Resistência à Ditadura em Pariconha

05/09/2014 15:13 - Geraldo de Majella
Por Geraldo de Majella

A Comissão da Memória e da Verdade Jayme Miranda (CMV-JM) realizou uma sessão pública no dia 2, no plenário da Câmara Municipal de Pariconha (AL), para ouvir ex-presos políticos e familiares.

 

A comissão foi representada por quatro dos seus membros: o coordenador e advogado Delson Lyra, a professora Alba Correia, a funcionária pública Olga Miranda e o historiador e assessor voluntário Geraldo de Majella.

 

         A Comissão ouviu Josué Correia, Arlindo Perigoso, José e Jaime Correia. Os depoentes, visivelmente emocionados, prestaram informações e relataram o sofrimento imposto pela repressão durante as prisões e também as perseguições após serem soltos.

 

        Jaime Correia, um dos perseguidos, denunciou à comissão as circunstâncias pelas quais a sua esposa perdeu o primeiro filho. “Pariconha tinha apenas quatro carros, e por discriminação política, três proprietários recusaram-se a socorrer a minha esposa. Não havia médico em Água Branca. Quem precisava de tratamento tinha de ir até Delmiro Gouveia. Nós não tínhamos carro, e o fato é que durante muitas horas a minha mulher ficou sofrendo, perdendo sangue. Quando conseguimos chegar ao hospital, não foi possível salvar o nosso filho, pois num parto complicado a criança morreu. Esse fato desumano marcou a nossa família e dói até hoje.”

 

A presença de militantes da Ação Popular (AP) em Pariconha tinha como objetivo a organização e a formação política dos trabalhadores rurais. A AP influenciou decisivamente na organização do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, na criação da Cooperativa dos Trabalhadores e também na criação do Clube de Mães.

 

Os depoimentos revelaram em detalhes as circunstâncias em que se deram as prisões e as sessões de torturas físicas e psicológicas. A Polícia Militar prendeu Maria Auxiliadora Cunha Ferreira (Dodora) com os filhos André e Priscila, e Rosemery Reis Teixeira (codinome Rosa) e a filha Rita, trazendo-as com as crianças para o Quartel Geral em Maceió, onde permaneceram durante alguns meses, numa sala imunda da Policlínica da PM.

Os ex-lideres estudantis Aldo Arantes e  Gilberto Franco Teixeira, maridos das presas, na ocasião das prisões  estavam viajando. Ao retornarem à Pariconha foram presos e levados para Maceió.

 

Os homens foram presos na delegacia do Dops, de onde, alguns meses depois, conseguiram fugir com a ajuda de militantes de AP e de um dos dirigentes do PCB, o médico José Albuquerque Rocha.

 

Em Pariconha ocorreu mais de uma dezena de prisões. Alguns dos presos foram levados para a delegacia de Água Branca (naquela época Pariconha era um distrito e  pertencia a Água Branca); outros presos foram para Maceió.

 

Família Correia

 

A família Correia foi uma das mais atingidas pela repressão. Os principais líderes eram José, Josué e Jaime Correia.

 

Esse ramo da família tinha dez membros entre os pais e filhos com militância sindical e política no sertão alagoano, em Pariconha (Água Branca) e em São Paulo, para onde a família migrou no final da década de quarenta.

 

Jaime Correia, com quem conversei, foi quem detalhou as atividades dos membros da família. Disse que João Correia Sobrinho e Maria São Pedro Correia, os pais, e os oito filhos (José, Josué, Jaime, Geraldo, Gelza, Judite, João e Gilberto Correia) iniciaram a militância através da luta sindical e no processo de formação sindical ocorreram os primeiros contatos com a militância de AP. Esse fato foi marcante e mudou a concepção política de todos os membros da família e de muitos outros trabalhadores rurais e líderes sindicais da região.

 

Curso na China

 

O líder sindical José Novais era a principal referência politica e sindical de Água Branca. Após o golpe militar foi enviado pela direção nacional da AP para fazer um curso político-militar na China. A experiência chinesa levou o líder sindical alagoano a montar uma Escola de Formação Político-Militar em Pariconha. Vários militantes estiveram clandestinamente na região e também muitos militantes da região participaram desses cursos.

 

Esse capítulo da História de Alagoas vem ganhando luzes, e a sessão realizada pela Comissão da Memória e da Verdade Jayme Miranda contribuiu para que fossem revelados fatos novos, contados pelos personagens dessa história que também é nossa.

 

 

 

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