Sobre a escolha de conselheiro do TCE: como diria Dante: “deixai do lado de fora toda esperança”

15/12/2022 12:20 - Blog do Vilar
Por Lula Vilar
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O que esperar de uma “escolha” de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Alagoas (TCE/AL) feita pela Assembleia Legislativa da Terra outrora dos Marechais, hoje dos que se veem coronéis? 

 

Ora, o de sempre: o desprezo pela análise das competências técnicas e conhecimento notório ao mesmo tempo em que prevalecem os acordos políticos. Sempre foi assim! Por qual razão agora seria diferente? O que o parlamento estadual faz é apenas homologar à luz do dia o que se decide nas “sombras legislativas”.

 

Evidentemente que afirmar isso não significa necessariamente uma análise prévia do currículo do ungido. No caso em tela, sequer opino sobre a competência técnica da ex-primeira-dama de Alagoas, Renata Calheiros, que pode sim ter atributos para ocupar o cargo. 

 

Todavia, é hipocrisia acreditar que foram esses atributos, ainda que existentes, que a colocam como favorita para o posto de conselheira. O nome da ex-primeira-dama chega ao “panteão dos heróis” em razão do pleno  domínio que o calheirismo passou a exercer quando se amalgamou ao “marcelovictismo”, criando um duto metafísico que interligou o Executivo e o Legislativo na Terra dos Marechais. 

 

Por esse duto imaginário, concretizado pelo “acordão” que nos rendeu o governador-tampão Paulo Dantas (MDB) após a fabricação de sua candidatura, se fez o chefe do Executivo reeleito e se criou as condições de “temperatura e pressão” para que o ex-governador Renan Filho (MDB) se tornasse senador por Alagoas. Como já chegou a dizer o pai do rebento-mor do MDB, o senador Renan Calheiros (MDB): uma hábil estratégia para se fazer “cabelo, barba e bigode”.

 

Não por acaso, o futuro governo de Paulo Dantas já nasce uma colcha de retalhos por meio das faturas políticas a serem pagas, acomodando novos e velhos aliados, dentro do que era esperado e da consolidação da ponte entre o Executivo e o Legislativo no Estado de Alagoas.

 

Na “Era Marcelo Victoriana”, a Assembleia Legislativa de Alagoas e o Palácio República dos Palmares foram de poderes harmônicos constituídos para um novo patamar em que tais instituições se espelham. Talvez um seja o Dorian Gray e o outro o retrato.

 

Logo, por maior que seja o currículo da primeira-dama e por melhor que sejam suas qualidades para o cargo, ela – caso eleita – chegará ao Tribunal de Contas de Alagoas como mais uma cereja no bolo de tantos acordos, que por mais escondidos que sejam, se tornam visíveis pelos atos finais produtos de seus frutos. Tudo no Calheirismo; Nada fora do Calheirismo. Obviamente que os deputados estaduais ganharão com isso. Afinal, os mais inocentes naquela fazenda legislativa são capazes de desenhar uma vaca na parede e arrancar-lhe o leite.

 

Repito: nada contra Renata Calheiros, pois a análise é das circunstâncias em que seu nome é jogado como “elemento surpresa” dentro de uma disputa que sempre foi imaginária, pois os demais nomes inscritos para a vaga de conselheiro apenas legitimam uma eleição que de eleição só tem mesmo a aparência. Acho até lamentável, pois quem acompanhou a trajetória da primeira-dama durante o governo de Renan Filho sabe que ela tem méritos e brilho próprio.

 

A Assembleia Legislativa repete, entretanto, o que sempre fez com outros personagens que foram escolhidos não por seus méritos, mas pelos acordos que foram capazes de articular ou que articularam por eles, desde Cícero Amélio ao atual presidente da Corte de Contas, Fernando Toledo. Não há nada novo no front.

 

E aí, caros leitores, os acordos políticos – não apenas este, mas os que se construíram ao longo da história e da mais recente história de Alagoas – travados no parlamento estadual fazem com que a entrada da Casa de Tavares Bastos possa ter, em suas portas, as primeiras inscrições que foram apresentadas a Dante por Virgílo, quando este adentrou o primeiro círculo de sua trajetória épica:

 

“Por mim se vai das dores à morada

Por mim se vai ao padecer eterno

Por mim se vai à gente condenada

(...)

No existir, ser nenhum a mim se avança,

Não sendo eterno, e eu eternal perduro;

Deixai, ó vós, que (aqui) entrais, (do lado de fora) toda a esperança!”

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