Só com a maturidade – espero estar rumando ao seu encontro, mesmo que tardio - compreendi o quão preciosa pode ser a solidão. Considero que ela é menos uma condição física e mais um estado da alma: estar só não significa estar solitário.

Deve ser, sim, uma conquista da vida poder dialogar consigo próprio, mesmo que sobre o cotidiano, ou até sobre aquilo que não podemos encontrar no corre-corre de cada dia. E o mais importante: sem que isso nos traga tédio ou atraia a tristeza.

O medo da solidão,  já não tenho mais - cultivo-a, até. Meus afetos mais sentidos, penso sempre poder tê-los (há os eternos ausentes, é verdade mas isso tem relação com outro sentimento: saudade), e eles a mim, quando se fizer necessário seja pelo amor, seja pela amizade.

Temer a solidão pode ser, ao final, não suportar a própria companhia. E buscar em outros a serenidade que não encontramos em nós não parece  ser um bom caminho.

Um solitário por opção, o filósofo francês Michel de Montaigne, num ensaio dedicado ao tema, nos diz:
- Devemos reservar-nos um cantinho retirado totalmente nosso, totalmente independente, no qual estabeleçamos  nossa verdadeira liberdade, e nosso importante retiro e solidão. Nele devemos travar conosco nossa habitual conversa sobre nós mesmos, e tão privada que ninguém de nossas relações e nenhuma comunicação de fora encontre espaço.
 
Não se trata, aqui, do elogio à autossuficiência, dispensando os demais indivíduos, principalmente aqueles a quem bem-queremos e respeitamos, da nossa convivência. Nada disso. Mas em tempos ruidosos, a solidão encontra no silêncio o seu mais dileto irmão. Silêncio com música, por exemplo, e por que não?

A nossa própria alma, segue Montaigne, “pode se fazer companhia; tem como atacar e defender, como receber e como dar; não tenhamos medo de que nessa solidão nos estagnemos em tediosa ociosidade”.
Ler um livro, ver um bom filme, escrever um texto, tudo isso exige, quase sempre, que nos voltemos para dentro, sozinhos, digerindo e metabolizando aquilo que nos invade os sentidos. É a solidão, esta, que está povoada de sentimentos, de identidades, evocando os nossos melhores amores. Enfim, a solidão que traz conforto e preenche a nossa alma com as boas coisas do mundo.

Aquela que é mais cantada, por triste, pelos poetas, compositores, homens da criação, é quase sempre a solidão que se esparrama pela ausência do amor romântico. Esta fere, é bem verdade, mas por algo que já nos falta antes mesmo da parte que buscamos. Ninguém completa ninguém, acho, mas as duas partes se completam quando estão juntas. 

Não existiria, então, “a fera” que “devora”, dos belos versos de Alceu Valença, a que sorri "seus dentes de chumbo" (Paulinho da Viola)? 

É claro que sim. 

E o quadro mais perfeitamente pintado deste momento dorido, eu enxergo em outros versos – do poeta pernambucano Carlos Pena Filho, que o capturou na multidão:

São trinta copos de chope
São trinta homem sentados
Trezentos desejos presos
Trinta mil sonhos frustrados