Nosso Blog resolveu registrar um artigo publicado há mais de quatro décadas, que foca o perfil de um grande visionário que eu tive o prazer de acompanhá-lo durante parte da minha infância, sobretudo, quando eu morava na Usina João de Deus, lá em Capela/AL. Trata-se do saudoso industrial José Otávio Moreira, o Coronel Zé Otávio. Pois nesta segunda-feira, 24, tive o privilégio de receber esse histórico, enviado por meu contemporâneo Maurício Moreira, neto do Coronel.
“Nesse presente momento histórico em que a Nação vive grandes vultos do passado, devem ser lembrados como exemplos para a atual geração. Transcrevo a belíssima e profunda crônica, tão bem escrita por Medeiros Neto, no Jornal de Alagoas em 1979, em homenagem ao grande homem que foi o meu saudoso avô, Coronel José Otávio Moreira, que agora em 2020 (mês de março) completaria 121 ano”. Maurício Moreira.
José Otávio Moreira
Por Medeiros Neto
"Há homens aos quais se devem tratar com respeito. Ao aproximar-se deles, parece descobrir-se no semblante uma variedade aprimorada da espécie comum. São homens que recapitulam e somam as qualidades humanas. Se não são homens superiores, pela ciência e pela cultura, demonstram a sua grandeza pelo critério e caracteres. Qualificam-se pela sensatez, pela sobriedade, pela segurança, pela autenticidade e pelo bom senso.
Conheci em 1941, pela primeira vez, o já então conhecido coronel José Otávio Moreira. Impressionei-me com a sua presença. Iniciava-me na política, com a chegada e posse do major Ismar de Góis Monteiro na interventoria federal do Estado. Já em 1942, quando assumi o cargo de Diretor Geral da Educação, substituindo o professor Dr. Théo Brandão, passei a frequentar a cidade de Capela, onde a sua ação catalítica era o sinal de domínio.
Em 1945, quando da formação do Partido Social Democrático- PSD, figurou o coronel José Otávio Moreira nos quadros pessedistas, passando a ser o nosso correligionário. Tinha ele muito do espírito e vocação do pessedismo, emergente. Falava pouco, pensava muito e decidia certo. Aparentemente rígido e hermético, tinha no coração paradoxalmente encarnado um feixe de contradições ao orgulho, ao egoísmo, à vaidade e ao desumano. Foi um homem bom e tornou-se um bem comum deste Estado.
Todos os que o conheciam, procuravam guardar-lhe a estima, com maior apreço. Nas suas atividades industriais soube como poucos superar as crises sem mergulhar no abismo ou no caos. Ele e Cícero Toledo (Usina Capricho- Cajueiro/AL), mesmo dentro das questiúnculas municipais, passaram a ser dois padrões de virtudes morais e cívicas. No município de Capela, onde preponderou à luta entre pessedistas e udenistas, sempre houve um homem polarizador, centro de gravidade, senão denominador comum, que foi o dono da Usina João de Deus (Capela/AL) e da Usina Terra Nova (Pilar/AL).
Mantinha o município em suas mãos, sem tirá-lo ambiciosamente da mão dos outros. As famílias, ali entrelaçadas pelo sangue ou pela afinidade, nunca chegavam ao frontalismo da política de vinganças e prepotências. Ninguém se julgava capaz de desmoronar aquele ambiente de mútuo respeito. Quando o coronel José Otávio se ligou mais estreitamente ao Palácio de Floriano Peixoto, teve em mira salvar os alicerces da construção pessedista. Foi candidato a senador, porém, o momento hostil, então dominante, lhe não permitiu vencer o pleito. Depois disso, procurou ilhar-se nos canaviais, que continuam cercando a mordomia da sua usina principal. Viveu os últimos 20 anos, como o solitário dos campos que fertilizou, transformando-os em celeiros da indústria do açúcar.
Foi, sem dúvida, um cérebro de administrador. Os seus negócios revestiam-se da seriedade das contas sem manchas ou mazelas. Criou filhos e netos para o sucederem, se assim o quiserem. Nunca é fácil uma sucessão sem atropelos, ou uma mudança sem alternativas. Mas, quem não crê no valor da herança espiritual que prepondera sempre sobre a alma da maioria dos descendentes? O pranteado comendador José Otávio Moreira, último dos coronéis da Casa Grande, sem senzala, deverá perenizar-se na sua tarefa de reconstrução econômica do Estado.
Os filósofos condenam as riquezas, porém, os homens públicos as aplaudem, quando criadas como fortunas lícitas, sérias e justas. O ouro — já dizia alguém — é o sangue do corpo social. Sem ele, lamentavelmente, nada se constrói de material. As riquezas, assim como a glória e a saúde, têm o valor de quem às formou. Para a alma do coronel José Otávio Moreira, a riqueza lhe não será obstáculo para entrar no reino dos céus, onde desfrutará de uma eternidade feliz.
Medeiros Neto - 1979
Luís de Meneses Medeiros Neto (Nasceu em Traipu/AL, em 22 de novembro de 1914 e morreu em Maceió, 9 de novembro de 1992). Foi um político brasileiro. Exerceu diversas funções públicas em nosso Estado, tendo como destaque o mandato de deputado federal constituinte por Alagoas em 1946.