Resumo do debate: entre clichês, generalidades e fujões, eis um deserto de ideias

11/11/2020 11:22 - Blog do Vilar
Por Lula Vilar
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Antes de qualquer consideração a respeito das participações dos candidatos à Prefeitura de Maceió no debate de ontem, é preciso fazer o seguinte registro: a iniciativa do Acta – que realizou o evento – merece todos os elogios por um simples motivo: a coragem e o pioneirismo.

Isso mostra que é possível jornalistas empreenderem no mercado, com boas ideias, para além do tradicional formato dos veículos de comunicação hegemônicos. Dizer isso, independente da linha ideológica, editorial ou jornalística assumida por um veículo, mas reconhecer que – diante de novas ferramentas – é possível marcar posição e promover a pluralidade de ideias e conteúdo. 

O Acta firmou parcerias, buscou apoiadores, e concretizou uma iniciativa que o colocou marcando posição nesse processo eleitoral, diferente de muitos veículos de comunicação. Isso fez com que os candidatos tivessem tempo para – fora de suas estruturas de marketing – tentarem mostrar o que pensam e quem são. E isso em uma campanha eleitoral singular que foi marcada pela pouca oportunidade de debates. Independente das regras adotadas no debate pelo Acta e da forma como ele se deu (que podem sim ser alvo de críticas), o canal está de parabéns.

Particularmente, achei o formato cansativo, com um candidato apenas perguntando a todos por bloco. Porém, o pioneirismo tem dessas coisas: testar, errar, corrigir. Isso acontece com todos. Eu mesmo já errei muito em alguns projetos que encampei e não consegui levar adiante. Porém, todos os erros foram aprendizados para empreitadas futuras. Só não erra quem não faz.

A lição deixada pelo Acta, portanto, é um marco no jornalismo alagoano, pois mostra o potencial de muitas plataformas em ambiente virtual que ainda temem ousar e – por temerem – contribuem para uma hegemonia de mercado por parte de um ou dois veículos.

Torço, de coração, para que a turma do Acta colha os bons frutos das ousadias. Jornalismo tem tudo a ver com empreendedorismo. Essa sentença deve, inclusive, fazer parte das academias de jornalismo para que jovens estudantes da área não se limitem a serem apenas empregados, mas possam – com estudo, dedicação e compromisso com a busca pela verdade – deixarem suas marcas.

Dito isso, falarei aqui da participação dos candidatos, que é de única e exclusiva responsabilidade de cada um deles na forma como exerceram suas falas no tempo que foi concedido, assim como as impressões aqui descritas são de minha total responsabilidade. Quando lamento a capacidade de lidar com a lógica e a pobreza apresentada nos temas tratados por todos, sou eu quem falo. Assumo o risco de apontar o dedo na cara de cada um deles e dizer: que lamentável. Aos fujões, o apontamento ainda é mais grave: além de lamentável, mostraram covardia.

A sensação que fica – ao ouvir cada um dos presentes – é a seguinte: não sei quem ganhará essa eleição, mas temo que, independente do resultado, a grande derrotada seja Maceió, a bela capital alagoana. Todos os candidatos, sem exceção, fizeram um show de generalizações, bobagens, incapacidade de concluir um raciocínio lógico dentro do tempo previamente acordado, além do festival de clichês e slogans com propostas ao vento que não explicavam de onde viriam os recursos para suas execuções.

Os candidatos à Prefeitura de Maceió tinham, por exemplo, a obrigação de colocar os pés firmes no chão da realidade. Dentro do atual contexto, isso significa dizer que vão herdar uma cidade de orçamento totalmente comprometido, com pouquíssima capacidade de investimento (quem chegou mais perto de lembrar isso foi Corintho Campelo (PMN), mas ainda assim se deixando folclorizar), sem a possibilidade de ter a União como fiadora para empréstimos e totalmente dependente de repasses federais. Na prática, isso representa um futuro gestor que será um zelador de programas sociais. Logo, estamos diante de um cenário que requer do futuro prefeito a incrível capacidade de inovar para fazer mais com menos.

Nesse sentido, a cantinela sectária das esquerdas, ali representadas por Lenilda Luna (Unidade Popular), Valéria Correia (PSOL) e Cícero Filho (PCdoB), pouco informam. Soam mais com um mero “marcar de posição” contra o fascismo imaginário que só existe em suas cabeças. Afinal, qualquer historiador sério saberá que o fascismo se traduz pela presença ostensiva da força do estado querendo controlar cada aspecto da vida do cidadão.

O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pode ter vários defeitos (e até tem) e falas desastrosas do próprio presidente (elas existem), mas não há no Brasil a implantação desse regime. É justamente por distribuir o vocábulo “fascismo” como se mero xingamento fosse que as esquerdas sectárias viraram a caricatura que viraram. Afinal, são as ideologias que motivam a existência desses partidos que ainda fazem afagos aos regimes comunistas e socialistas, que justamente pregam essa força estatal coercitiva e demonizam a iniciativa privada e as democracias liberais, como se essas fossem apenas “estratégias burguesas”. Mas não, eles não são fascistas. São comunistas ou socialistas. Dentro desses vocábulos, há também o rastro de sangue histórico, não é Stalin? Não é Fidel? Não é Che?

Eu preferi estar discutindo Maceió a ter que lembrar disso.

Esses discursos, portanto, nada dizem sobre Maceió e aquilo que precisa ser feito na gestão da cidade. É apenas demarcação de território. Os únicos candidatos dessas esquerdas que tentaram sair um pouco desses chavões foram Ricardo Barbosa (PT) e Cícero Filho (PCdoB). Justiça seja feita! Ainda assim, sem apresentar nada de novo e tergiversando quando questionado sobre as alianças com partidos políticos que dizem eles ser a direita, como é o caso do MDB do senador Renan Calheiros e do governador Renan Filho, que possui como candidato Alfredo Gaspar de Mendonça (MDB). O PT e o PCdoB são aliados do MDB na esfera estadual.

Alfredo Gaspar não é um candidato de direita. Também não é de esquerda. Ele tenta se mostrar como alguém independente e pragmático para justificar as alianças políticas que fez com o prefeito Rui Palmeira (sem partido) e com Renan Filho. Gaspar de Mendonça soube aproveitar seu tempo com frases de efeito que miravam mais as “peças publicitárias” a serem feitas por seus marqueteiros, que já circulavam nas redes sociais antes mesmo do fim do debate, e para além disso foi pressionado a justificar as suas alianças, misturou alhos com bugalhos ao falar do Vida Nas Grotas e não soube ser objetivo quando indagado sobre o que a atual gestão de Rui Palmeira tinha de bom.

Além disso, as propostas de Gaspar de Mendonça eram promessas que não se aprofundavam sobre os meios de suas realizações, em parte por culpa do tempo, mas também por culpa da ausência de objetividade. E olhe que em algumas falas de Gaspar de Mendonça sobrou tempo. Logo, diante do cenário descrito acima, a questão principal é: como fazer? A única resposta de Alfredo Gaspar é “buscar parcerias”. Uma tentativa de explorar o bom trânsito com os Calheiros sem se comprometer. O discurso se torna, portanto, vazio.

Josan Leite sofreu do mesmo mal. E ainda chamou atenção pelo seguinte: o candidato que fez questão de colar a sua imagem a do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não conseguiu responder a altura às esquerdas (mesmo tendo as informações para isso) quando usaram contra ele a expressão “fascismo”. Josan Leite poderia ter – em poucos segundos – rebatido mostrando os efeitos práticos das ideologias de esquerda e até ter citado o esquema de corrupção monstruoso para o qual PT e seus aliados fecharam os olhos, mas – talvez por nervosismo – tentou se afastar dessa discussão e frisou que o assunto ali não era Bolsonaro, mas a Prefeitura de Maceió. É verdade. De certa forma, ele está certo. Porém, Josan Leite, Bolsonaro faz parte da sua campanha e seu eleitor reconhece isso. Sendo assim, se fosse enfático na defesa do presidente teria ganho pontos.

O mérito de Josan Leite foi ter citado os valores que o levam a defender Bolsonaro, mas ainda assim o fez de forma genérica e sem pontuar as pautas que elegeram o presidente e que poderiam ter reforçado seu próprio eleitorado. Não o fez. Pela dificuldade de lidar com pouco tempo, caiu no mesmo erro de Gaspar de Mendonça e, em alguns momentos, não conseguiu concluir o raciocínio sobre as propostas, ficando muitas delas no campo do generalismo. Durante a campanha, Leite pontou a necessidade de projetos para uma cidade inteligente. Poderia ter aprofundado o tema. Perdeu a oportunidade.

Corintho Campelo foi o elemento folclórico do debate. O candidato tentou criar até uma pegadinha que lhe servisse de escada, ao perguntar sobre a área de Maceió e sobre o orçamento. Bem, o primeiro é totalmente desimportante e o que Corintho Campelo queria era expor – por meio da pegadinha – que seus rivais políticos não conheciam o município. Fosse eu o seu rival, teria desmascarado isso. O segundo ponto é importante sim. É preciso que o prefeito futuro saiba qual é o orçamento da cidade que vai administrar e saber o percentual exato de sobra para investimentos para então saber como executar propostas.

Porém, Corintho Campelo padece do mal que cobra dos outros. Ele fala em uma inversão de pirâmide para distribuir mais recursos na base. A ideia por si só é louvável, mas Corintho Campelo sabe muito bem que a aplicação disso requer mudanças em diversas legislações, reestruturação com uma profunda reforma administrativa que passa pelo Legislativo, além da criação de cargos que não necessariamente poderão ser preenchidos por comissiondados, pois pode criar – da mesma forma – um clientelismo com lideranças políticas de bairros. O plano de governo apresentado por ele, portanto, merece ser questionado nesse sentido também: como fazer? Afinal, em alguns momentos, seu discurso soa puramente utópico.

Das esquerdas, chama atenção a dificuldade de Valéria Correia concluir um raciocínio. Os demais desse campo até possuem uma capacidade de articulação de fala e de ideias bem melhor, com destaque para Ricardo Barbosa e Cícero Filho (Lenilda Luna também se expressa bem, reconheço mesmo não concordando em nada com suas ideias).

Porém, saber melhor articular as ideias não significa estar com as ideias corretas. Sendo assim, o que se percebe nas entrelinhas é mais estatismo. E aí, cabe ao eleitor julgar se esse é o caminho ou não. Eu – e não é segredo para o meu leitor – discordo frontalmente desses, ainda mais em função dos erros cometidos por seus partidos sem que nunca tivesse havido um mea-culpa profundo, mas – ao contrário – cada vez mais sectarizados em função de uma ideologia que prega a tal “luta de classes”.

E aqui, caro leitor, é a minha análise. Você pode concordar ou não. O fato é que os candidatos foram – absolutamente todos – extremamente fracos no primeiro debate que se deu.

Porém, todos eles possuem um mérito que João Henrique Caldas, o JHC (PSB), Davi Davino Filho (PP) e Cícero Almeida (Democracia Cristã) não possuíram na noite de ontem: a coragem de encarar uma discussão de peito aberto. Não há desculpa crível que tire desse trio aí citado o rótulo de “fujão”. Fugiram.

Desrespeitaram um convite da democracia alegando agenda de campanha. É uma desculpa absurda, cínica e risível. Afinal, o debate estava previamente agendado e foi discutido com suas assessorias. JHC só mandou qualquer desculpa – conforme a organização do debate – durante a realização desse, o que mostra um completo desprezo. Mereceram todas as críticas feitas por seus adversários.

Davi Davino Filho – que tem um dos melhores marketing dessa campanha – merece um questionamento ainda mais específico justamente por isso: “Caro Davi Davino Filho, sem todo aquele aparato marqueteiro o que de fato você tem a dizer?”. JHC, que diz ser a verdadeira mudança, também poderia responder: “Como assim, aquele que tem a ‘Esquina da Verdade’ perde a oportunidade de passar a suposta verdade na cara dos demais?”. Nada mais orwelliano, em seu 1984, que assumir ser a verdade.

Já Almeida, que tem uma campanha sem recursos e cambaleante disse – em sabatina promovida pelo Movimento Brasil (MBR) – que não perderia uma oportunidade que lhe fosse concedida em virtude de ter pouco tempo para falar. Bem, no momento em que o Acta lhe daria tempo de sobra, Almeida alegou ter ficado preso em um compromisso de campanha. Acredita quem quiser…

O que ficou claro no debate do Acta? Quando o tempo é muito, os candidatos à Prefeitura de Maceió trafegam como tartarugas mancas em um deserto de ideias… Sentem-se mais confortáveis ao lado de robôs, ou com amigos da Assembleia Legislativa, ou andando de bicicleta, ou lutando contra o fascismo imaginário, ou relembrando de uma prefeitura biônica, ou em qualquer outro canto em que a realidade não os chamem de volta ao mundo dos terráqueos… Ou até mesmo alegando que compromissos diversos os impedem de faltar o debate. E aí, os faltosos na tentativa de não passar vergonha, passam uma vergonha maior ainda… Mas, talvez, isso nem faça diferença na urna.

PS: e as críticas que aqui faço não são pessoais (sempre bom lembrar). Tenho respeito pelos candidatos e com alguns até tenho bom diálogo, quando nos encontramos. Tenho até similaridade de pensamento político com Josan Leite e não escondo. Tenho discordância com as esquerdas, mas acho que é natural ter outras ideias no debate plural. Eu apenas lamento que o debate tenha sido tão pouco propositivo por culpa exclusiva de seus protagonistas. 

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