Em cima de um palco que reuniu figuras antagônicas como o ex-governador Divaldo Suruagy e a ex-prefeita Kátia Born (PSB), o discurso agressivo do deputado federal João Lyra (PSD) funcionou melhor que as dancinhas do senador Benedito de Lira (PP), durante o relançamento da pré-candidatura do líder do PP, na manhã de ontem. João Lyra provocou gargalhadas na plateia reunida no auditório do Centro de Convenções de Maceió. Mas o parlamentar que completará 83 anos no período das convenções de junho deixou um recado fundamental para os partidários que o abraçaram como aliado: “Vou jogar duro!”.
O jogo pesado contraria o discurso do próprio pré-candidato ao governo Benedito de Lira. Mas o presidente do PSD em Alagoas, João Lyra, foi muito além do desejo de que seus opositores da Frente de Oposição liderada pelo deputado federal Renan Filho (PMDB) “vão se abraçar com o Diabo”, como disse em sua fala para a plateia. Assim que desceu do palanque, o industrial deu o pontapé inicial no jogo pesado prometido há dois minutos. E disse que o vice-presidente do PSD, deputado estadual Dudu Hollanda, bebe demais, quando questionado pelo blog sobre a informação de que poderia haver intervenção do Diretório Nacional da sigla, caso João Lyra insistisse em apoiar Benedito para o governo.
“Meu filho, o PSD não tem ‘poblema’ [sic]. Dudu Hollanda deve ter dito isso numa das suas entradas, bêbado, em alguma delegacia, ele deve ter falado. Porque Dudu Hollanda, não se dá ouvido ao que ele fala, porque bebe demais. Somente. E o PSD está ótimo. Conversei com o menino... O Kassab conversa diariamente comigo. Viu? [O PSD está firme com Benedito], firme, firme. O ‘poblema’... O ‘poblema’ do Dudu Hollanda é que bebe demais. Manda ele beber menos, para não dizer tanta ‘cachaçada’. Ele tem não sei quantas entradas na...”, disparou o deputado federal, antes de a entrevista ser interrompida por um dos seus assessores que lhe disse: “Por aqui, doutor João”.
Céu e inferno
É compreensível que, muitas vezes, o candidato não escolhe seus aliados. Mas a situação é oposta com Benedito de Lira, que fez questão de reservar espaço em sua coligação para João Lyra, ou melhor, para o precioso tempo de propaganda eleitoral do PSD. A retribuição de um aliado que joga duro pode, mas não deveria, ir além dos elogios a Benedito. E é até perigoso posar ao lado de quem deseja algo que remete à morte de adversários, como no caso do uso da expressão “abraçar o diabo”, reproduzida no trecho abaixo do discurso de João Lyra. Nele, o deputado federal utilizou uma retórica que fez a plateia transitar entre o céu e o inferno.
“Minhas coisas são pragmáticas. Podem marcar o dia de hoje. Estarei aqui com um governador correto. Não por isso eu não quero dizer que o que está aí tem ‘poblemas’ [sic], tem incorreção. Não tem. Mas, outros que querem abraçar, esses deviam, cá pra nós, abraçar o diabo. E eu vou jogar duro, vou jogar no que for possível, vou dar tudo o que puder. E todo mundo aqui do Estado de Alagoas sabe que, quando eu jogo duro, jogo. Não fico nunca na panela, de um lado para o outro. Eu sou Biu, vou lutar por ele, que, se Deus quiser, vai ser o nosso governador. Vamos só pedir um pouquinho, sabe a quem? A Deus. Que nos ajude, nos dê força. A mim, graças a Deus... Deus tem um contato direto comigo, tem um acordo comigo, nos dá força sempre. Eu tenho um acordo com Deus, não sabia não? Ele me ajuda sempre. Biu de Lira, você é nosso governador”, disse João Lyra, no final de seu discurso para a plateia que aplaudia a tragicomédia.
João Lyra fez referência direta à Frente de Oposição, mesmo sem citar os nomes dos adversários a quem chamou de “elementos” e “mamadeiras da nação”. Mas o industrial que luta para evitar a falência de seu grupo empresarial, com dívida de mais de R$ 2 bilhões, deu uma dica de que não precisava dizer o nome de seu adversário. Porque ele tinha um nome fácil, que até jogador de futebol tem. Uma clara referência ao nome do volante Renan Teixeira, revelado pelo São Paulo, antes de jogar no Juventude, Cruzeiro, Atlético Mineiro, Atlético Paranaense e Sport.
“Aqui estou do lado de um homem de bem. Um homem sério, correto, que conhece esse Estado das Alagoas. Estado esse que, infelizmente, vez por outra, vem uma onda de elementos que não deviam passar nem por aqui. Mas essa onda vem e felizmente o nosso povo da nossa terra das Alagoas sempre expulsa esses elementos. Meu querido, esses elementos não têm vez aqui, porque hoje, na vida, só tem vez quem tem aquilo que meu pai chamava de correção. Venho seguido essa filosofia e só se abraçar[sic] com gente de bem. Infelizmente, vez por outra, somos insuflados por esses elementos que não servem a nada. Só servem a eles e aos bolsos deles. Porque nunca souberam trabalhar, nunca souberam fazer nada. São uns verdadeiros mamadeiras da nação. Isso todo mundo conhece, nem precisa eu aqui dizer o nome. É um nome fácil, que todo mundo conhece. E hoje até jogador de futebol tem esse nome”, disse João Lyra, diante da resposta imediata da plateia: “É Renan!”.
Sem polêmica
Depois de sorrir ao ser informado sobre as declarações destemperadas do deputado federal João Lyra, o deputado estadual e vice-presidente do PSD em Alagoas Dudu Hollanda não quis falar sobre o que foi dito sobre ele. Concentrou-se no relato sobre a questão partidária que envolve os dois e o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab. Por telefone, na noite de ontem, Dudu reafirmou a amizade com o deputado federal, contra quem deverá disputar o mandato da Câmara Federal, após convite de Kassab.
“Esse negócio da intervenção, não sou eu quem está dizendo. Não sou eu o interventor. Quando você me perguntou naquele fim de tarde de sábado, eu, são e sóbrio, consciente e tranquilo, disse o que estou repetindo. Meu problema não é com o doutor João. Existe um compromisso nacional e o Kassab exige que seja cumprido. É o mesmo compromisso que temos com a presidente Dilma. Aqui, se for pelo encaminhamento que o doutor João está levando, o PSD não fica com a Dilma, fica com o Eduardo Campos [PSB]. Então! Olha aí. Tá vendo como as coisas estão fora do caminho? Não tem esse negócio de rebater pessoalmente essas coisas de doutor João. Não tenho o que dizer. Não tenho nada contra ele. Apenas estou dizendo o que a Nacional está recomendando, que doutor João e eu somos candidatos a federal, pela coligação do Renan Filho. Apenas estou sendo o portador ao jornalista Davi do que eu ouvi da Nacional. Sou vice-presidente, não o interventor. Não entra nessa ordem do doutor João, que sou amigo dele. Ele é que não está falando as coisas como devem ser faladas. Não tenho nada contra doutor João, não! Deus me livre!”, afirmou Dudu Hollanda.
O vice-presidente do PSD relatou que, há 15 dias, foi convocado pelo presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, para uma reunião em Brasília. Sem conseguir contato com João Lyra, Kassab lhe pediu, numa segunda-feira, para estender o convite ao deputado federal, e assim foi feito por Dudu. O deputado estadual se dirigiu à residência do presidente do PSD em Alagoas, na manhã do dia seguinte, e o colocou em contato, por telefone, com o presidente nacional da sigla. O convite foi reafirmado, mas João Lyra não participou da reunião, na quinta-feira seguinte, que consolidou o futuro do PSD nos estados.
“Cuidei da minha vida, tirei minha passagem, e fui embora na mesma terça. Na quarta, o deputado João Lyra me convidou para eu ir no avião dele. Acabou que ele não foi. Lá estavam todos os deputados, que ouviram do Kassab a prioridade para que o PSD não deixe de ter representação na Câmara que já tem. Sobre Alagoas, Kassab disse não saber se João Lyra era candidato. Eu disse que ele era candidato. Mas ele estava preocupado pelo futuro do partido e perguntou quem mais poderia ser candidato a federal. Liguei para o Augusto Farias, mas ele disse que não queria. Aí eu disse ao Kassab. E ele me disse que se o PSD não tivesse candidato à Câmara Federal, iria intervir no partido. Ele me provocou para que eu fosse o candidato. Eu disse que era candidato à reeleição. Mas ele me disse: ‘Eu preciso que você seja candidato a deputado federal’. Eu disse que era complicado deixar um mandato certo, por um mandato arriscado. Ele disse que viabilizaria minha eleição. Eu disse, acabou-se”, relatou Dudu.
O deputado estadual prosseguiu: “O Kassab sabe de tudo o que acontece em Alagoas. Ele me disse: ‘Dudu, olha; você sabe que eu tenho compromisso com o senador Renan Calheiros. E o João Lyra não está levando o partido para o caminho que ele sabe que tenho esse compromisso’. Eu disse que isso era importante o Kassab conversar com ele. E na semana passada estive em Brasília, e conversaram o Kassab, doutor João e o Benedito de Lira. E o Kassab deixou claro que não tinha problema nenhum com ninguém, mas tinha compromisso com o senador Renan Calheiros”, concluiu Dudu Hollanda.