Em meio a um cenário de inflação persistente, juros elevados e um mercado de trabalho ainda instável, conversar sobre finanças pessoais é questão de sobrevivência. Para ajudar trabalhadores formais e informais a atravessar 2025 sem comprometer o bolso e planejar um futuro mais tranquilo, o CadaMinuto conversou com o economista Jarpa Aramis.
Nesta entrevista, ele traduz conceitos econômicos em dicas práticas: desde como montar (e manter) uma reserva de emergência até o que realmente vale a pena estudar para aumentar a renda, passando por estratégias para driblar a inflação, organizar-se sem salário fixo e planejar uma aposentadoria digna.
Quais cuidados os trabalhadores devem ter com o orçamento em tempos de incerteza econômica?
Quando estamos em momentos de instabilidade, alta de inflação, o desemprego vem crescendo, a renda vai caindo, é importante adotar sempre uma postura de planejamento e contenção dos gastos. Ou seja, o primeiro passo é rigorosamente controlar o orçamento, registrando tudo que entrou, tudo que saiu, mesmo as pequenas compras. Como dica podemos trocar hábitos de comprar lanche fora de casa e levar uma refeição preparada. Onde se consegue ter uma redução significativa. E uma outra questão importante é evitar dívidas desnecessárias, porque nesses cenários, geralmente você vai encontrar juros altos, cartão de crédito rotativo 'lá em cima'. É importante repensar algumas compras. Se precisa trocar o celular compra um mais simples ou compra um usado, até que a situação melhore e você possa adquirir aquilo que você quer. É importante também poder renegociar algumas dívidas com os bancos ou com as financeiras, que geralmente quando a coisa aperta são os caminhos que o trabalhador busca para tentar reduzir o valor da parcela mensal e outro cuidado importante também é fazer uma reserva de emergência, isso é importantíssimo, mesmo que seja pequena, por exemplo, aquilo que você conseguiu economizar quando você redefiniu as suas prioridades, conseguiu rever as dívidas, você conseguiu economizar, guarda, coloca numa conta de poupança, que você tenha dificuldade de ter acesso, isso é importante. Por que a dificuldade de ter acesso? Por exemplo, eu tinha uma conta poupança que eu não possuía nem cartão e toda vez que tinha uma reservazinha eu colocava lá e quando eu queria esse dinheiro sabia que era necessário enfrentar uma fila para ir na boca do caixa para poder retirar. Quando pensava nesse tempo ia gastar eu desistia e deixava o dinheiro. Esse procedimento seria necessário só quando era extremamente essencial. Se conseguir guardar R$ 50,00 ou R$ 100,00 por mês, para quem ganha um ou dois salários mínimos é uma reservazinha importante. Mas também é bom evitar compras por impulso, priorizar o consumo consciente, fazer muita pesquisa de preço avaliar as marcas que estão mais baratas no supermercado e poder também repensar a maneira como você realiza suas compras para satisfazer as necessidades mensais da família. Geralmente quem vive apertado compra de maneira fracionada, toda semana ou a cada dois dias, faltou óleo, faltou margarina, faltou arroz, faltou feijão. Quando você consegue equilibrar essa regularidade de compra, se você faz semanal, procura fazer quinzenal, porque aí fica mais fácil evitar desperdício e controlar melhor os custos.
Como o trabalhador pode se proteger da inflação e da perda do poder de compra?
O trabalhador precisa definir estratégias como é que ele vai preservar o valor do dinheiro dele, porque a inflação, ela destrói o valor do dinheiro ao longo do tempo. Uma medida importante é, se ele puder, claro, diversificar as fontes de renda que ele tem. Por exemplo, uma costureira que trabalha oferecendo pequenos concertos ou serviços, além daquilo que ela já faz de maneira regular lá na empresa onde ela trabalha, então ela pode oferecer isso a mais e, evidentemente, vai ter uma renda extra e ajudar a compensar o aumento desses preços. Outra forma é você investir em produtos financeiros ou mesmo se o trabalhador conseguir juntar R$ 50 ou R$ 100 reais, aplicar em uma corretora de seguros e criar uma reserva sem perder o valor do dinheiro que ele tem hoje e que esses R$ 100 reais de hoje daqui a dois anos ele consiga ser corrigido pelo valor da inflação e que ele não perca o dinheiro dele. Uma outra prática, já dita anteriormente é, além das visitas aos mercados, fazer uma pesquisa também em aplicativos. Uma coisa bacana que pode ser feita é organizar grupos com familiares ou vizinhos para fazer compra coletiva no atacado. Com isso você consegue reduzir o valor unitário dos itens. Se você conseguir se organizar, pode antecipar compras de produtos que não são perecíveis, principalmente quando estão em promoções, ou seja acompanhar as pesquisas, o que é que está mais em incidência nas quartas-feiras, as quartas de, sabe, de produto tal, de produto tal, é sexta, ficar atento a isso, para conseguir pegar uma promoção bacana de arroz, feijão e comprar em grande quantidade, e evidentemente que tem que estar dentro do orçamento. Usar o cartão de crédito para manter o estilo de vida que já não cabe no orçamento. Não é a melhor opção. O ideal é que você viva realmente conforme as rendas que entram.
Investir em qualificação profissional ainda é o melhor caminho para melhorar a renda?
Sempre. A qualificação contínua é a forma mais segura e eficaz de conseguir melhorar a sua renda. Os trabalhadores que possuem maior conhecimento e mais habilidades específicas, na maioria das vezes, conseguem melhores posições profissionais, melhores cargos, salários e se você não tem um concurso público, você consegue uma estabilidade profissional mesmo se você não tem um concurso público, uma estabilidade de entrega que você consegue realizar pela qualidade do serviço que você pode oferecer, do produto que você pretenda vender. Imagina um auxiliar administrativo, por exemplo, faz um curso de excell avançado, ou de gestão de processo, vai ser promovido a assistente do setor, a analista, ou seja, ganhando mais responsabilidade com base naquilo que ele se capacitou e isso vai consequentemente melhorar a sua renda. Vamos trazer outros exemplos como manicure, pedreiro, eletricista, fez um curso técnico, se aperfeiçoou, já atende com qualidade diferente, ele consegue agregar valor àquilo que ele entrega do ponto de vista de serviço, de entrega efetiva para o cliente. Então ele pode cobrar mais pelo serviço e naturalmente isso vai ampliar a carteira de clientes dele. Existe uma infinidade de plataformas que não só oferecem um curso para você adquirir uma nova competência, uma nova habilidade de graça e com certificado. Senai, Sebrae, Sesc, universidades públicas, ensino à distância. Quem quer entrar na área de tecnologia pode fazer um curso de introdução à programação online e ficar apto a poder entregar esse serviço concorrendo à vaga de estágio ou trabalho júnior em empresas privadas que necessariamente não exigem formação. Você tem que mostrar que você sabe entregar. Precisa mostrar os seus serviços por isso investir em qualificação é o melhor caminho.
Quais setores estão em alta e podem oferecer boas oportunidades de emprego ou crescimento?
Os setores que estão em alta e podem oferecer boas oportunidades de emprego e crescimento, sem sombra de dúvidas, é a tecnologia da informação, analista de dados, segurança cibernética, desenvolvedores, IA e toda essa área. É um processo de transformação que se intensificou depois da pandemia. Outra área é a da saúde, como cuidadores, enfermagem, técnicos de laboratório, vejo que tudo isso também se conecta muito com a área da tecnologia da informação, educação e cursos on-line também, assim como a área da sustentabilidade e energia renovável, serviços logísticos e comércio eletrônico.
Que tipo de habilidades estão sendo mais valorizadas pelas empresas em 2025?
Para qualquer cargo ou atividade a desempenhar dentro de uma organização precisa de habilidades técnicas. Mas para além delas, é necessário algo que está claro há alguns anos que é o aperfeiçoamento. São as habilidades comportamentais, principalmente inteligência emocional, capacidade de resolver problemas, facilidade de você se adaptar, saber trabalhar em equipe, ter uma comunicação fluida, ter capacidade de gerar pensamentos críticos. E nas áreas técnicas, migrar as habilidades digitais, dominar ferramentas que possam trazer um olhar completo daquilo que se é feito, como ferramentas de produtividade, análise de dados, isso tem se destacado.
O que os trabalhadores informais podem fazer para se organizar financeiramente, mesmo sem salário fixo?
O básico. Criar um sistema de controle do que se gasta. Você pode fazer isso no caderno, bota de um lado entrada, do outro lado saída. O que foi que entrou de dinheiro, o que foi que saiu de dinheiro. Se você tiver facilidade de baixar uma planilha, é simples. Ou mesmo um aplicativo para fazer esse controle. E não apenas fazer o controle, mas avaliar o que aconteceu, por exemplo, em janeiro do ano passado. Imagina a pessoa que tem o controle durante cinco anos e ela precisa olhar como é que estavam os seus gastos cinco anos atrás, quatro anos atrás, nesse mesmo mês, dois anos atrás. Então assim, não apenas registrar, mas também avaliar. Por que avaliar? Porque aí consegue estabelecer novas metas. Que realmente possa cumprir, como fazer reservas, evitar gastos fora de casa, definir realmente as prioridades, entender qual é o momento que vive e que tipo de estilo, que tipo de gastos, qual é o padrão de vida que realmente pode ter, isso não pode fugir do horizonte do trabalhador. Outra dica é importante para quem tem um negócio é fazer a divisão daquilo que é pessoal e daquilo que é da empresa. Isso faz toda a diferença para entender o peso do orçamento familiar dentro do seu negócio. Para poder ter a capacidade de ver quanto é possível investir para além daquilo que você já faz para o seu negócio e adequar o seu estilo de vida, com base no quanto você tira da empresa.
É possível planejar uma aposentadoria digna com a realidade de hoje? Por onde começar?
Na realidade de hoje é possível sim, mas requer renúncias no presente para você poder no futuro desfrutar dessa renúncia feita hoje. Tem que ter disciplina, organização. Lidar com dinheiro é uma questão de comportamento. Como é que eu me relaciono com dinheiro? Uma coisa que eu costumo trazer é que lidar com dinheiro é como você lida com a sua saúde bucal, com a sua higiene pessoal. Todo dia você tem que escovar os dentes, a cada refeição que você faz, você tem que tomar o seu banho, 3, 2, 1, o quanto cada um avalia o que seja necessário pelo que faz, mas é da mesma forma. Então, o dinheiro você tem que olhar todo dia pra ele, tem que estar o tempo todo atento, revendo prioridades, avaliando, mas isso tem que ser, não de uma forma abstrata, você tem que ter números, você tem que ter controles, você tem que ter registros para poder tomar as decisões mais assertivas. Então, sim, é possível começar com pequenas contribuições mensais, seja pelo INSS ou mesmo de longo prazo, também tem a possibilidade de você, dependendo do perfil da quantidade de dinheiro que esse trabalhador consegue oferecer de renda, pode fazer uma previdência privada, um tesouro direto, mas é importante começar cedo. Isso é fundamental. E claro, contribuir com regularidade, quando tiver dificuldade. Também é recomendado buscar orientação de um profissional que domine a temática para saber qual é a melhor opção.
Que direitos básicos os trabalhadores precisam conhecer para se proteger no mercado de trabalho atual?
Tem que ter registro CLT, acesso a férias, décimo terceiro, FGTS, INSS, licença maternidade, paternidade, direitos a condições dignas de trabalho, conforme a legislação estipula, direito à informação sobre remuneração, metas e obrigações que dentro da atividade que faz, e também os direitos a acesso à Justiça do Trabalho, quando acontecer algum tipo de abuso, assédio moral. Mesmo quem é MEI ou trabalhador autônomo, deve buscar informação e registrar contratos de prestação de serviço.
Para quem está desempregado, que estratégias o senhor recomenda para driblar as dificuldades e buscar recolocação?
Eu não tenho concurso público, tenho alguns contratos, com algumas organizações que eu presto serviço de maneira irregular, alguns são estanque, um trabalho de curto prazo, mas uma coisa que sempre deixo atualizado é o meu currículo. É um arquivo que tem que estar o tempo todo mexendo nele, porque se você efetivamente está em busca, as estratégias básicas são a formação continuada, sempre estar se qualificando, sempre estar absorvendo novas habilidades e vai atualizando o currículo. Termina um curso de três meses, já atualiza. Outra coisa são as redes profissionais. Tem que se manter atualizado. Tenta ver que tipo de habilidades você tem e pode empreender, que é sempre uma opção, principalmente para as pessoas possuem muitas habilidades e às vezes só basta uma orientação para poder profissionalizar a entrega daquilo que ele sabe fazer. O Sebrae, que é o maior representante desse segmento, orienta. Outro elemento é manter a rede de contatos ativa sempre. Quem não é visto não é lembrado e aí você perde o bonde. As pessoas têm que saber a situação e o cenário que você se encontra. E uma coisa bacana também é inscrever-se em programas sociais de apoio ao trabalhador. Repensar sua carreira e estar atento.