. Estava me sentido mal, agora estou bem melhor”, disse,
após ser medicada. O exame de raios-X no tórax indicou o problema. “Meu pulmão reduziu de tamanho. Vou fazer um tratamento por cinco dias com o remédio que o médico passou e depois volto para a avaliação”, explicou.
Antes de ligar a moto, o cunhado, Edvaldo Gomes de Lima, 57, quis participar da conversa. “Eu já vim três vezes aqui. Duas vezes por causa de um dor forte no ouvido e outra porque tive um pico de pressão”. Em todas, ele assegura: “O atendimento foi muito bom”.
Nem sempre deu sorte quanto à espera: “Uma vez eu passei duas horas para ser atendido”. Porém, quando procurava o posto de saúde, a espera geralmente era maior. “Era mais cheio. Aqui é mais confortável e a qualidade em tudo foi melhor. É limpinha e bem organizada, não tenho o que reclamar. Espero que melhore ainda mais”, avalia.
UPA x Emergência particular
“Isso aqui está pior que o SUS!”. Quem tem plano de saúde certamente já ouviu ou disse a frase durante a espera nas emergências particulares. Após visitar as duas novas UPAs, fomos a um dos maiores hospitais privados de Maceió para constatar se a frase faz sentido, a partir da avaliação dos usuários.
No dia 30 de janeiro, Luarana Santana chegava às 14h30 com o pequeno Emanuel Santana de Araújo. Com oito dias de nascido, o bebê necessitava atendimento. A mãe também. Somente após as 17h a dupla deixou o local. “Foram quase três horas com a criança no colo. Só para fazer um exame, eu levei mais de uma hora”, criticou.
Na manhã seguinte, de volta para mostrar os resultados a um especialista, Luarana se incomodou com outra situação. A jovem pediu para esperar em outro ambiente, com receio de expor o recém-nascido a contaminações, mas a resposta da atendente não agradou. “Ela disse que eu estava num hospital e que ali era um ambiente seguro. Discordo. Um recém-nascido não pode ficar exposto na recepção comum”, retrucou.
Finalmente, após convencer os funcionários, Luarana e Emanuel foram levados a uma sala reservada. Uma hora e meia depois, ao sair do hospital, a mãe fez questão de complementar: “E o atendimento, ainda por cima, não foi tão bom”.
Um pouco antes, a jovem Cristiane (não quis revelar o sobrenome) saía numa cadeira de rodas. A expressão de “poucos amigos” combinava uma entorse no joelho com o aborrecimento pela demora no atendimento. “Durou mais de uma hora e meia e eu ainda vou precisar ir para outro local fazer uma ressonância magnética”.