Pai de Lula não foi enterrado indigente

29/11/2009 02:45 - Brasil/Mundo
Por Redação

A biografia mais completa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, O Filho do Brasil - de Luiz Inácio a Lula e o filme inspirado pela obra, Lula, O Filho do Brasil, tratam o patriarca da família Silva, Aristides Inácio da Silva, como um homem rude, ignorante, analfabeto, alcoólatra, mulherengo, violento com os filhos e, no final, concluem que ele morreu e foi enterrado como indigente, aos 65 anos de idade. A realidade, contudo, é diferente: Aristides teve um velório, sepultamento e seus restos permaneceram por cinco anos, entre 1978 e 1983, à espera de um parente que lhe desse uma sepultura perpétua.

Documentos obtidos pelo Jornal do Brasil revelam que, vítima de uma cirrose hepática, Aristides morreu às 02h05 do dia 3 de maio de 1978 no Hospital Santo Amaro, no Guarujá, litoral Sul de São Paulo, e foi enterrado no dia seguinte no Cemitério da Consolação, em Vicente de Carvalho, no mesmo município. O velório e sepultamento foram acompanhados pelos filhos e parentes da segunda família constituída por Aristides e por vizinhos da casa onde o presidente Lula – antes de mudar-se para o ABC paulista – morou, no mesmo bairro de Vicente de Carvalho.

A guia de sepultamento, guardada nos arquivos do cemitério municipal, aponta que o corpo de Aristides, identificado, permaneceu cinco anos na “Campa 2, Quadra T”. Um edital, o de nº 24/83, publicado num jornal do litoral a pedido da Prefeitura do Guarujá, lista o patriarca dos Silva entre outras 40 pessoas sepultadas no mesmo período. O objetivo da publicação – uma exigência legal em se tratando de cemitérios municipais – era alertar os familiares para que estes, se quisessem, providenciassem a transferência dos restos para um jazigo com lápide e epitáfio.

Como ninguém apareceu, um mês depois os restos foram exumados, colocados dentro de um saco que, amarrado com uma etiqueta de identificação, foi transferido para um ossário. O depósito, uma caixa de concreto subterrânea de 24 metros quadrados de superfície por 6 metros de profundidade, inteiramente tomado por pilhas com 15 mil ossadas, foi lacrado há alguns anos e aterrado. Os sacos e as etiquetas com os nomes se desintegraram, os ossos se misturaram e hoje, 24 anos depois, a identificação seria tão difícil quanto procurar uma agulha num palheiro.

– Ele não foi enterrado como indigente. Temos todos os registros aqui. O óbito foi registrado em cartório. O problema é que nunca apareceu ninguém para reclamar – diz a administradora do Cemitério da Consolação, Denilda Valentim Vanderlei. No verso da guia de sepultamento, cujas informações foram prestadas por um homem que se identifica como Lourival de Souza Dantas, há inclusive o valor da taxa do velório, em valores de 1978: “Cr$ 484,60”, os dados de identificação de Aristides e o nome da pessoa que bancou as despesas, Mirlando Mauro Chiapetta.

Detalhes

De autoria da jornalista e escritora Denise Paraná, lançada em 1996, a biografia que se transformou em roteiro do romanceado filme dirigido pelo cineasta Fábio Barreto é farta em detalhes sobre a distante relação entre Lula e o pai. Aristides foi praticamente apagado da memória da família depois da separação da mulher, Eurídice Ferreira de Mello, dona Lindu. No mesmo período em que Lula emergia como líder sindical, os dois voltaram a se encontrar. Mesmo assim, as lembranças refletem quase sempre mágoas represadas. “Eu não tenho nenhuma compaixão pelo meu pai” revela Lula à jornalista, onde faz uma única exceção elogiosa ao ressaltar que ele nunca deixou faltar comida em casa.

“Quando ele morreu, nem nós, nem a outra mulher, ficamos sabendo no dia. Foi enterrado como indigente e depois ( é ) que nós soubemos” afirma o presidente à sua biógrafa e co-roteirista do filme. Lula diz que soube da morte do pai no dia em que recebeu a notícia da primeira greve dos metalúrgicos da Scânia, no ABC, 12 de maio de 1978. Mandou os irmãos para o litoral e só então descobriu que Aristides estava morto e sepultado como indigente havia dias. Genival Inácio da Silva, o Vavá, conta no mesmo livro que um funcionário do cemitério se dispôs a abrir o caixão, mas o hoje presidente, por telefone, avisou que não:

“O Lula falou: \'Não adianta, já morreu. Deixa do jeito que está”\' relata Vavá. O nome de Aristides só se apagaria décadas depois.

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