Considerado o mês das mães, maio também é marcado por uma campanha que aborda um assunto importante, mas ainda pouco discutido, a saúde mental materna. Criada em 2021, a campanha Maio Furta-cor tem o intuito de sensibilizar a população sobre os problemas que afetam a saúde mental de mães e gestantes.

“É uma campanha voluntária, sem fins lucrativos, comunitária, voltada para saúde mental materna, que tem por objetivo sensibilizar e conscientizar a população para a importância do cuidado e prevenção dos adoecimentos psíquicos durante toda a maternidade”, explica a psicóloga clínica e perinatal, Wanessa Vale.

O nome ‘Furta-Cor’ foi escolhido por conta da tonalidade se alterar de acordo com a luz que recebe, e que remete à pluralidade das experiências de maternar.

De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), as mulheres estão suscetíveis a desenvolver transtornos mentais durante a gravidez e no primeiro ano após o parto. Os transtornos são vistos como um grave problema de saúde pública que necessitam de estratégias urgentes de enfrentamento.

Entre os problemas que afetam a saúde mental materna está a depressão pós-parto, que possui sintomas como melancolia intensa/desmedida, desmotivação profunda diante da vida, ausência de forças para lidar com a rotina e muita tristeza, acompanhada de desespero constante.

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a depressão pós-parto atinge aproximadamente 25% de mães no Brasil, uma a cada cinco mulheres no período de 6 a 18 meses do bebê.

Ao CadaMinuto, Wanessa Vale detalha os problemas o que podem afetar a saúde mental de mães e gestantes, como é possível identificar e ajudar uma mãe com depressão. A psicóloga clínica e perinatal também explica a diferença entre depressão pós-parto e baby lues.

Confira a entrevista:

A psicóloga clínica e perinatal, Wanessa Moura / Foto: Arquivo Pessoal

 

Quais os fatores ou motivos que podem acarretar mal-estar emocional e psicológico ou afligir mães e gestantes?

O adoecimento psíquico durante a gestação ou puerpério é multifatorial, podendo ser sociais, culturais, históricos, físicos e emocionais. Podemos citar alguns fatores de risco, como histórico anterior de depressão ou transtorno de ansiedade, violência obstétrica, gravidez de risco, falta de rede de apoio, maternidade solo, os estigmas e cobranças sociais em torno da maternidade, entre outros.

Quais as doenças/problemas que podem ser desencadeadas (os)?

Durante a gestação e/ou puerpério a mulher pode desenvolver alguns transtornos como o transtorno de ansiedade, transtornos depressivos, entre outros adoecimentos ainda mais graves, como psicose puerperal e transtorno de estresse pós-traumático. 

Há sinais que podem indicar o início de um problema de saúde emocional ou mental? 

Sim, humor deprimido (choro frequente), perda de prazer e interesse nas atividades, alterações no sono e apetite, irritabilidade, pensamentos negativos, desesperança e sentimento de culpa ou incapacidade. 

O que o companheiro ou familiar pode fazer para ajudar? Quais as atitudes e procedimentos a serem tomados?

A família como um todo pode contribuir no acolhimento e na escuta sem julgamentos; fortalecer a rede de apoio dessa mãe e buscar profissionais qualificados para um possível diagnóstico. 

Em que momento deve-se procurar ajuda profissional, onde buscar?

Caso a gestante ou puérpera apresente sintomas, os quais foram citados anteriormente, é de suma importância o acompanhamento profissional de psicólogo e psiquiatra. Atualmente o município dispõe de um serviço de atendimento à saúde mental, um dispositivo inovador, que é o Ambulatório de Saúde Mental de Arapiraca.

Um dos problemas mais discutidos recentemente é a depressão pós-parto. Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico de depressão pós-parto é realizado pelo psiquiatra e/ou psicólogo através da avaliação clínica e de instrumentos de rastreio da depressão. 

Qual a diferença de baby blues e depressão pós-parto?

O Baby Blues (ou disforia puerperal) é considerado uma labilidade emocional que ocorre nos primeiros dias após o nascimento do bebê, motivada pelas alterações hormonais e ambientais. Todavia esses sintomas não alteram de forma significativa a capacidade funcional da mulher e são remissivos de forma espontânea entre 2 a 3 semanas. Há estudos que mostram que 80% das puérperas vivenciam o baby blues. Na depressão pós-parto os sintomas persistem e geralmente incapacitam a mulher de desenvolver suas atividades diárias. É importante destacar que na psicose puerperal os sintomas são euforia, comportamento desorganizado, confusão mental, alucinações e delírios, pensamentos de ferir a si e ao bebê, podendo chegar ao infanticídio. Esse transtorno acomete entre 1 e 2 em cada 1000 mulheres.

De que forma a saúde mental da mãe pode afetar a vida e o desenvolvimento do bebê?

Quando a saúde mental materna está comprometida, há grande probabilidade de impactos no desenvolvimento da criança, desde o nascimento até a adolescência. Pode haver risco de prematuridade, complicações no parto, prejuízos na vinculação e interação mãe-bebê, dificuldades na amamentação, riscos no desenvolvimento cognitivo e social, transtornos mentais na puberdade, entre outros. 

Há formas de se prevenir contra os transtornos mentais maternos? De que forma?

É importante mencionar que muitas mulheres não buscam ajuda devido ao julgamento social, onde considera-se culturalmente que a gestante ou puérpera “deve” estar plena durante o ciclo gravídico puerperal (gestação e pós-parto), sendo esses uns dos períodos significativos e potenciais de risco dos transtornos mentais. A prevenção e os fatores protetivos ocorrem desde um ambiente familiar e conjugal positivo, à hábitos saudáveis, escolaridade elevada, acesso a moradia e alimentação, controle financeiro, e através do acompanhamento profissional ainda na gravidez como, por exemplo: a psicoterapia e o pré-natal psicológico.

Foto: Pexel

 

Proteção à saúde mental das gestantes e puérperas é direito garantido por lei

Desde 2023, a assistência à saúde mental materna ganhou um reforço no Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com a Lei nº 14.721/2023, gestantes e puérperas podem contar com acompanhamento psicológico, além de ações de conscientização. A legislação alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), estabelecendo diretrizes para fortalecer a saúde mental de mulheres nas referidas situações.

O SUS já dispõe de acompanhamento psicológico, que deve ser indicado por um profissional de saúde durante o pré-natal ou no puerpério, conforme a necessidade identificada e recomendada pelo médico. O SUS também deve promover atividades educativas e de conscientização sobre a saúde mental da mulher durante a gravidez e puerpério.

Segundo a advogada Camila Ferreira, grande parte das mulheres desconhecem esses direitos ou não sabem como ter acesso. Ela explica como as mulheres podem garantir seu direto e o que fazer caso enfrente dificuldades ou negativas.

“A mulher que precisar de ajuda profissional e acompanhamento psicológico deve se informar no local onde faz o pré-natal sobre onde pode ter o atendimento e como funciona o encaminhamento. Se tiver se sentindo emocionalmente sobrecarregada, ela deve informar ao médico sobre o problema e pedir uma avaliação ou possível encaminhamento ao suporte psicológico. Por fim, caso enfrente negativa injustificada ou dificuldade no acesso, ela deve procurar a Defensoria Pública, o Ministério da Saúde, um órgão de defesa da mulher ou um advogado especializado para garantir o seu direito”, frisou a advogada.