Suicídio. Este é um tema que ainda é visto como um tabu social e que atinge uma pessoa a cada 40 segundos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Com isso, a campanha nacional Setembro Amarelo, iniciada em 2015, é uma iniciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), que visa prevenir o suicídio.

 

Depressão é um assunto sério e não deve ser tratado de qualquer forma. A depressão não escolhe status, cor, signo, razão social, sexo ou qualquer outra característica. A doença tem ganhado cada vez mais espaço na sociedade e menos espaço nas rodas de conversas. Ela não escolhe idade ou tempo.

 

Pensando no assunto, a reportagem do CadaMinuto preparou uma matéria especial relatando o caso de pessoas e profissionais que estão passando ou já passaram por essa situação e como estão conseguindo dar a volta por cima, pois viver é a melhor opção! E um assunto tão silencioso como esse, deve ser discutido em voz alta.


De acordo com Rafaela Lopes* (nome fictício), sua mãe foi diagnosticada com depressão em 2003 e que ela chegou a ficar cerca de uma semana em coma induzido, em um hospital privado em Maceió. Além disso, ela relatou que Flávia* perdeu  cerca de 25% da memória, teve síndrome do pânico e fobia. “Ela não saia do quarto, só usava cores escuras e não tinha alegria nenhuma. Parecia que a vida havia perdido o sentido”.

“No início foi muito difícil, eu era muito nova e não esperava nunca passar por essa situação. Recordo-me que tinha apenas 8 anos, quando minha mãe foi diagnosticada com a depressão, cheguei no hospital e ao perguntar ao meu pai o que estava acontecendo, nem os médicos sabiam o que  responder. Lembro de ter visto por várias vezes os médicos se reunindo e nada era dito, pois,  nem eles mesmos sabiam o que acontecia. Minha mãe passou por todos os processos e  exames que se pode imaginar, até que um médico de Recife fez o diagnóstico e disse que era depressão”, explicou Rafaela.

Rafaela Lopes disse ainda que nem sempre é fácil ter que amadurecer antes do tempo e ter que assumir as responsabilidades que, no momento, não eram suas.  Mas o amor pela sua mãe sempre foi algo inexplicável e foi o que lhe sustentou e lhe ajudou a suportar todo o fardo e a dor de ver sempre ela depressiva, triste e por muitas vezes tentando tirar a própria vida.


“Recordo-me de ter visto a minha mãe tentando se matar umas três vezes. Me senti a pior pessoa e não sabia o que fazer, e muito menos como agir. Eu só pedia a Deus que me ajudasse a ser forte, pois minha família precisava muito de mim. Por muitas vezes vi minha família desabar e pensei em desistir. Mas sempre acreditei que depressão tem cura sim, e que o amor é capaz de curar e ajuda a amenizar a dor.” disse Rafaela.

 

“Sempre me disseram que aquilo tudo [a depressão] era brincadeira e que uma pessoa que é depressiva quer chamar a atenção, mas não é tão simples assim. Todo mundo tem seus problemas e o que diferencia é a maneira em que você resolve lidar com a situação. Mas, uma pessoa depressiva não tem essa vontade de viver, e tudo acaba perdendo a cor. Aprendi que quanto menos importância dermos ao caso, mais ele tende a crescer. A família é essencial durante o processo da cura contra a depressão”, esclareceu.

 

Conforme Rafaela, o amor, o cuidado e a atenção são alguns dos fatores principais durante o tratamento de uma pessoa depressiva.

 

“É preciso entender que uma pessoa que tem depressão não tem expectativa nenhuma de vida e vai sempre se sentir a pior pessoa do mundo, apesar de não ser. Tudo deve ser dito com muita cautela. É claro que uma pessoa que tem depressão não precisa ser vista como uma pessoa que tem problemas mentais. Isso o faz se sentir pior. Dê amor, zele e cuide. Uma pessoa depressiva não deixa de ser um ser humano, talvez ela só precise que você a olhe de um jeito diferente e que demonstre que se importa com ela. Só quem já provou dessa dor sabe o quão difícil é. Não pergunte o que aconteceu. Não diga que vai ficar tudo bem, isso as vezes só piora. Abrace-a e faça se sentir importante, se necessário use palavras, mas por muitas vezes um gesto vai valer muito mais.”, concluiu.

 

Depressão x Preconceito

 

Há quem passe pela depressão por ter problemas pessoais, perdas familiares, medos, inseguranças e diversos outros fatores. Não seria diferente no fator relacionamento e sexualidade.  Nem sempre o rompimento de um namoro lhe deixa bem.

 

Carlos Guilherme, de 20 anos, estudante de Direito, conta que no início não se deu conta que estava doente e que precisava de ajuda. “As coisas foram acontecendo e eu não percebia. Quando me dei conta, já não conseguia fazer coisas simples como ir à faculdade ou trabalhar. Eu achava que não conseguia sair de casa. Sendo bem sincero, eu tinha muito medo”.

 

O universitário contou ainda que vários fatores o deixou desta maneira, uma delas foi a falta de ânimo, além da rotina estressante do dia a dia. “Todos os dias era a mesma coisa, saia pela manhã e só voltava durante a madrugada. O trabalho e a faculdade já estavam tomando todas as minhas energias. Eu já não conseguia mais conciliar minha vida pessoal com a família, amigos e até mesmo com o meu relacionamento afetivo. Isso só fez com que eu me afastasse ainda mais das pessoas. O desprezo e o isolamento são duas coisas muito difíceis e lhe deixa aprisionado a fragilidade emocional.”, explicou.

 

Além disso, ele relatou que um dos principais motivos que me deixaram assim foi o preconceito e a aceitação com ele mesmo.

 

“Foi muito difícil me aceitar do jeito que eu sou. Carreguei junto comigo a angústia e mantia sempre em meu coração a vontade de tirar a minha própria vida, pois nada mais fazia sentido. Eu acreditava que se tirando a minha vida, todos os meus problemas  irism se resolver e eu já não seria mais um peso, além de aliviar tudo o que estava sentindo”, disse o estudante.

 

O universitário contou ainda que tentou esconder a homossexualidade por muito tempo, além de sempre achar que isso o atrapalharia e que lhe faria ser um filho/neto imperfeito.

 

“Eu tentava ser alguém que não era. Sempre tentei me destacar e ser o melhor em tudo, mesmo sabendo que isso só estava me destruindo por dentro e me prejudicando cada dia mais. Eu tinha muito medo! Depressão é uma doença que ninguém consegue enxergar. As pessoas me viam  e não conseguiam ver  nada além que a tristeza.”, explicou Carlos.

 

“Por mais que as pessoas tentassem definir o que estava acontecendo comigo, elas não chegavam a entender, até porque isso é muito pior do que acham. Eu tentei segurar isso o máximo possível das pessoas que estavam ao meu redor.”, disse.

 

Guilherme conta que o tratamento foi difícil no início e que não aceitava que estava doente e passando por sérios problemas.  Ele relata que acreditava não precisar ir em busca de uma ajuda profissional.

 

“Eu achava que poderia suportar tudo, até o momento em que eu fiquei de frente com a morte e tentei tirar a minha vida. Tomei cerca de 50 remédios diferentes e nada adiantou. Fui mais adiante, comecei a me cortar. Essa foi a única maneira que  eu achei para aliviar a minha dor. Eu me mutilava porque acreditava que com isso a dor e passar ou ao menos amenizar. No momento passava, mas depois a dor voltava e era cada vez mais forte. Mas eu pedi forças a Deus e assim eu consegui  pedir ajuda a um profissional e estou buscando até hoje.”, relatou.

 

“Eu resolvi pedir ajuda quando dobrei os meus joelhos e pedi perdão a Deus. Pedi para que ele não desistisse de mim, pois eu sei que todos nós temos um propósito nessa vida. Eu pedi também ajuda a um professor da faculdade e expliquei a ele o que estava acontecendo. Só contei porque eu já não aguentava mais. Foi a partir daí que ele me abriu os olhos e acabou com o meu preconceito e o medo de procurar uma ajuda profissional .”, justificou Carlos.

 

“Não desistam! Eu sou a prova viva de que é difícil passar pela depressão, mas ela tem cura e tudo depende de você! Depressão tem cura sim! Há sempre uma segunda chance para sermos felizes e merecemos essa chance, se permita. Não importa o que somos, a doença não escolhe com quem quer ficar, ela simplesmente chega do nada e vai ficando como quem não quer nada. Mas, nós podemos nos ajudar e ajudar aos outros.”, finalizou.

 

Isolamento

 

“Meu lugar predileto se tornou o meu quarto”. É o que afirma Lúcia Pacheco (nome fictício). Ela conta que percebeu que estava com depressão há cerca de dois meses, quando não tinha mais vontade alguma de sair com a família ou com amigos. Isso ocorreu devido ao estresse e ansiedade desencadeados pela rotina intensa de trabalho, casa e faculdade. Mas Lúcia decidiu procurar ajuda há algumas semanas através de uma psicóloga.

 

“O que mudou na minha rotina foi que fiquei mais em casa. Como não dá vontade de sair, eu trabalhava porque tinha que ir, mas rezava pra voltar pra casa (para o meu quarto). A faculdade passou a ser uma obrigação no momento em que me isolei mais”, relata.

 

Ainda de acordo com a jovem, sua saída é ter pensamentos positivos para assim conscientizar a mente de que nada ruim vai acontecer e tentar voltar à rotina anterior de uma vida normal. Com relação a descoberta da doença pelos amigos e familiares, ela explica que, inicialmente, não acreditaram, mas depois conversaram e prestaram ajuda como puderam.

 

“O tratamento é difícil. É preciso dar um passo de cada vez para superar dia após dia. Nada é impossível, Deus é a base de tudo o que é essencial. Entregue tudo nas mãos de Deus. Não há nada melhor como um dia após o outro. O essencial é ter apoio e procurar ajuda”, finaliza Lúcia.

 

Depressão x Ansiedade

 

Em entrevista ao CadaMinuto, a psicóloga Lysia Barbosa, CRP 15/5193, explicou que a depressão é um distúrbio afetivo que acompanha a humanidade ao longo de sua história. É uma doença mental que requer cuidados e atenção a todo momento, sendo importante ficar alerta quanto aos seus sintomas, onde podemos destacar dentre eles o isolamento social, uma tristeza profunda, a perda de interesse generalizado, a falta de ânimo; de apetite, as oscilações de humor que podem culminar em pensamentos suicidas, entre outros.

 

“Sendo assim é muito importante ficar atento quando esses sintomas começarem a aparecer. Por isso, sempre evidenciamos o papel importante e fundamental da família e amigos nesse momento, começando pelo apoio e o entendimento de que essa é uma doença séria, sendo necessário o acompanhamento profissional de um psicólogo e de um psiquiatra”, comenta Lysia.

 

Ainda de acordo com a profissional, a ansiedade, por sua vez, é uma emoção, um estado de apreensão, que sentimos frente a uma situação, seja ela nova ou recorrente. Nos sentimos ansiosos frente aquilo que não conhecemos, aquilo que não controlamos, que nos deixa expostos e vulneráveis. Todos nós sentiremos ansiedade em algum momento de nossas vidas, como exemplo: ficar ansioso com algo novo, com uma viagem, com o casamento, com algo que nos exponha, entre outros. Essa é uma ansiedade normal.

 

Mas a ansiedade se torna um problema quando a intensidade e frequência dela acaba afetando o cotidiano de uma pessoa, quando ela domina, quando passa a atrapalhar os planos, quando faz fugir, quando desmotiva os relacionamentos sociais e familiares, e assim começa a causar danos.

 

“É importante assim a identificação dos sintomas que podemos definir como: Físicos: dor no peito, dor de cabeça, formigamento, tontura, palpitações, alterações gastrointestinais, entre outros. Psíquicos: insônia, irritação, tensão, inquietação, perda de concentração, entre outros”, destaca a psicóloga.

 

Lysia ainda aponta que é importante seguir algumas dicas para lidar melhor com a ansiedade diariamente. Confira:

 

“Tire um tempo para si mesmo, pratique exercícios físicos e exercícios de respiração, escute músicas do seu gosto, entre outros. Mas, lembrando sempre que a psicoterapia é de fundamental importância nesse processo. A psicoterapia ajuda a organizar e cuidar da sua mente, além de auxiliar a controlar as emoções. Quem cuida da mente, cuida da vida. Faça terapia!”, finaliza a psicóloga.

 

Aqueles que precisam de amparo à vida podem encontrar ajuda através do CVV, ligando para o telefone 188 (24 horas), pessoalmente (nos 80 postos de atendimento) ou pelo site www.cvv.org.br via chat, VoIP e e-mail. O CVV realiza apoio emocional e prevenção do suicídio. A ligação é atendida por um voluntário de forma anônima e gratuita.

Não se cale. Converse. Sua vida é importante e vale muito!