Futura gestão: sobre os desafios de JHC e a busca de interlocução com o governo federal

17/12/2020 10:42 - Blog do Vilar
Por Lula Vilar
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Quem me acompanha nesse blog (e nas redes sociais) sabe que não votei em João Henrique Caldas, o JHC (PSB), para a Prefeitura de Maceió. Inclusive, disse isso a ele em nossas conversas, explicitando os motivos pelos quais nenhum dos grupos políticos postos na disputa me agradavam. Não escondo isso de ninguém, muito menos do meu leitor.

No segundo turno, inclusive, votei nulo por não enxergar em nenhuma das candidaturas os valores que defendo, seja na pauta de costumes (por ter uma posição mais conservadora, no sentido do pensamento filosófico do conservadorismo) ou na agenda econômica, já que os grupos ali presentes possuíam peças associadas ao estamento burocrático alagoano que sempre estiveram, ao longo das últimas décadas, no poder. Detalhei isso em vários textos que estão nesse espaço, ao detalhar a formação dessas frentes políticas.

Alguns desses nomes são tão contraditórios que se tornam mutáveis ao sabor das circunstâncias, como é o caso do camaleônico vice-prefeito eleito Ronaldo Lessa, que já foi aliado do MDB do senador Renan Calheiros, de Rui Palmeira e de quem mais lhe pudesse garantir sobrevida política, como ocorreu agora ao se aliar a JHC – por determinação nacional de sua legenda – possibilitando que se tornasse uma “fênix” depois de ter perdido a eleição para deputado federal e não ter dado certo como secretário de Agricultura.

Todavia, ao acompanhar os primeiros passos do prefeito eleito JHC nessa transição que vem sendo promovida, por questão de justiça, destaco um ponto positivo: João Henrique Caldas parece se distanciar da visão ideológica que impôs, em vários cantos do país, a aliança entre o PSB e o PDT como forma de antecipar a aglutinação de um campo progressista que visa dá suporte à candidatura de Ciro Gomes (PDT) à presidência da República no ano de 2022.

Não se trata de uma crítica a Gomes, muito menos de uma defesa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A questão é muito mais simples: JHC assumirá uma administração municipal que tem imensas dificuldades, ausência de capacidade de investimentos, queda na arrecadação, problemas para conseguir financiamento em função da situação do município para angariar confiança na busca por empréstimos etc. Fazer mais com menos será o grande desafio do futuro prefeito.

Nesse sentido, se Maceió já é extremamente dependente de repasses federais, agora maior é a dificuldade para resolver problemas como: alavancar as potencialidades do setor produtivo; ampliar a cobertura básica de Saúde; combater a evasão escolar e incapacidade de vagas para todas as crianças (principalmente na questão das creches); despolitizar o sistema de Saúde, dentre tantos outros problemas, sem contar com a questão envolvendo os bairros atingidos pela mineração da empresa Braskem: uma imensa área do município sobre a qual ainda não se tem um diagnóstico preciso do que vai acontecer e do que é possível fazer no local para reintegrar toda aquela região à cidade.

Em tese, JHC tem quatro anos para tudo isso. Mesmo diante da possibilidade desses quatro anos virarem oito, é muito pouco tempo. Nessa estrada a ser seguida, ainda há a necessidade da revisão do Plano Diretor da cidade que foi praticamente esquecido na gestão de Rui Palmeira (sem partido) e a discussão sobre medidas desburocratizantes, desreguladoras e que permitam – dentro das competências do município – uma agenda de maior liberdade econômica para o estímulo ao empreendedorismo em um momento de retomada das atividades do setor produtivo que vai perder o impacto do auxílio emergencial. Esse correspondeu a 3% do PIB alagoano, conforme dados apresentados pela Associação dos Municípios Alagoanos (AMA).

Ser menos ideológico e mais focado na demanda das soluções que deve apresentar é, portanto, uma tarefa do prefeito JHC. Nesse período de transição, portanto, ele acerta ao tentar se aproximar dos quadros técnicos da administração federal para buscar apoio para as respostas ao seu programa de governo. As reuniões que o prefeito eleito vem tendo em Brasília (DF) com pastas importantes, como o Turismo e a Infraestrutura, podem trazer resultados positivos na capitação de recursos para estratégias que tenham por base projetos. O passo inicial é importante. Espero que a gestão municipal tenha esses projetos para ir além das conversas.

JHC foge do sectarismo de alguns dos seus aliados. Isso é bom. Mas é preciso ir além...

Afinal, não raro, na história política de Alagoas há uma soma de promessas pós-reuniões que ficaram no vácuo por motivos diversos. Entre essas, se encontra a falácia do estaleiro prometido ao Estado no governo de Teotonio Vilela Filho (PSDB), cujo padrinho da ideia foi justamente o pai de JHC: o ex-deputado federal João Caldas. Coisas assim não podem se repetir. Se JHC aliar ao bom trânsito os projetos sólidos, pode ter um início de gestão com menos dificuldades. Quem ganha é o maceioense. Mesmo sem ter votado no prefeito e tendo divergências imensas com o grupo político do qual faz parte, torço para que acerte.

Todavia, para que essas ações progridam, o prefeito eleito de Maceió – em futuro próximo – terá que ter um cuidado na assepsia a ser realizada na ocupação de postos importantes dentro da gestão municipal. JHC assume com compromissos políticos com, pelo menos, cinco subgrupos e até por alguns vereadores considerados peças-chaves na eleição, como Francisco Salles (PSB).

JHC terá que cobrar desses que as indicações não tenham meros aspectos políticos, mas sim pessoas com currículos que apontem para a competência e a eficácia na execução de projetos. Isso inclui com acabar com a prática nefasta de lotear cargos no Executivo – como os postos de Saúde – para se conseguir governabilidade na Câmara Municipal de Maceió.

E aqui se encontra um erro político por parte do grupo do prefeito: se envolver demasiadamente – repetindo vícios do passado – com a eleição da Mesa Diretora da Casa. Quanto mais o prefeito eleito se envolve, mais faz promessas. O que não falta é apetite a muitos dos edis presentes. Não por acaso, atualmente, o que mais tem é vereador com muitos cargos dentro da estrutura.

Dialogar com a Câmara Municipal para passar reformas importantes, como a administrativa e a previdenciária, precisa ser uma ação que foque mais no mérito da pautas. Não é fácil, mas é necessário. A Prefeitura de Maceió terá que – nesse momento – apresentar uma reforma administrativa que tenha impacto profundo nos gastos públicos para ampliar sua capacidade de investimentos e até abrir a possibilidade de novos concursos para áreas que de fato são carentes. A reforma pode ser amarga, mas é a única possibilidade.

Para além disso, os primeiros dias de gestão deve ainda apresentar ao público, da forma mais transparente possível, duas coisas: 1) um plano para os primeiros 100 dias com ações que possam ser acompanhadas. Dentro desse plano, algumas prioridades como o Plano Diretor, a questão envolvendo a Braskem e as reformas prioritárias; e 2) um relatório explícito do que foi encontrado pela equipe de transição, com os dados minuciosos por áreas para que assim se possa saber realmente o que é possível de forma imediata e o que é para médio e longo prazo.

As pontes que JHC busca construir com o governo federal dependem muito da eficiência de sua equipe na elaboração de projetos e condução de convênios. Caso contrário, será puro marketing. A mesma situação se dará quanto a outras parcerias com entidades públicas ou privadas. Isso envolve a estruturação da máquina pública para que ela seja enxuta, desburocratizada e com o menor número de benesses possíveis para evitar os políticos que historicamente se locupletaram com o serviço público. E há políticos dessa fauna entre os que acompanham JHC.

Espero que o futuro prefeito acerte mais do que erre, pois é natural a existência de erros em qualquer lugar por melhor que sejam as intenções de quem queira promover mudanças. Errar faz parte. A qualidade de uma boa administração não se faz pela ausência de erros, mas pela quantidade de acertos que superam as falhas.

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