Para além do esvaziamento de bairros inteiros, os efeitos do crime ambiental cometido pela mineradora Braskem atingem, também, diversos outros aspectos: a economia da região, o fluxo e a composição urbana de Maceió e, também, o ecossistema da Lagoa Mundaú, que margeia os bairros do Pinheiro, Bom Parto, Mutange e Bebedouro.
O Cada Minuto conversou com especialistas, que avaliaram as possíveis consequências urbanísticas, ambientais e econômicas a Maceió.
Planejamento urbano
O arquiteto urbanista, e professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Dilson Ferreira, destaca a importância do planejamento urbano na gestão de riscos e aponta falhas cruciais na abordagem atual.
"A primeira coisa é dados. Estudo físico, socioeconômico, ambiental, tudo mapeado de forma segura. Com dados, avaliamos e fazemos simulações para definir áreas seguras," afirmou.
Ferreira ressaltou que, mesmo em áreas degradadas, é possível reabilitar com planejamento adequado. No entanto, criticou a falta de transparência e dados por parte das autoridades: "O que falta são dados, muitos dados, para discutir o destino dessas regiões. Sem informações técnicas, não conseguimos planejar uma cidade."
O arquiteto apontou ainda a necessidade de um plano diretor eficaz, monitoramento constante e transparência na emissão de licenças ambientais. "O planejamento tem que ser seguido conforme está no plano diretor do código de urbanismo. Sem isso, não vale de nada. É o que aconteceu na Mina 18," alertou.
Dilson Ferreira destacou a importância da integração da sociedade, universidades e instituições no processo de planejamento urbano. "É preciso a integração da sociedade, da comunidade científica, dos arquitetos, urbanistas, para que a gente consiga ter um planejamento urbano bem feito."
Ao abordar a situação específica da Mina 18, o arquiteto enfatizou que a mina não deveria estar em área urbana e questionou as revisões do plano diretor que permitiram a ocupação. "O desenho urbano influencia no planejamento e na redução de risco da população. Sem fiscalização efetiva, sem transparência, não adianta," alertou.
"Sem monitoramento, fiscalização correta e atividade sendo feita sem ser fiscalizada, ocorre o que vemos agora na Mina 18”, conclui.
Impactos generalizados e “boom” imobiliário
Para o economista Cícero Péricles, o afundamento tem seu impacto espelhado sobre toda a cidade e municípios vizinhos, as localidades que formam a região metropolitana. Segundo ele, a cidade vem sofrendo uma série de consequências econômicas setoriais, com evidência nas perdas, danos e custos para as 15 mil famílias, as 60 mil pessoas deslocadas involuntariamente para outros bairros ou municípios.
“Setores inteiros foram impactados, como o imobiliário, com o aumento generalizado dos preços dos imóveis e dos aluguéis em toda a região metropolitana; as atividades turísticas vêm sofrendo com o noticiário negativo em plena alta estação; a pesca na Lagoa Mundaú perde com a suspensão das atividades por tempo indeterminado; e, claro, no sentido mais geral, há uma inibição de possíveis investimentos nas localidades da região metropolitana”, avaliou.
O especialista pontua que o deslocamento de milhares de pessoas num curto espaço de tempo não permitiu que a construção civil e o setor imobiliário se preparassem para essa nova demanda, numa cidade onde não existia estoque suficiente para atender a essa demanda excepcional.
“Essa combinação de deslocamento massivo e ausência de imóveis resultou em um aumento dos preços dos imóveis e dos aluguéis em Maceió em todos os bairros não atingidos e em alguns municípios da região metropolitana, a exemplo de Marechal Deodoro, Satuba, Paripueira e Rio Largo, transformando Maceió na cidade com os preços do m² e dos aluguéis mais altos do Nordeste, valores maiores que os das cidades mais ricas como Recife, Salvador e Fortaleza, segundo as pesquisas desse mercado”, exemplificou.
Baixa atratividade para novos investimentos
Ainda segundo Cícero Péricles, a cobertura do noticiário nacional ao problema chamou a atenção do país inteiro, impactando negativamente o turismo local, uma das atividades mais importantes da capital e de seu litoral. “Esse cenário gera muitas inseguranças junto àqueles que querem visitar a cidade, justamente no início da temporada de verão, na chamada ‘alta estação’, que vai de dezembro até o mês de março”.
Porém, ele destaca que o impacto na economia não é somente sobre o setor imobiliário e o turismo: mais de mil famílias de Maceió e cidades vizinhas, como Santa Luzia do Norte e Coqueiro Seco, uma população de pescadores e marisqueiras que têm nessa atividade a sua principal fonte renda, estão impedidas de pescar na Lagoa Mundaú, enquanto durar esta situação de provocada pelo afundamento.
“É mais um dos problemas econômicos e sociais decorrentes do afundamento”, comentou.
O economista ressalta, ainda, que a atratividade para novos investimentos diminuiu, inibindo possíveis projetos em estudo, ou anunciados para serem realizados em Maceió, na medida em que predominam as incertezas sobre o que irá acontecer nos próximos meses.
*Estagiária sob supervisão da editoria