De musa dos sem terra à protagonista do reality show “Mulheres Ricas”. Em cerca de 15 anos, Debora Rodrigues deixou os acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e comprou com o marido, o piloto de Fórmula Truck Renato Martins, uma casa em um condomínio residencial de alto padrão nos arredores de São Paulo. “Eu tive sorte, minha estrela brilhou, Deus me deu uma oportunidade, agarrei e tento fazer dessa oportunidade o melhor possível”, afirmou ela
Depois de seu envolvimento com o movimento, Debora já foi capa da "Playboy" em 1997, apresentadora dos programas “Fantasia” e “Siga bem, Caminhoneiro”, se tornou empresária, além de conquistar um espaço entre os homens e garantir o caminhão 7 – número escolhido por ela – na Fórmula Truck
Aos 43 anos, ela encara agora uma nova empreitada e protagoniza o reality show “Mulheres Ricas”, que estreia em 2 de janeiro, na Band. Ao lado dela, estarão as socialites Val Marchiori e Narciza Tamborindeguy, a joalheira Lydia Sayeg e a arquiteta Brunete Fraccaroli. Juntas, elas já gravaram todos os episódios da atração, que mudou bastante a rotina de Debora. “Acabei abandonando o kart, porque eu ia em um dia, não ia no outro...”, diz a piloto, que deixou o esporte de lado para se dedicar às gravações.
Apesar do nome do programa, Debora reforça que não tem dinheiro sobrando. E faz questão de relembrar seu passado. “Não tenho nenhuma vergonha em dizer que eu era mesmo pobre. Passei fome, necessidade. Deixava de comprar alguma coisa para minha casa, pegava material para meus filhos na prefeitura, para poder ter comida dentro de casa. Então, o que tenho hoje, consegui com muito sacrifício”, afirma ela. Debora ainda declara que a sua realidade não condiz com a das outras participantes do programa. “E tenho dúvidas se a realidade delas é realmente a realidade delas.”
Confira a entrevista de Debora Rodrigues ao iG, em que ela fala sobre o “Mulheres Ricas”, seu passado no MST, sua paixão por caminhões e explica seu próximo projeto para as telinhas: um programa automobilístico voltado para as mulheres.
G: Como ficou o relacionamento entre vocês depois do programa? Costumam marcar de sair, se tornaram amigas após as gravações do "Mulheres Ricas"?
Debora Rodrigues: Para mim, é mais complicado porque sou casada. A Brunete é solteira, a Val vive como ela quer, a Narcisa está no Rio, a Lydia também é casada e sai pouco. Então acho que é mais difícil. Da última vez que nos encontramos, fomos na Band fazer as fotos de divulgação e, como acabamos ficando até tarde, saímos de lá e fomos jantar, eu, a Brunete e a Val. Acho que vai continuar uma amizade, mas as nossas agendas são complicadas.
iG: A Brunete comentou que você é a que menos gasta entre as meninas. É isso mesmo? Com o que você gosta de gastar?
Debora Rodrigues: Não é que eu não goste de gastar, é que eu acho que, quem tem sobrando, deve gostar de gastar. Eu não tenho sobrando. Não sou uma pessoa que gosta de ostentação, de estar abrindo minha vida na televisão. Fiz um reality há dois anos, que foi o “Troca de Família”, da Record, justamente por ser uma coisa onde eu estaria mostrando para as pessoas a Debora Rodrigues mesmo, que põe a mão na massa. Muitas pessoas acham que é balela, que é marketing, que não sei o que: “mas você era sem terra mesmo, e tal...”. Não tenho nenhuma vergonha em dizer que eu era mesmo pobre. Como a gente brinca, “pobre de marré”. Passei fome, necessidade. Deixava de comprar alguma coisa para minha casa, pegava material para meus filhos na prefeitura, para poder ter comida dentro de casa. O que tenho hoje, consegui com muito sacrifício. Tive sorte, minha estrela brilhou, Deus me deu uma oportunidade, eu agarrei e tento fazer dessa oportunidade o melhor possível. Dou muito valor ao caráter. Não estou preocupada com dinheiro.
iG: Mas você não gosta de gastar com nada?
Debora Rodrigues: Eu gasto com o que me interessa. Não gasto para mostrar para os outros. Não compro um carro para mostrar para minha amiga, minha vizinha, ou minha inimiga. Compro para mim, para o meu prazer. Não estou preocupada com o que as pessoas falam de mim. O que estou preocupada é com minha família. Não quero que minha filha tenha vergonha de mim, que meu marido tenha vergonha de mim. O resto é resto.
iG: Qual foi seu maior gasto?
Debora Rodrigues: Nossa casa. Foi um investimento alto, reunimos tudo que tínhamos. Deixamos de trocar o carro, ficamos uma época com um carro só e uma moto. Quando estava chovendo, um não saía (risos). Para investir na casa. E isso foi muito bom, porque eu já estou pensando em, ano que vem, trocar minha casa. Conseguimos acabar de pagar essa. Então quer dizer, não rasgo dinheiro. Tenho uma situação boa, sim, em vista de milhões de brasileiros que vivem na condição que eu vivia, que não tinha dinheiro para comprar uma bala. Então eu só posso agradecer a Deus, não tenho direito de pedir mais nada. Agora, eu não rasgo dinheiro, como pessoas fazem questão de dizer que rasgam. Não sou desse tipo.
iG: O que você mudou na sua rotina durante a gravação do programa? Precisou fazer algo que não gostava ou deixar de lado algo que faz parte de seu dia a dia?
Debora Rodrigues: Fazia kart três vezes por semana e acabei abandonando porque eu ia em um dia, não ia no outro. Acabo atrapalhando a vida da equipe do kart que me treina. Você fica a disposição do programa. Agora, acho que fazer coisas que não gosto, não. Mas coisas que não tenho costume. O negócio das meninas era sempre vamos fazer compras. Comprar isso, comprar aquilo. Não vou sair por aí gastando, não é o meu forte. Igual, fizeram um tal de um piquenique no Ibirapuera. Morei ali perto durante anos, quando minha filha era pequena, e eu nunca fiz piquenique. Imagina mulheres ricas. Tanto que eu não ia. Acabei dando uma passada lá de tanto a Brunette insistir. Mas falei: “Bru, estou sem nada, estou de moto”. E até a linguaruda da Val depois falou: “ah, a Debora foi e não levou nenhuma cesta, não sei o que”. Eu não ia! Mas, tudo bem.
G: A realidade das outras garotas é a sua?
Debora Rodrigues: Não. E tenho dúvidas se a realidade delas é a realidade delas. Acho que as pessoas às vezes acabam fantasiando tanto a vida, que acabam confundindo qual é a realidade, qual não é. E com isso correndo sérios riscos, na minha opinião, que já fui assaltada três vezes dentro de casa.
iG: Você tem medo dessa exposição do programa trazer mais problemas desse tipo para você?
Debora Rodrigues: Tenho muita preocupação, porque como popularmente dizem, todo mundo vê as pingas que você toma, mas ninguém vê os tombos que você leva. Então, até por isso mesmo eu sempre faço questão de dizer que vivo de patrocínio, não de renda, de lucros de banco. Eu e meu marido andamos de caminhão a 240 km/h, correndo o risco de sofrer um acidente. Então, me arrisco bastante para ganhar o que ganho.
G: A Val desabafou com vocês sobre a separação?
Debora Rodrigues: Ah, não tem como, né? Nós acabamos conversando com a Val, porque ela estava muito chateada, isso é natural. Toda pessoa que termina um relacionamento, se abala. Então, a gente deu uma força para a Val.
iG: E ela está bem?
Debora Rodrigues: Acho que agora está bem, sim. Ela ficou muito decepcionada. Mas sempre digo para as pessoas que a gente só conhece o ser humano com quem dorme, quando se separa. Isso é para os dois lados. Você pode viver 50 anos com uma pessoa. Você só vai conhecer realmente quem ele é quando você se separa. Pode escrever. Já me separei, minha mãe já foi separara. Entendo bem do assunto.
iG: Você sente algum preconceito na pista por ser mulher?
Debora Rodrigues: Não levo como preconceito, porque a partir do momento que você é a única mulher na pista, que você é diferente, você causa uma estranheza e uma competitividade maior. Fora da pista, são todos meus amigos, é muito legal. Agora, dentro da pista, minha dificuldade de ultrapassar em uma disputa com eles é maior do que entre eles. É óbvio, lógico, que eles não querem ser ultrapassados pela única mulher da categoria. Porque quando eles descem do caminhão, os caras vão e alugam mesmo. Então eu entendo, compreendo isso e não levo como preconceito. E jogo isso na mão de direção de prova para eles penalizarem ou não a atitude que for anti-desportiva. E se tiver que brigar também, quebro pau, filha. Se você for no briefing de piloto, você sai de lá de cabelo em pé.
iG: Você gostaria de pilotar em outras categorias ou sua paixão é pelo caminhão mesmo?
Debora Rodrigues: Olha, eu gosto muito da Truck. Com certeza, é meu carro chefe. No brasil, gosto muito da GT; a Stock Car com certeza, mas acho a mais difícil. Acho que qualquer uma das duas se eu fosse convidada, tivesse um patrocínio, eu iria com certeza. Desde que não tivesse que largar a Truck. Eu dividiria. E ainda tenho vontade de, pelo menos, dar uma volta de Nascar. Acho que me daria bem naquele bagulho lá. (risos)
iG: Como você é no transito?
Debora Rodrigues: Olha, hoje com a experiência e a responsabilidade de ser piloto, sou muito mais controlada. Já fui muito mais estourada. Antigamente, você batia boca e, se bobeasse, saía na mão. Mas hoje não. Qualquer coisa é na bala. Como eu não ando armada -- por enquanto, porque estou providenciando --, acho que é mais complicado. Então eu conto até mil, porque sou uma pessoa um pouco estourada. Conto até mil, me controlo bastante.
iG: E o pé no acelerador? Como você se controla no trânsito para não acelerar como na pista?
Debora Rodrigues: Bom, primeiro que o trânsito não deixa, não permiti. E porque tenho essa consciência de que tenho que dar exemplo. Tenho dois filhos que dirigem, que têm carro, então tenho que dar exemplo pra eles. E sempre digo pra eles: “vocês têm uma arma na mão. Então já vou avisando bem, não faça merda no trânsito, porque vocês vão assumir e eu não vou dar pano para ninguém”. Não pense que filho meu vai fazer uma caca igual esses caras, igual teve o do Camaro, que saiu batendo em todo mundo, matou um, matou outro, o pai foi lá, tentou... não! Eu vou morrer, vou sofrer como qualquer mãe sofreria, mas ele vai ter que arcar com as responsabilidades, porque falta de falar não é.
iG: Como foi seu primeiro contato com o caminhão?
Debora Rodrigues: Desde que nasci. (risos). Meu pai era caminhoneiro e eu sempre gostei de caminhão. Antes de dirigir, eu limpava o caminhão de ponta a ponta pra poder agradar o meu pai pra tentar dirigir. Mas, na verdade, só fui dirigir mesmo com 12 anos. Foi no Mato Grosso, indo pra Cáceres. Meu pai estava muito cansado e perguntou se eu sabia dirigir. Eu falei que sabia. Na verdade, eu pegava o carro dele. Porque eu falava para meu pai me ensinar a dirigir e ele falava que não, e que se eu quisesse aprender, eu ia aprender sozinha. Ele não queria que eu fosse caminhoneira, porque eu era filha única. E meu pai, mulher pra ele, tem que ser em casa. Então, aprendi. Eu olhava muito ele e saí dando uns trancos, mas aprendi.
iG: Você chegou a morar nos acampamentos do MST, certo? Por quanto tempo ficou por lá?
Debora Rodrigues: Olha, se tem uma coisa que tenho problema é com nome e tempo, mas eu acho que pelo menos uns dois anos eu fiquei no movimento. Primeiro, ficava meio período, depois integralmente, porque fiquei desempregada. Aí acabei entrando como militante do movimento. Eu acampava mesmo, só meus filhos que ficavam na cidade, que eu tinha uma casa na COHAB, minha mãe também.
iG: Como era sua rotina no acampamento?
Debora Rodrigues: Eu ajudava na cooperativa do MST, que era na cidade, e quando tinha ocupação, algum tipo de movimento, eu ia para o acampamento para ficar e poder ajudar. Quando você é militante, você faz de tudo um pouco. Arrecadando alimento num dia, outro dia ajudando as crianças na escola, outro dia correndo atrás de material pra fazer uma ocupação. Não tem muito rotina.
iG: Hoje, você ainda defende a causa? Qual sua relação com o movimento?
Debora Rodrigues: Minha relação com o movimento é nenhuma. O que eu continuo achando é que a reforma agrária no Brasil continua sendo importantíssima. Infelizmente, ninguém leva isso a sério, nossos governantes não levam isso a sério. Mas se nós tivéssemos uma reforma agrária séria nesse país, muitos problemas seriam resolvidos. A superlotação das capitais, fome... Você viu? Nosso PIB caiu. Tudo isso é relacionado ao problema rural. Se fosse um trabalho sério, não existira o Movimento Sem Terra.
iG: Na época do MST, você foi capa da Playboy. Posaria nua novamente?
Debora Rodrigues: Olha, eu não digo que dessa água não beberei. Porque para mim, foi ótimo. Acho que onde começou tudo realmente foi com a Playboy. Só tenho a agradecer. Mas hoje, não sei se seria bom para mim e para eles. Se fosse interessante para mim, financeiramente, se meus patrocinadores não se opusessem, e, principalmente, o ponto principal que manda isso, meu marido, não se opusesse; para mim, não teria problema nenhum. Foi um trabalho muito legal e acho que o trabalho da Playboy é um trabalho bonito, bem feito.
iG: Fora o “Mulheres Ricas”, você está com o projeto de outro programa...
Debora Rodrigues: Tenho um projeto com minha empresária e a gente está apresentando esse projeto, estou tentando viabilizar. Não está acertado. Uma coisa que um passarinho me contou, até não gosto de comentar, porque é muita conversinha, é que um canal de TV andou me especulando pelas beiradas. Mas ninguém me procurou, não chegou nada até mim.
iG: Esse projeto é idealizado por você?
Debora Rodrigues: Por mim e minha empresária. Seria uma oficina para mulher, para falar sobre carro, sobre segurança na estrada, tudo que envolve locomoção. Tudo para mulher. Porque todo mundo tenta enganar a mulher: o mecânico, às vezes até o fiscal de transito. Muitas mulheres dirigem hoje, mas elas não sabem trocar um pneu, elas não sabem ver a água do carro. Tem mulher que nem sabe que vai água no carro. E não é só mulher não, tá? Mas nós somos a maioria, infelizmente. Então, esse programa ia deixar a mulher cada vez mais por dentro das coisas.
G: Como você analisa essa transição, esse trajeto na sua vida de “musa dos sem terra” à “mulheres ricas”?
Debora Rodrigues: Tento, como diz a Brunete, fazer do limão uma limonada. Acho que nada é por acaso. Deus coloca as coisas na vida da gente com um propósito. Tento aproveitar todas as oportunidades que tenho, ser um ser humano bom, não sou perfeita, mas tento ser o melhor possível. Quando erro, volto atrás, tento corrigir meus erros. Então acho que minha trajetória foi tentando ser uma pessoa legal, íntegra. Aproveitando as oportunidades, mas fazendo o melhor possíve