Entre as divergências de uma democracia e as imposições revolucionárias...

07/07/2020 13:57 - Blog do Vilar
Por Lula Vilar

É da essência da democracia existir a divergência de opiniões e visões de mundo. Diante disso, é natural que existam aqueles que gostam do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de seu governo e aqueles que o reprovem. Fato que é mensurado pelas pesquisas de opinião, com índices de aprovação e rejeição. Sempre será assim – em uma democracia – independente de quem seja o governante.

No mais, o que se tem é o debate em relação às ações do presidente e do governo, com argumentos variados na busca da compreensão da realidade. E aí, todos possuem o direito a opinião diante dos fatos que se sucedem. Não somos donos da verdade. Todavia, os que recorrem à honestidade intelectual, buscam se pautar pela verdade, evitando os excessos de relativismos. Não se é dono da verdade, mas se cultiva o espírito de sempre buscar estar a serviço dela.

Ocorre que na disputa política, em muitos momentos, entra em cena o jogo pelo poder – e isso não é exclusividade de uma corrente ideológica – e com isso reinam erísticas que podem distorcer os fatos, manipular e construir narrativas que favoreçam ao grupo A, B, C...Z. O leitor que é compromissado em compreender as coisas como elas realmente são deve estar atento a isso. Dizer isso não é assumir uma postura de “isentão”. Ao contrário, é buscar ser honesto dentro daquilo que se acredita.

Quem me acompanha aqui nesse blog sabe que tenho aversão à mentalidade revolucionária, rejeito por completo as concepções do comunismo e do marxismo, bem como suas descendências. Sou católico e tenho apresso pelo pensamento conservador, presente em autores como João Camilo de Oliveira Torres, Gustavo Corção, Michael Oakeshott, Thomas Sowell, Roger Scruton, dentre tantos outros. Por honestidade intelectual, jamais esconderia isso de quem me acompanha.

Dito isso, eis que enxergo – na disputa política em uma democracia – como natural a existência de vários espectros que se chocam, que vai daquilo que se convencionou chamar de direita ao que se titula como esquerda. Não descarto a possibilidade do engodo está em todos os campos, assim como creio que se há governo, ele deve ser fiscalizado, cobrado e vigiado. É que o preço da liberdade é a eterna vigilância. Razão pela qual já critiquei – em diversos momentos – o atual governo em algumas posturas, como por exemplo, dar ouvidos demasiadamente ao positivismo diluído ainda presente entre os militares brasileiros.

Abrir mão da possibilidade de crítica é algo que jamais farei seja qual for o titular, tenha eu ou não votado nele. Democracia não se encerra nas urnas, mas ao contrário.

Agora, um fato me chamou a atenção desde que surgiu a informação de que o presidente Jair Bolsonaro estaria infectado pelo novo coronavírus. Houve isso no passado; há agora, quando o teste confirmou a doença. Eis que entre os que não gostam de Bolsonaro surge a hastagh #ForçaCovid. Em outras palavras, gente que torce para que a doença vença, o que significa dizer – em um português claro – querer a morte do presidente.

Essa é uma característica da mentalidade revolucionária que sempre rejeitei com todas as forças. Transformam adversários em inimigos e partem para um vale tudo, inclusive a eliminação física do oponente. Não creio que seja exclusividade de uma ideologia, tanto que já critiquei isso em relação a outros campos, quando vi que tripudiaram da morte de Marisa Letícia ou do neto do ex-presidente condenado Lula. É repudiável do mesmo jeito.

Como foi infeliz e repudiável a declaração do deputado federal Eduardo Bolsonaro quando soube que a também parlamentar Joice Halsselmann estava com coronavírus. Não gosto do que Halsselmann representa. Para mim, o símbolo da hipocrisia e da petulância ególatra se resume no comportamento dela, mas nem por isso a desejo mal.

Nesse desejo, está presente o que há de pior na mentalidade stalinista, maoista etc: a morte do outro. O escritor George Orwell dizia que isso era criar a “despessoa” em “Novafala”. Ou seja: alguém para ser odiado com tanta força, mas com tanta força, que não mais poderia ser visto como um ser humano que – como qualquer outro – comete erros e acertos.

É também o caso dos “cancelamentos” virtuais que possuem uma similaridade com os linchamentos. Não há a eliminação física, mas o sujeito é expurgado de um clubinho – do qual muitas vezes até fazia parte – por conta daquilo que a “inteligência orgânica” determine como sendo um erro imperdoável.

Há uma estratégia política nesse caminho que é tirar de circulação determinadas ideias criando um pensamento hegemônico e impondo uma autocensura prévia em todos por conta do medo. Se busca eliminar um sujeito, difamando, caluniando etc para que aquilo que ele diga sequer seja escutado.

O sujeito passa a avaliar tudo o que vai pensar e dizer com base em como será ou não aceito. Nada mais perigoso ao debate democrático – que exige divergências e confrontos de ideias – que isso. Cria-se o círculo do permissível. Cria-se uma censura ideológica previamente aplicada no ambiente por meio de uma cartilha abstrata e não física do que pode e do que não pode. Cria-se aquelas vozes que determinam o que é ou não verdade.

Ora, qualquer um pode criticar ou rejeitar uma determinada ideia, pode contrapor etc. Assim como, qualquer um que use da liberdade para o cometimento e delito de crimes previstos nos códigos legais deve responder por seus atos. A liberdade não exclui a responsabilidade e as consequências dos atos praticados. Porém, no Brasil, assim como ocorreu na ficção 1984 de George Orwell, se estimula um ambiente que destrua as “despessoas” e fiscalize o “crime-ideia”.

Não basta – no caso do presidente – a crítica ao seu governo e a tentativa de vencê-lo em uma eleição vindoura. É preciso destruí-lo, bem como eliminar tudo aquilo que ele venha a representar na óptica desses raivosos. Afinal, eles (esses que se disfarçam de críticos) assumem para si serem o completo bem desprovido de todo e qualquer preconceito, são o monopólio da virtude. O outro é o mal encarnado que precisa ser retirado do ambiente físico. Se possível se utilizando do próprio Estado para isso.

Quanto ao governo Bolsonaro em si, o presidente tem sim cometido erros cruciais. O que ocorre no Ministério da Educação, por exemplo, com idas e vindas e sem uma definição de rumos e da política pública a ser adotada de forma clara é um prejuízo para o país, principalmente diante do fato de ocuparmos (culpa dos governos passados) os piores lugares nos rankings internacionais.

A Educação brasileira sofre com a desvalorização de quem realmente quer trabalhar por sua melhoria, a desvalorização dos profissionais, a estrutura da rede, a má formação de muitos agentes públicos, a ideologização do currículo, enfim… são muitos problemas a serem elencados e não se resolve em um passe de mágica. Mas é preciso que haja um rumo.

Esse não é o único problema do governo. Critiquei já, em outro texto, a visão positivista, por exemplo, de alguns setores do Planalto. Todavia, também vejo acertos no governo: a busca pela desburocratização (como ocorreu em 2019) para empreender, a defesa do livre mercado (que precisa ser mais posta em prática) a luta para fazer reformas profundas, como a tributária, administrativa e do pacto federativo (que não depende apenas do Executivo), o trabalho do Ministério da Infraestrutura, dentre outros pontos.

Mas, é impressionante como, no Brasil, nada disso – sejam os reais erros ou acertos – importa. O que prevalece mesmo são as narrativas criadas e o embate vazio que visa criar uma atmosfera de espiral do silêncio em que qualquer um pode – de uma hora para outra – ser “cancelado” por sua ausência de ortodoxia para com o clubinho dominante. Como – gostem ou não dele – Jair Bolsonaro precisa ser cancelado para que o estamento volte a disputar o poder somente entre seus membros, desejar a morte do presidente virou até hastagh.

E sim, o presidente errou – a meu ver – ao afirmar que a doença era apenas uma gripezinha, mas seu governo acertou em ações tomadas no combate à pandemia e na tentativa de reduzir os danos na economia. Basta olhar o quanto foi gasto e para quais ações foram destinadas recursos. Sim, o presidente por vezes cria umas polêmicas vazias, com declarações infelizes, etc. Mas nada disso justifica o sentimento de quem torce pela morte do outro.

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