Especialistas enxergam casos de justiçamento com preocupação e falam que população está desacreditada da Justiça

25/10/2021 06:10 - Especiais
Por Raíssa França
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Foi no dia 4 de outubro que o motorista de aplicativo Ben Donson dos Santos Santana, de 33 anos, foi retirado do carro por ambulantes e agredido no Centro de Maceió. Segundo informações, ele teria acelerado contra os ambulantes e tentado fugir do local.

Ben Donson foi levado para o Hospital Geral do Estado (HGE), no bairro do Trapiche, mas faleceu. Ele faz parte da estatística relacionada aos casos de justiçamento em Alagoas.

Segundo a Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Alagoas (OAB/AL) até o mês de outubro foram registrados 45 casos de justiçamento. Cinco pessoas morreram.

Em 2020 foram 83 casos e 17 mortes, e em 2019, 123 casos e 15 mortes.

Entretanto, esses casos chamam atenção para a sensação de impunidade da população. Especialistas analisam esse cenário com preocupação, já que os casos de justiçamento em Alagoas quase quadruplicaram em quatro anos.

Ao Cada Minuto, a presidente da Comissão dos Direitos Humanos da OAB, Anne Caroline Fidelis disse que a comissão acompanha os casos de justiçamento e reforçou que se preocupa com esse tipo de situação.

“Sem dúvidas o justiçamento revela a verdadeira falência e o descrédito às instituições, e ao Estado. São pessoas que acham que pela ausência do Estado é possível praticar algo que se entende como algum tipo de justiça”, explicou.

Entretanto, de acordo com a advogada, quando alguém pratica algo assim, não se está fazendo justiça.

“A Justiça se forma a partir da possibilidade de investigação e punição. E quando há uma busca por uma justiça com muitas aspas de forma imediata não há possibilidade da apresentação de defesa de uma pessoa acusada de um cometimento de um crime e nem a ampliação da lei”, comentou.

“Esses crimes representam a falta de confiança na própria justiça. Se nós temos uma legislação que prevê a possibilidade da punição na exata medida da lei e as pessoas optam por agirem cometendo crimes mais graves do que o próprio crime que a pessoa cometeu, mostra uma grande incoerência e descrédito”, afirmou Anne.

Anne Caroline disse que quando a Comissão recebe a denúncia, ela é repassada para as instituições competentes que atuam para que haja investigação e punição das pessoas que praticam os crimes em contextos de justiçamento.

Ela também explicou que as denúncias à comissão podem ser encaminhadas para o e-mail: direitoshumanos@oab-al.org.br

“Justiçamento não resolve”

O sociólogo Paulo Lins disse que o justiçamento, no primeiro momento, causa a sensação de “justiça” e que isso acontece porque muitas pessoas se sentem desprezadas pelas instituições.

“Só que o justiçamento não resolve nada. É um anseio de vingança imediata, mas não podemos considerar isso como forma de justiça”, disse.

De acordo com ele, o linchamento não dá direito a vítima de se defender. “E se ele for inocente?”, questiona. O sociólogo disse que vê com preocupação os casos de justiçamento e que é necessário que se fale mais sobre o assunto.

“As pessoas precisam entender que isso não é positivo. Já

imaginou se fôssemos punir todos com as próprias mãos? O que viraríamos? Assassinos?”, concluiu.

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