Há quem diga que nunca é tarde para aprender. Na Escola Municipal Suzel Dantas, no Tabuleiro do Martins, essa frase se torna realidade nos corredores, onde adultos e idosos voltam às salas de aula — muitas vezes cruzando com os próprios filhos ou netos, também estudantes da instituição.

Uma dessas histórias é a de Maria Dionete, 54 anos. Viúva há 15 anos, ela viu na escola a oportunidade de voltar a socializar e realizar seu grande sonho de finalizar os estudos. 

“Aos 39 anos, fiquei sozinha. Ficava em casa, não podia mais trabalhar, os meus filhos já estavam casados. Mas eu me sentia muito só. Não tinha leitura nem para o celular, porque não conseguia escrever e nem ligar”, contou. 

Na unidade de ensino, Dionete começou a aprender o alfabeto e a juntar as letras. Hoje, ela pode assinar o próprio nome sozinha — antes, sempre pedia para alguém escrever para que pudesse copiar as formas das letras. 

Maria Dionete e o neto dividem ambiente escolar. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

Maria Dionete e o neto dividem ambiente escolar. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

 

Dionete descreve como “um milagre” o fato de poder dividir o ambiente escolar com o neto Bryan, que está no 5º ano do Ensino Fundamental. “Para mim, eu creio que é um milagre, porque eu já criei meus filhos, eles já trabalham, e eu comecei a estudar com o meu neto. Meu neto de manhã e eu à noite. Para mim, é o melhor chegar aos 54 anos estudando sobre tudo com meu neto. Ele me ensina as atividades e me ajuda a entender mais”, comentou.

A estudante pontuou, ainda, que cada pequena conquista na sala de aula é celebrada, e que sente muita felicidade quando consegue aplicar os conhecimentos adquiridos em seu cotidiano. “Agora, eu consigo ler onde tem escrito ‘volume’ na televisão, consigo juntar a letra e leio. Quando eu sei o nome, construo a palavra juntando, posso ler o nome de alguém e discar no telefone”, disse.

Depois de finalizar os estudos da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (Ejai), o caminho de Dionete na educação continua: ela pretende ingressar numa universidade para cursar Pedagogia e alcançar o sonho de ser professora. 

Segunda casa

Logo após finalizar a matrícula da filha Rebeca, que estuda no 3º ano na Escola Municipal Suzel Dantas, Eliane da Silva decidiu retomar os estudos, que havia parado aos 11 anos de idade. 

“O que me motivou a voltar para a escola foi o jeito das pessoas e a opinião dos alunos que estudam de noite, que falaram que era muito bom. Eles me deram segurança para voltar a estudar”, relatou.

Na época em que parou os estudos, ela não teve o acompanhamento necessário em sala de aula e desistiu porque não conseguia entender o conteúdo. Agora, sua realidade na escola é outra: fez amigos, tem professoras e diretoras que se preocupam com seu aprendizado e, em suas palavras, sente-se em casa. 

 

Eliane da Silva e a filha estudam na mesma escola. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

Eliane da Silva e a filha estudam na mesma escola. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

 

“É uma família. Fiquei segura de que não vou me arrepender de ter voltado a estudar. Estou muito feliz de estar aqui na escola”, comemorou. 

Em casa e na escola, a cumplicidade das duas é a mesma — elas conversam sobre os assuntos que estudaram, sobre o dever de casa e sobre o dia-a-dia na unidade de ensino. “Sempre tento dizer a ela que é muito importante estudar, porque hoje em dia, sem estudar, a gente não é nada. É estudando que você consegue ter uma profissão melhor, então sempre digo a ela que se dedique, estude”, revelou. 

A dedicação de Eliane também não é restrita à grade curricular da Ejai. Além das aulas durante a semana, aos sábados, ela está se profissionalizando com um curso técnico de vendas.

Sonhar alto

Aos 35 anos, Shirlene Maria da Silva voltou à sala de aula com um propósito definido: ser exemplo para os filhos e realizar um sonho antigo. Mãe de seis, ela conta que por muito tempo os cuidados com a família a impediram de seguir nos estudos. 

“Eu tive seis filhos e daí me proibiu muito de eu vir mais cedo, mas agora estou aqui”, diz. Shirlene, que estuda à noite, na mesma escola onde o filho Weslley Sonival cursa o 3º ano do Ensino Fundamental. Ela conta que a convivência dentro e fora das salas de aula fortaleceu o vínculo entre os dois. 

Shirlene da Silva e o filho estudam na mesma escola. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

Shirlene da Silva e o filho estudam na mesma escola. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

 

“Eles ficam felizes em saber que a gente estuda aqui. Aí eu conto como foi o dia, o que aprendi, digo que foi bom, que teve brincadeira, que aprendi com a professora. Isso é muito importante”, relatou.

Para ela, mais do que recuperar o tempo perdido, estar na escola é uma forma de mostrar aos filhos que o conhecimento transforma. “A gente tem que incentivar. Hoje, tem muito aluno fora da sala de aula. Então, acho que isso dá um sentido pra eles, continuarem vendo a gente estudando”, enfatizou. 

Quando terminar o curso, Shirlene sonha alto. “Quero fazer uma faculdade, se Deus permitir. Nunca é tarde, né?”, refletiu.

Superação

Eleneide Santos voltou à escola aos 51 anos, movida por um desejo simples, mas poderoso. Ela queria aprender a ler para entender melhor a Bíblia e se expressar com mais segurança. Avó de Daniel Dantas, aluno do 3º ano, divide com o neto não só o mesmo endereço escolar, mas também a rotina de estudos e descobertas. 

“É um sonho, né? Porque aí eu sei tudo que ele tá fazendo. A gente tem que estar de olho”, brincou, com orgulho. Eleneide interrompeu os estudos ainda na 2ª série e, por muitos anos, enfrentou dificuldades para se comunicar. 

 

Eleneide Santos com o filho na escola onde estudam. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

Eleneide Santos com o filho na escola onde estudam. Foto: Alícia Flores/ Ascom Semed

 

“Eu era muito tensa, não falava, não saía de casa. Foi difícil começar, conhecer pessoas, fazer amizade”, relembrou. Hoje, ela não só se sente mais confiante, como também ajuda o neto nas tarefas, quando os outros meninos da casa não estão por perto. 

Criando três netos, Eleneide vê no retorno à escola uma forma de ensinar mais do que conteúdos. “Tenho que ser exemplo para eles. O que eu aprendo na escola, ensino em casa”, afirmou.

Sem planos de seguir para cursos técnicos ou faculdade, Eleneide quer algo que para ela já é suficiente: realizar o sonho de ler com autonomia. “Infelizmente, eu não posso trabalhar, mas quero aprender a ler mesmo. Quando eu terminar, vou estar feliz. É a realização de um sonho”, revelou.