Dias piores virão com Michel Temer

01/05/2016 20:07 - Geraldo de Majella
Por redação

 

Procurar entender os erros dos governos Dilma Rousseff e Lula é importante para compreender o porquê da crise politica, econômica e ética que o Brasil vive.

        O PT assumiu a hegemonia da esquerda brasileira ainda nos 1980. Desde a sua fundação conseguiu manter na sigla remanescentes e sobreviventes de organizações políticas de esquerda que optaram pela resistência à ditadura pela via da luta armada, grupos religiosos de esquerda militantes das comunidades eclesiais de base da Igreja Católica, sindicalistas, ex-comunistas, intelectuais, professores universitários, artistas, antigos militantes da democracia cristã etc.  

        O PT surgiu como um partido legal e conquistou espaço na sociedade e junto aos eleitores, sem ter sofrido nenhum tipo de perseguição e sem ter de suportar os estigmas impingidos aos comunistas do PCB e PCdoB que só em 1985, depois de completar seis ano da anistia conquistada em 1979, se reintegraram à vida política nacional, deixando para trás a vida clandestina, as prisões e o exílio.

        A construção do PT é uma obra notável numa sociedade na qual os partidos políticos tradicionalmente sempre foram cartoriais. O Partido dos Trabalhadores incorporou milhares de cidadãos em suas fileiras e conquistou, através do voto popular, prefeituras de cidades médias e grandes como São Paulo, Porto Alegre, Fortaleza e Belo Horizonte.

        Elegeu governadores no Rio Grande do Sul, Brasília, Acre, Piauí, Sergipe e Pará; em alguns desses estados, elegeu-os mais de uma vez, como no Acre e no Rio Grande do Sul.

        Lula, o grande líder de massas da segunda metade do século XX, disputou três vezes a presidência da República, sendo derrotado. Elegeu-se na quarta e reelegeu-se; de tão popular que era, lançou uma mulher, Dilma Rousseff, uma  ex-presa política à sua sucessão, e embalado na sua alta popularidade tornou a elegê-la na eleição seguinte Dilma é reeleita presidente do Brasil, dois feitos históricos, primeiro elegendo uma mulher presidente do Brasil e, em seguida, reelegendo-a.

        O PT conseguiu essa trajetória eleitoral espetacular em três décadas. A defesa de políticas públicas históricas, bandeiras da esquerda brasileira como a reforma agrária, a melhoria e universalização da educação pública, a consolidação do Sistema Único de Saúde, a erradicação da pobreza, o desenvolvimento econômico e social com distribuição e renda e a estruturação de politicas de desenvolvimento regional foram marcos do Partido dos Trabalhadores.

        O PT conseguiu capitalizar esses sentimentos e desejos da maioria da esquerda brasileira e de setores progressistas da sociedade e do empresariado nacional. As sucessivas e expressivas derrotas fizeram com que os seus principais dirigentes e quadros amadurecessem diante da realidade. Aprendeu que não seria fácil chegar ao poder sem a flexibilização na ação política e na estratégia eleitoral.

        Foram realizadas as necessárias flexibilizações. Lula e o PT estabeleceram uma aliança política com setores do empresariado nacional e com o que havia de mais significativo no parlamento naquele instante. Em 2002, o então senador mineiro José Alencar foi o caminho ou a ponte que ligaria o Lula e PT ao empresariado nacional, fiador de um governo onde os interesses da indústria nacional e do capital não seriam incomodados com políticas sectárias ou radicais que viessem a prejudicar a elite brasileira.

        Esse pacto firmado é apresentado à Nação no dia 22 de junho de 2002, na Carta ao povo brasileiro. Passados quatorze anos, faço uma nova leitura da Carta ao povo brasileiro, e esse trecho salta aos olhos:

“Nosso povo constata com pesar e indignação que a economia não cresceu e está muito mais vulnerável; a soberania do país ficou em grande parte comprometida; a corrupção continua alta e, principalmente, a crise social e a insegurança tornaram-se assustadoras.

“O sentimento predominante em todas as classes e em todas as regiões é o de que o atual modelo esgotou-se. Por isso, o país não pode insistir nesse caminho, sob pena de ficar numa estagnação crônica ou até mesmo de sofrer, mais cedo ou mais tarde, um colapso econômico, social e moral”.

A eleição de Lula e José Alencar abriu novos caminhos e perspectivas de crescimento econômico. Houve o maior feito da história da República, para mim, a maior obra do governo desde que foi criado o Plano Real, em 1994, até 2010: a redução em 67% da pobreza, pois em dez anos 50% dos mais pobres tiveram crescimento de 69% em sua renda e a renda dos 10% mais ricos cresceu também 10%.

Esses dados são da pesquisa Desigualdade de Renda na Década da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 2011, que mostra ainda que a pobreza diminuiu em 50,6% durante o governo do presidente Lula, de junho de 2003 a dezembro de 2010, e que, de 1994 a 2002, a pobreza caiu 31,9%. Ao longo de 2010, a pobreza foi reduzida em 16%.

Essa obra gigantesca é um dos pilares das lutas desenvolvidas pela esquerda brasileira. Essa conquista real e também simbólica não é para retroagir. Alguns desses ganhos  têm sido ameaçados e integram a pauta das lutas dos movimentos sociais e dos brasileiros que querem a erradicação da miséria e da pobreza em nosso país.

Esse capital político vem sendo ameaçado desde o primeiro governo Dilma Rousseff. Os sucessivos erros na condução da política econômica, somados à inabilidade no trato político geral, fez com que o seu governo fosse derrotado pelos piores corruptos de que a nação já ouviu falar.

A soma das inúmeras denúncias, processos, condenações de dirigentes do PT e de ex-ministros do governo Lula e Dilma por corrupção tem sido potencializada pela grande mídia, pelo capital financeiro e pelo empresariado nacional e internacional como forma de bloquear o governo com um processo de impeachment sem comprovação de crime praticado pela presidenta da República.  

A aliança política montada com o empresariado ou por setores se transformou numa estratégia para o PT manter-se no poder, mas com um outro conteúdo: a partilha do Estado. Essa “engenharia política” não é nova na política brasileira, mas não poderia ser a opção adotada pelo Partido dos Trabalhadores e por seu líder.

A corrupção denunciada desde a sua fundação tornou-se – para surpresa geral, ao ser revelada nos inquéritos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal – uma vergonha nacional e o principal motivo que a direita encontrou para apear do poder o PT, inclusive e principalmente com o que era denominada de base de apoio. A tal base de apoio é infinitamente mais experiente em matéria de corrupção e de apropriação do aparelho de Estado que os petistas.

O combate à corrupção não é o objetivo central da elite brasileira, muito pelo contrário. Com Dilma Rousseff fora do Palácio do Planalto, haverá um realinhamento de forças e os Poderes da República irão encontrar maneiras de salvar os seus membros e representantes ou serviçais.

O legado desse desastre moral deixou foi a fúria avassaladora da direita potencializada pelas forças econômicas nacional e internacional para, em nome de reestruturar a Petrobras, por exemplo, privatizá-la em meio à onda de descontentamento e decepção da maioria da população capitaneada pela facciosa mídia nacional, principal pilar do golpe parlamentar executado, inicialmente, pela Câmara dos Deputados e consumado pelo Senado Federal.

 

O governo Temer

 

        Diante do golpe e com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, a organização da resistência ao governo de Michel Temer é a posição mais urgente a se tomar pelos movimentos sociais e setores da sociedade civil que não concordaram com o golpe, mesmo os que não são do PT e não foram eleitores de Dilma Rousseff, mas que são democratas. No horizonte mais próximo, setores do mundo do trabalho que foram a favor do impeachment, mas que poderão perder direitos conquistados, terão de ser convocados para essa nova etapa de lutas do povo brasileiro.

     A temperatura vai esquentar nas ruas, nas fábricas, no campo, nas escolas e universidades. Quem na esquerda imaginou que a luta de classes tinha sido coisa do passado equivocou-se.

         As primeiras notícias do governo Temer foram amplamente festejadas pelo PIB nacional. A economia no seu governo sofrerá um choque liberal; será anunciada a redução de gastos com a máquina pública e o Estado será reduzido – um filme antigo, onde as vitimas são os pobres, para começo de conversa.

        Possivelmente, Temer não vai entregar o que prometeu aos deputados, partidos e senadores na preparação do golpe. Anunciou redução drástica de ministérios, de 36 para no máximo 20 ministérios em sua gestão. Mudou em poucos dias: agora se fala em 26. Temer é fisiológico como a maioria dos políticos brasileiros.

O pior está por vir: a direita fundamentalista capitaneada pelo pastor Silas Malafaia inicia a cobrança da sua fatura. Malafaia foi recebido no Palácio do Jaburu, e Temer contrito como um evangélico recém-convertido orou de mãos dados com o tal pastor.

        Essa gente foi exigir o fim da distribuição de material didático que ensina as crianças a respeitarem a diversidade sexual. Além disso, ou se isso não bastasse como sinal de retrocesso iminente, o DEM pretende indicar o ministro da Educação.

        Dias piores virão com Michel Temer.

        

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