Qual de nós, num dado momento da vida, não carregou a arrogância e as certezas próprias da juventude? É certo: todos os que passamos pelo vigor dos anos verdes fomos assim, um dia.
Ai daquele que não se sentiu dono do futuro: arrisca-se a não ter um passado para bem lembrar, ainda que com tantas quixotescas ‒ e fundamentais ‒ tentativas frustradas. Não deu certo, em frente. Não ter ousado, porém, poderia ter sido o maior de todos os erros.
É em tudo natural que os jovens considerem que o mundo foi inaugurado com eles. Antes, era o nada – ou quase. Se esta também foi a nossa percepção, mesmo que inconsciente, cobrar dos que nos sucederam uma visão diferente não é um ato de justiça – com eles e conosco.
“A experiência é uma lanterna dependurada nas costas, que apenas ilumina o caminho já percorrido”, ensinou Confúcio. Mas é entender que não devemos repetir os mesmos erros, quando erros nos parecerem (e sempre depois, advertiria o Conselheiro Acácio). Deixemos aos de agora a chance de seguir a rota dos seus próprios mapas.
Exigir prudência em demasia dos jovens é tentar acelerar o carro empurrando o pé no freio, ou acreditar que o tempo e a história humana também seguem um roteiro com data marcada para acabar, coincidindo com o nosso aniversário (de geração).
Danado é tornar-se um velho tolo, vagando insone pelas redes sociais, a atacar moinhos e ventos. Espero poder ter escapado desta armadilha, o que só vou saber quando chegar ao ponto final do enredo de tantas linhas pobres, até agora, as únicas que me foram dadas a garatujar.
À ilusão da “geração espontânea” se impõe uma verdade permanente como poucas: o novo nasce do velho. As mudanças, por mais profundas e extravagantes que pareçam, ocorrem paulatinamente, cumulativamente, e são quase sempre imperceptíveis enquanto estão sendo gestadas. Sempre foi assim, até para quem vivenciou os momentos mais transformadores da humanidade. Ressalto: mudanças de conteúdo, não apenas de forma.
Qualquer pessoa comum, que tem em sua posse um pouco mais do que o pão na mesa, dispõe hoje de um conforto que nem o mais poderoso e rico faraó egípcio pôde ao menos imaginar. E isso graças à construção que consumiu inteligência e suor de centenas de cientistas e pensadores criativos - de gerações que não conviveram juntas, não se conectaram no tempo ou até em seus objetivos.
Mas, repito: também aqui, as mudanças aconteceram em “camadas”, uma após a outra, e assim continuará a ser – com os homens e com as coisas (embora as mudanças nestas últimas sejam mais visíveis e estáveis).
Um exemplo clássico, ressaltado pela ciência, é a metalurgia do minério de ferro, desenvolvida durante milhares de anos, graças ao aperfeiçoamento de fornos para a fabricação de cerâmica – o que durou outros milhares de ano.
E ainda mais: a lâmpada incandescente de Edison, apresentada ao mundo na noite de 21 de outubro de 1879, foi o aperfeiçoamento de outras lâmpadas incandescentes patenteadas entre 1841 e 1878; o telégrafo de Samuel Morse foi precedido pelos de Joseph Henry, William Cooke e Charles Wheatstone, que se tornaram velhos e obsoletos.
De grão em grão o homem enche o papo, bípede implume que é, em todas as suas idades, e nem se dá conta do muito feito e do muito mais por fazer.
O genial e cínico escritor Oscar Wilde, já na maturidade, dizia zombeteiramente:
‒ Não sou jovem o suficiente para saber tudo.
Digo eu: já envelheci o suficiente para entender o quanto é pouco, insignificante mesmo, aquilo que eu sei. E, mais ainda, aquilo que aprenderei até o fim dos meus dias.
Por ora, gosto de saber que não perdi a curiosidade ‒ pelo novo e pelo velho.