Alagoanas quebram o ciclo da violência e denunciam agressores: “Aquilo não era amor”

01/08/2022 06:00 - Especiais
Por Raíssa França
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A alagoana Maria Clara, 40 anos, viveu quase seis anos em uma relação abusiva que quase a matou. “No começo, ele foi um homem maravilhoso. Nos conhecemos no trabalho e ele tinha o tom de voz baixo, falava manso e era paciente. Meses depois ele começou a mostrar quem era e eu quase morri”, disse Maria ao Cada Minuto.

A partir desta segunda-feira (01) tem início a campanha do Agosto Lilás que fala sobre o enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher.

O Cada Minuto trouxe duas histórias de alagoanas que falaram como romperam o ciclo da violência.

Maria disse que o ex-esposo identificado como Joaquim criticava constantemente as roupas dela, não gostava da forma que ela falava e a agredia verbalmente. “Ele me mandava calar a boca, dizia que a minha voz irritava e que minhas roupas eram de prostitutas. Por muito tempo acreditei nisso”.

Ao Cada Minuto, ela contou que Joaquim a afastou dos amigos e da família. “Todos ficaram contra mim, mas eu não enxergava que ele estava me fazendo mal”.

Ela afirma que foi avisada várias vezes que estava em uma relação abusiva, mas só acreditou quando a agressão física aconteceu. “Demorei pra chegar em casa e quando cheguei, ele me deu um soco no rosto”.

As agressões persistiram durante anos, mas o agressor sempre pedia desculpas, se dizia arrependido e ela voltava.

“E eu voltava. Ele dizia que me amava e que fazia aquilo porque tinha sentido raiva ou ciúmes. Vivíamos uma fase boa e tudo voltava”, explica.

Foi numa sexta-feira que Maria decidiu denunciá-lo. “Vi uma matéria falando sobre formas de denunciar e resolvi ir até a polícia. Denunciei e ele foi preso. Não foi fácil porque não tinha rede de apoio, mas hoje em dia vejo que apesar da dificuldade, foi a melhor coisa que eu fiz”, relata.

Hoje, a técnica de enfermagem disse que tenta -- mesmo com as dores -- viver da forma que ela merece: com amor. “Ele não me amava. Ele nunca me amou. Precisei passar por tudo isso para aprender e infelizmente doeu muito, mas hoje em dia percebo que mereço uma vida para ser amada de forma leve”.

 

Quero reconstruir minha vida

Bianca Lins, 25 anos, estudante de administração, contou que conheceu João Gabriel em uma festa e que se apaixonou de primeira. “Ele parecia um príncipe, me tratou bem e de forma respeitosa”.

No entanto, quando Bianca iniciou um relacionamento com ele, recebeu uma mensagem de uma ex dele afirmando que já havia sido agredida. “Eu não acreditei que ele era agressor e quando contei sobre a mensagem que recebi, ele disse que a ex era louca”.

Mas foi numa festa que Bianca percebeu que algo estava errado com ele. “No primeiro momento, ele mostrou que estava irritado com coisas pequenas e descontando em mim. Estávamos numa festa quando ele ficou irritado com a forma que eu estava dançando e apertou meu braço, gritando comigo, me humilhando e chamando de vulgar”.

Quando o casal voltou para o carro, Bianca disse que João quebrou o celular dela. “Logo após ele pediu desculpas e disse que fez isso porque estava com raiva, que eu não aprontasse nada”.

Com cinco meses de namoro, longe dos amigos, da família e já sem vida social, Bianca disse que os dois brigavam constantemente e que em uma dessas brigas, João quebrou o dedo dela.

“Eu já estava vivendo uma tensão psicológica sem dormir, com medo dele e me sentindo ansiosa. Com a agressão, eu fui parar no hospital, mas não o denunciei porque ele chorou novamente e disse que errou”, conta.

Eles não terminaram o namoro porque começaram a viver uma fase tranquila. “Só que essa fase terminou e ele voltou a me agredir”, disse. Bianca disse que com a ajuda de uma amiga advogada conseguiu denunciar o agressor que foi preso.

Ela conta que até hoje sente insônia, ansiedade e que não tem ‘coragem’ para entrar em outra relação, mas que está respeitando seu tempo e que está fazendo tratamento psicológico/psiquiátrico. “Aprendi na terapia que todas as mulheres podem viver isso. Me perdoei por ter passado tanto tempo com alguém assim. Hoje quero reconstruir minha vida e ficar bem comigo”.

 

Ciclo da violência

A psicóloga Roseanne Albuquerque explica que muitas mulheres vivem esse ciclo da violência e que para quebrá-lo é necessário que as vítimas tenham apoio de familiares e amigos. “Com esse apoio fica mais fácil da vítima denunciar e receber esse encorajamento de quem a ama”.

Roseanne disse que no ciclo da violência, na primeira fase, a vítima tenta acalmar o agressor e evita qualquer conduta que possa provocar raiva nele. “Em muitos casos a vítima esconde que isso está acontecendo com ela e se afasta das pessoas. Acha que ela é a culpada”.

Já na fase dois, segundo Roseanne, o suspeito ‘perde o controle’ e a tensão da primeira fase se materializa em violência verbal, física, moral ou outro tipo.

“É comum que nessa fase a mulher sinta insônia, ansiedade, fadiga, perda de apetite, medo, solidão”, explica.

De acordo com Roseanne, após acontecer a agressão, o agressor se mostra arrependido e o casal vive uma verdadeira lua de mel. “Essa fase é perigosa porque é natural que a vítima volte o relacionamento e a dependência fique ainda maior”. Passada a fase da lua de mel, o agressor volta para a primeira fase.

Conforme a psicóloga é fundamental que a mulher que perceba o menor sinal de violência já busque ajuda. “A mulher precisa denunciar, mas é necessário que ela entenda que está vivenciando uma relação abusiva. Para isso, é recomendável que ela busque ajuda especializada de uma psicóloga e advogada. Esse atendimento fará diferença na vida dessas mulheres”.

Os nomes são fictícios a pedido das vítimas*

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