Reforma no CDC, é preciso? O Código Funciona? Se melhorar estraga?

05/11/2011 10:24 - Direito do Consumidor
Por Redação

Reforma no CDC, é preciso? O Código Funciona?

Escrevo direto de Belo Horizonte nas Minas Gerais uma cidade muito bonita, e que sediou um Seminário sobre a Reforma do Código de Defesa do Consumidor, no qual participei como debatedor, juntamente com o Professor José Geraldo Filomeno, o Juiz Federal Hector Valverde e a superintendente do Proncon de Belo Horizonte a Dra. Maria Luiza. Aproveito para agradecer o convite feito pelas Dras. Ana Carolina Caram e Lílian Pettersen, do Instituto Mineiro de Políticas Públicas e Defesa do Consumidor, as quais proporcionaram com a organização do evento um dos momentos de destaque no Direito do Consumidor Brasileiro. Para aqueles que não tiveram a oportunidade de estar presente farei um breve relato do que vi, ouvi e falei.

Bom, ouvi atentamente as palavras do Dr. Hector Valverde, juiz de Direito e Presidente de uma das Turmas Recursais do Distrito Federal e que atualmente integra a comissão que está elaborando o ante-projeto do novo CDC, juntamente com nomes de destaque como Ada Pelegrini, Claudia Lima Marques dentre outros, palavras sábias, bem colocadas e com seus fundamentos, bem como da Dra. Maria Luiza, que tem o CDC na prática.

Posso afirmar aos amigos que basicamente as alterações propostas se fixam em três itens: Superendividamento do Consumidor, transações comerciais pela Internet e por fim, alterações de cunho processual, ou seja, da parte que trata dos interesses Difusos e Coletivos, que não tratarei hoje, por conta da sua extensão ficando para um outro momento.

Sobre o Superendividamento já escrevi neste blog e por isto não irei detalhar, mas consiste no endividamento excessivo do consumidor que por problemas alheios acabam se endividando de tal modo, que precisam dilapidar o seu patrimônio para arcar com as dívidas.

O novo código quer trazer em seu bojo, um capítulo específico sobre este tema, que possa dar ao consumidor um tratamento diferenciado. Nas palavras de Aristóteles “Igualdade é tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual”.

No que pertine aos contratos pela Internet, ou como chamam alguns, nas transações virtuais, a grande preocupação está em munir o consumidor de informações sobre aquele site ou provedor que está efetivando a transação, por exemplo, o ante-projeto tenta positivar que todas as empresas disponibilizem no site o seu endereço e o nº do CNPJ. Pelo que vi e ouvi, o objetivo é colocar no Código de Defesa do Consumidor situações do caso concreto. Assim como é feito no Direito Penal, este sim é taxativo e não poderia ser diferente, por exemplo, nada é mais objetivo do que o art. 121 do CP: Matar alguém.

Ocorre que, o CDC foi formado em 1990 sobre forma de Princípios, tanto que chamamos de um Código Principiológico, e já por isso pode ser aplicado em qualquer tempo, pois o estudo e interpretação dos Princípios é feita no tempo.

Tenho certeza que muitos Princípios discutidos no momento da formatação do atual Código, já alcançaram interpretações divergentes, porém todos tentam sobremaneira proteger o Consumidor cada vez mais.

Entendo que no Direito do Consumidor não temos como positivar nada, pois as situações são diferentes e assim continuaram sendo, a internet é um fenômeno que surgiu posteriormente ao código, porém vem sendo tratada como deve ser fruto de uma relação contratual. Quando efetuamos uma transação ou compra pelo meio virtual, estamos fazendo um contrato de compra e venda, prestação de serviço, enfim diversas modalidades de contrato que já são tratadas pelo Código Civil e pelo próprio CDC. Não estou defendendo que a internet não deva ser regulamentada, pelo contrário acho que deve sim, porém não dentro da legislação consumerista, e sim em uma legislação própria, onde haverá a previsão para os crimes praticados pela internet e demais situações que devem ser regulamentadas.

Ouvi atentamente as palavras do meu professor de Pós-Graduação, professor José Geraldo Filomeno, que para aqueles que não sabem, foi o precursor do Direito do Consumidor no Brasil, quando em 1983 criou um núcleo de proteção ao Consumidor no Ministério Público do Estado de São Paulo.

O nobre professor é totalmente contrário a qualquer tipo de alteração no Código, pois tudo que já está sendo tratado como alteração ou inovação, já pode ser colocado em prática pelas instituições que servem para o apoio e proteção ao consumidor. Em certos casos temos que utilizar da criatividade para resolver situações que envolvem a coletividade, pois o sistema não é perfeito, e nem será seja qual for a alteração. E lembro do exemplo que o mesmo apresentou na palestra disse ele: “no interior de São Paulo as tarifas de ônibus é regulamentada pelo Prefeito da cidade e só começa a entrar em vigor a partir de meia noite do dia tal. O MP/SP recebeu a denúncia e apurou que as empresas aplicavam a norma um ou dois dias antes do determinado no decreto, e como resolver isso, como fazer para devolver ao consumidor o valor pago de forma excessiva. Foi ai que pensamos na promotoria, qual foi o valor arrecadado de forma a maior, tanto, então os ônibus vão ter que rodar pela quantidade de dias sem cobrar nada para compensar o que já receberam de forma indevida” e completou “a solução foi perfeita? Não, pois o ideal era devolver ao consumidor o valor pago de forma indevida e em dobro, porém nesse caso não tínhamos como identificar, por isso usamos da criatividade para beneficiar o consumidor”.

Nesse Seminário ele disse ainda “Me desculpem os que defendem a alteração, mas um código que sobrevive com 119 artigos é a prova da sua eficiência”. Lembro ainda de uma frase que o mesmo disse quando foi publicado o CDC em 1990, porém lembrada no Seminário que “Se melhorar estraga”.

No que pertine aos pontos mais debatidos e que os defensores tentam se agarrar para justificar a reforma do código, narrei que no Procon de Alagoas já existe um núcleo capaz de identificar o Consumidor Surperendividado e tentar educa-lo da melhor forma, com o intuito de que este não mais acumule tais dívidas, bem como, tenta trazer às credoras para fazer também um tratamento diferenciado.

Ora, não precisa de uma norma nova para tratar desse assunto, precisa sim, de uma efetividade do Estado para a aplicação e inovação na forma e condução do CDC.
Entendo que não é papel do magistrado educar o consumidor esse papel é do Estado e cabe ao Procon adotar medidas educacionais. É papel do judiciário tentar amenizar as atividades de consumo, punindo quando necessário e aplicando as sanções devidas em conformidade com a lei.

Encerro este pequeno texto, até porque já estão me chamando para embarcar, e espero que dessa vez não venham avisar que o atraso ocorreu por um problema na turbina, informação que para mim se enquadra naquelas “totalmente desnecessária" ou  "eu poderia viajar sem saber”, com a convicção de que não existe motivo para alteração no CDC. Cada vez mais que leio sobre o tema, me convenço das sábias palavras do Professor Filomeno “Se melhorar estraga”.

Twitter: @MarceloMadeiro

E-mail: marcelomadeiro@gmail.com

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