Autos do caso Delmiro Gouveia e do último enforcamento judicial do Brasil farão parte do museu do TJ

O desembargador aposentado Antonio Sapucaia da Silva entregou, na manhã desta quarta-feira (8), ao presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL), desembargador Sebastião Costa Filho, autos originais de processos históricos que tramitaram na Justiça alagoana no final do século XIX e início do século XX.

Os documentos se referem ao homicídio do industrial Delmiro Augusto da Cruz Gouveia, assassinado em 10 de outubro de 1917, quando descansava na varanda de sua casa, na então Vila da Pedra, hoje município de Delmiro Gouveia, e ao último enforcamento judicial realizado no Brasil, em 1876, no município do Pilar.

Os processos serão digitalizados e farão parte do acervo histórico do futuro museu do Poder Judiciário de Alagoas, cujo projeto está em execução. A inciativa é uma contribuição para o resgaste e preservação da memória da Corte de Justiça de Alagoas, que foi oficialmente estabelecida em 12 de maio de 1892.

“Diante da importância dos documentos para uma melhor compreensão da história de Alagoas e do Judiciário, seus portadores resolveram repassá-los ao Tribunal de Justiça para que sejam digitalizados, armazenados no museu do Judiciário e disponibilizados ao público”, reforçou o desembargador aposentado Antônio Sapucaia da Silva.


Delmiro, pioneiro da eletrificação no Nordeste

Cearense de origem humilde, Delmiro começou aos 20 anos a trabalhar num filial de curtume americano no Recife (PE). Em 1895, comprou as instalações do negócio e, três anos depois, era considerado “o rei das peles”. Fundou a primeira fiação da América Latina, a “Estrela”, através da qual fabricava linhas de grande qualidade.

Aproveitou ainda o potencial da cachoeira de Paulo Afonso, no Rio São Francisco, entre Alagoas e Bahia, e construiu a usina de Angiquinho, de onde gerava energia elétrica para as casas dos operários da fábrica que havia montado na Vila da Pedra, hoje Delmiro Gouveia. Na época, não havia energia elétrica sequer em Recife, capital pernambucana.

O mercado-modelo em que negociava, na Vila da Pedra, produtos com preços abaixo dos da concorrência resultava em pressão por parte da companhia inglesa Machine Cottons, que queria comprar a fábrica fundada por Delmiro a todo custo, mas o pioneiro da industrialização nordestina nunca concordou em vendê-la.

Por motivação até hoje não muito clara, o industrial Delmiro Augusto da Cruz Gouveia foi assassinado com três tiros de arma de fogo aos 54 anos de idade. José Inácio Pia, o “Jacaré”, e Rosi Moraes do Nascimento foram presos em 1917 acusados de praticar o crime. Cumpriram pena, mas, antes de falecerem, ingressaram com pedido de revisão criminal.


Relevância histórica dos documentos

“Foram absolvidos da acusação somente no dia 24 de maio de 1983, muito tempo depois de terem cumprido a pena pelo crime do qual foram acusados”, explicou Antônio Sapucaia. Os verdadeiros mentores e acusados do crime, reforçou Sapucaia, nunca foram presos nem tampouco responderam a processo pelas acusações.

Para o presidente do TJ, desembargador Sebastião Costa Filho, os autos originais do processos referentes à morte de Delmiro Gouveia e ao enforcamento têm imensa relevância histórica e merecem tratamento e armazenamento adequados. “Serão digitalizados o quanto antes e ficarão à disposição da população no museu do Poder Judiciário”, informou.

O desembargador Sebastião Costa Filho também recebeu, nesta quarta-feira, do desembargador aposentado Antônio Sapucaia os autos do processo referente ao último enforcamento judicial realizado na região onde hoje está o município do Pilar. Trata-se da condenação e pena aplicada a um escravo, morto em praça pública no dia 28 de abril de 1876.


Busca pelos autos do impeachement de Muniz Falcão

Na ocasião, o presidente da Corte de Justiça fez um apelo para que pessoas que porventura detenham processos antigos, de valor histórico, devolvam os autos ao Poder Judiciário alagoano, especialmente o processo judicial referente ao impeachment do governador Muniz Falcão, um dos casos mais importantes julgados pela Justiça alagoana.

“São duas peças de imenso valor histórico”, completou o desembargador Antônio Sapucaia, segundo o qual os processos do caso do industrial Delmiro Augusto da Cruz Gouveia e do último enforcamento judicial realizado no Brasil estavam em poder da viúva de um jornalista alagoano, cujo nome não foi revelado.