Causo minuto: A incrível história de Chico Chibata (parte 2)

27/01/2013 10:45 - Welton Roberto
Por Redação

Chico Chibata não sossegou enquanto não conseguiu dançar com Dora. E parece que ela sabia que tinha pegado o mulato valentão pelo pé, ou pelo cheiro, porque uma coisa era uma mulher cheirosa, outra coisa era “Dora”, uma perfumaria ambulante para ninguém botar defeito. Exalava cheiro de rosa importada ao passar e ao balançar o vestido bem cortado que moldava seu corpo perfeito e sedutor. Foi o tiro de misericórdia no galanteador.


Apaixonou-se de tal jeito que não percebeu a aliança da fogosa forrozeira na mão esquerda. Só conseguia olhar em seus olhos negros e arredondados torneados pelas sobrancelhas grossas e bem aparadas que davam ainda mais o contorno de uma mulher fatal, ou letal.


Dora tinha sotaque diferente de todos daquela região. Dizia-se nordestina de Cupira, mas não conseguiria convencer nem uma criança de dois anos com seu “r” puxado quando chamava a todos de “amorrrrrrrrrrrrrrrrzim”. Chico Chibata conseguiu finalmente mostrar o gingado do povo santanense e Dora não deixou por menos, dançou e requebrou como ninguém. Todos pararam para ver a exibição digna de filme de “Róliudi”, como Tonho Piu-Piu mesmo batizou aquela dança, e lógico ele caprichou na sinfonia completa do mestre Gonzaga, pois aquele encontro merecia o melhor forró de todos os tempos.


Ao se apresentar para Dora com o nome pomposo de Francisco Alvarenga Cardoso Pontes Outeiro Gardão, foi logo se chegando e tentando mostrar serviço no galanteio beijando-lhe demoradamente a mão direita. O gaiato do Joca Presepeiro cortou o ar romântico ao abraçar Chico Chibata por trás e arrochar um cheiro forte no pescoço, brincadeira que só poderia vir de um cabra gozador e alegre como ele. Foi logo tirando quarto de hora com o valentão e fazendo Dora gargalhar até perder o fôlego.


Chico Chibata, sem jeito, pela primeira vez em toda a sua vida de conquistador valente, deu um abraço no amigo e apresentou-lhe Dora que devolveu a brincadeira com mais um sorriso apaixonante para o desespero do mulato.


De repente despede-se de todos ao receber um toque no seu celular e parte misteriosamente sem deixar vestígio, a não ser um rastro cheiroso e sedutor que fez Chico Chibata amolecer de tanta paixão. Abraçou Joca Presepeiro de maneira tão carinhosa que parecia estar abraçando Dora, o que fez o gaiato dar um pulo e gritar em tom sarcástico e sacana para a pilhéria de quem olhava a cena, ainda não acreditando que o valentão galanteador tinha caído na armadilha do Tinhoso.


Por dias Chico Chibata tentou descobrir algo sobre Dora. Quem realmente era, de onde vinha, como chegara a cidadezinha de Santão Antão de Curupira e como desaparecera misteriosamente sem que ninguém soubesse ao menos dizer nada sobre seu paradeiro. Uma amiga, uma prima, uma conhecida sequer. A cidade não possuía rede hoteleira, a não ser a Pousada de Dona Tonica que abrigava alguns turistas e viajantes que passavam pelo local. Até lá Chico Chibata, todo amuado e desconfiado, foi bater para saber se aquela mulher misteriosa tinha ali estado. Mas nem rastro de Dora. Dona Tonica até desconfiou das perguntas do mulato valentão, sabia que era rabo-de-saia na certa, e foi logo o despachando sem mais delongas, magoada que ainda estava com o que fizera com sua netinha Tina de Alcebíades, uma moça prendada e até então virgem, antes de conhecer Chico Chibata, que prometera amor e só lhe trouxera confusão. Até agora estava solteira e suspirando por ele pelos cantos.


Semanas sonhando e suspirando por Dora, Chico Chibata andava estranho. Nada de valentia ou galanteios. Entristeceu-se de um modo que até padre Zeca percebeu a ausência dele nas missas dominicais e foi ter com ele para saber se estava adoentado.


Na conversa ele confessou que tinha sido pego pelo Tinhoso. Era artimanha de Satanás o que foi feito com ele. Castigo divino, talvez, pelas tantas moças e mulheres que havia feito de besta e agora se encontrava enrabichado por uma mulher que ele nem conhecia direito, sabia apenas que era Dora de olhos negros e perfume de jardim florido na primavera. Lamentou-se, murmurou e até chorar chorou o mulato valentão.


Padre Zeca sabia bem o que era aquilo. Não foi à toa que entrara para o seminário. O Tinhoso também já o tinha tentado, mas Deus, maior na sua misericórdia o havia salvado. Acabou revelando algo para Chico Chibata que estranhou aquele santo homem dizer que sabia o que se passava com ele. O mulato desconcertado perguntou:


- Dora, era o nome que o Tinhoso apareceu pra vosmicê, santo padre?


Padre Zeca emudeceu. Como é que ele sabia de Dora? Ficou sem jeito e não quis revelar nada mais. Apenas abençoou Chico Chibata e apressou-se para a missa da noite, onde seria feita uma novena para agradecer as chuvas que haviam chegado depois de uma estiagem de mais de três anos.


Chico Chibata não se conformou com o silêncio e foi atrás do padre... (continua no próximo domingo)
 

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